Mulheres, donas-de-casa, esposas e mães: dificuldades e superações para concluir o Ensino Superior

RESUMO

O trabalho monográfico que construímos levou-nos a uma tomada de consciência de nossa história de formação docente. É comum ouvirmos que o professor deve conhecer seu aluno. Pareceu-nos no nosso estudo que o docente necessita conhecer-se a si mesmo, compreender suas dificuldades, reconhecer suas lutas para conseguir estabelecer um patamar a partir do qual possa planejar seu continuado desenvolvimento. Passamos muito tempo somente olhando os obstáculos especialmente dos jovens e adultos da escola em que trabalhamos. Desejávamos sem cessar encontrar caminhos para alterar a vida estudantil deles. Mas nos sentíamos sempre incapazes de encontrar soluções. Daí começou a emergir uma questão mais profunda: por que a vida do trabalhador que estuda é tão difícil? E quase de modo surpreendente, começamos a compreender que éramos como eles, trabalhadores em provas repletas de obstáculos. Buscando raízes, fomos relembrar nossa história de vida. Conseguimos que mais uma colega colaborasse conosco e fizesse o mesmo. Comprovamos como são profundas as marcas de mulheres, que constituem famílias, tornam-se donas de casa, têm filhos, algumas precisam trabalhar também fora de casa, e desejam realizar até um curso superior. A vida social moderna não dá oportunidades de pararmos para pensar na grandeza de conseguir-se sobreviver a tantas obrigações, compromissos, deveres e tarefas a realizar. Quando parte desta população de trabalhadores consegue chegar a um curso superior, essas pessoas de extrema resistência se deparam com as exigências deste nível de ensino, Temos sentimentos dos mais variados tipos. Sentimos medo e vontade de desistir. Buscando forças de Deus, conseguimos concluir a graduação. Então voltamos a pensar nas gerações às vezes mais novas de famílias de trabalhadores que estão repetindo a mesma luta. E agora seremos professores-trabalhadores de trabalhadores que ainda necessitam aprender a ler, escrever, contar, fazer pequenos cálculos, ser cidadãos. Não podemos esquecer das teorias; também não podemos esquecer de nossas próprias vidas. Precisaremos ser professores com metodologias cheias de humanidade.



1 INTRODUÇÃO

A escolha do tema se deu pelas adversidades vivenciadas ao longo do curso, no sentido de conciliar a vida cotidiana com a vida acadêmica, e pela observação de que o mesmo ocorria com a grande maioria das mulheres, considerando que a vida universitária exige que os acadêmicos tenham um alto grau de dedicação e isso demanda exclusividade de tempo, dada à complexidade e aprofundamento dos trabalhos, necessários ao cumprimento das ementas. Entende-se por vida cotidiana as obrigações com os filhos, esposo e afazeres domésticos.

Na vida cotidiana acontece de forma semelhante: existe a necessidade de exclusividade de tempo, atenção, dedicação. Logo, pode ocorrer incompatibilidade para se conseguir executar as tarefas inerentes a cada uma das situações descritas, o que explica o pequeno número de donas-de-casa que chega a concluir o Ensino Superior.

Será que os benefícios trazidos pela universidade compensam todos os esforços, renúncias, abstinências e demais sacrifícios que acompanham a vida acadêmica?

Os relatos constantes neste trabalho foram colhidos por meio de entrevista. A escolha por esse método se deu porque a entrevista permite o esclarecimento dos fatos, dada à intimidade que esse método proporciona.

A pedagoga cooperadora fez um relato das memórias de vida. As informações foram gravadas e posteriormente transcritas. Por se tratar de um relato de memória, houve a necessidade de esclarecimentos a algumas dúvidas que surgiram no decorrer da transcrição, uma vez que não ocorreram interrupções no momento da gravação para não acontecer uma “quebra” no raciocínio da entrevistada. Em relação a esses esclarecimentos posteriores e a forma de abordagem que esse método permite adaptar, conforme perfil do entrevistado:

Como se realiza cada vez de maneira exclusiva, seja com indivíduos ou com grupos, a entrevista permite correções, esclarecimentos e adaptações que a tornam sobremaneira eficaz na obtenção das informações desejadas. (LÜDKE; ANDRÉ, 1986 p.35)

Os autores também se referem ao fato de que essa “liberdade de percurso”, é permitida em entrevista denominada de: não-estruturada ou não-padronizada.

Em relação à exclusividade que a entrevista permite, foi solicitado à entrevistada que fizesse um relato de vida, no qual fosse contemplada sua família de origem; sua família atual, no que se refere à educação dos membros que a compõem; dificuldades ou não de acesso à escola e como se deu sua alfabetização. Posteriormente deveria relatar sobre seu ingresso na universidade e as dificuldades enfrentadas no decorrer do Curso, rumo à conclusão da graduação, e finalmente relatar as contribuições da universidade para a sua vida.

Acreditamos que os dois relatos constantes neste trabalho retratam a realidade vivenciada pela maioria das mulheres que chegam à universidade, das quais grande parte desiste ao longo do percurso, por entenderem que não conseguirão chegar ao final da jornada.

O objetivo dessa pesquisa é tornar público a realidade dessas mulheres e demonstrar, por meio de relatos, que é possível conciliar esses papéis, desde que se tenha determinação e coragem para ultrapassar os limites e vencer os desafios que essa realidade impõe. Vale salientar que para a garantia do sucesso, é imprescindível que se tenha apoio de familiares e/ou amigos e, sobretudo, “paixão” pelo curso escolhido.

A proposta deste trabalho é utilizar as experiências de duas mulheres que superaram os “tropeços do caminho” e conseguiram concluir o curso a que se propuseram fazer, para que sirvam de exemplo às donas-de-casa que almejam ingressar no Ensino Superior, uma vez que os relatos dispostos nesse trabalho, são de mulheres que em sua trajetória escolar, enfrentaram as dificuldades comuns a uma educação popular. Nesse sentido e com essa visão, desejamos que, especialmente as mulheres com esse perfil, sintam-se motivadas e decidam enfrentar as dificuldades, não desistindo de realizar seus objetivos de vida.

Ao recordar, passamos a refletir sobre como compreendemos nossa própria história e a dos que nos cercam. Vamos nos inscrevendo numa história que não está mais distante e, sim, impregnada das memórias que nos tomam e da qual muitas outras fazem parte. (PRADO; SOLIGO,2004).



2 PRIMEIRO RELATO[1]


2.1 Família de origem e dificuldades Sócio-econômicas

Não sei muito sobre a família do meu pai antes de se casar com a minha mãe, apenas que minha avó teve 21 filhos e desses, apenas sete sobreviveram. Meu pai era o segundo mais jovem deles.

Nasceu em 1929, no interior da Paraíba e lá viveu até 1952, um ano após se casar. O tempo em que lá morou, trabalhou no dia-a-dia como agricultor e como “pandeirista de forrós” nos finais de semana, onde passava toda a noite. Ele não recorda de ter freqüentado uma escola durante todo um ano letivo. O difícil acesso, as condições financeiras, o cansaço das noites sem dormir e o trabalho árduo, aliado à falta de incentivo dos pais o faziam não sentir interesse para estudar, considerando que “para plantar e colher não é necessário saber ler ou escrever”. As poucas vezes que foi à escola, apenas “bagunçou” e dessa forma permaneceu analfabeto até se casar com a minha mãe que o alfabetizou, mesmo tendo estudado apenas até o segundo ano primário.

Minha mãe vem de uma família também do interior da Paraíba, muito sofrida por causa do pai que bebia e se tornava violento. Minha avó teve 13 filhos, Apenas cinco sobreviveram: 03 do sexo feminino e 02 do sexo masculino. Minha mãe nasceu em 1933 e casou “fugida” em 1951. Apesar das dificuldades e do pai violento, conseguiu cursar até o segundo ano do primário, pois minha avó valorizava muito “o estudo”, apesar de analfabeta. Ela retirava dinheiro do meu avô quando estava bêbado e a mandava para a escola escondido, pois acreditava que “a maior riqueza que alguém podia ter na vida era a de saber ler e escrever”.

Por causa da violência do meu avô para com a família, todas as filhas casaram-se “fugidas”, sendo que a última a fugir foi a minha mãe. Por causa disso ele surrou a minha avó quase até a morte. Ela, não suportando mais tamanha violência, o deixou e veio morar aqui em Natal juntamente com os dois filhos, em casa de uma tia. Lá permaneceu por mais ou menos um ano, quando meus pais também vieram morar em Natal (final de 1952), em uma casa alugada na zona oeste da cidade.

Como não tinham profissão nem “estudo”, tanto meu pai quanto os meus tios foram trabalhar como serventes de pedreiro. Nesse meio tempo, minha mãe alfabetizou os dois irmãos. Algum tempo depois, meus tios resolveram “tentar a vida em São Paulo”. Souberam de alguém que financiava passagens e gastos de viagem. Despesas essas que seriam pagas com trabalho quando chegassem ao destino. Lá deveriam permanecer até a total quitação da dívida e só então seriam livres para outros empregos, ou seja, um trabalho “parcialmente” escravo.

Enquanto isso, aqui em Natal meu pai permaneceu como servente de pedreiro por muitos anos. Depois trabalhou em uma marcenaria, onde aprendeu o ofício. Minha mãe e minha avó ajudavam no orçamento trabalhando como lavadeiras e passadeiras. Por não terem água encanada, lavavam as roupas no “rio das Quintas” ou em um córrego que havia próximo ao “CIAT” [2], e do Quartel dos Fuzileiros Navais.

No final de 1962, após o nascimento da segunda filha, decidiram também “tentar a vida em São Paulo”, as dificuldades econômicas havia se intensificado. Venderam o pouco que tinham, compraram as passagens e embarcaram. Lá chegando foram morar com os meus tios que a essa altura já haviam pago suas dívidas e estavam trabalhando como metalúrgicos. Na mesma empresa conseguiram emprego para o meu pai.

Por ser o clima em São Paulo muito frio, minha avó não se adaptou. Os filhos compraram sua passagem e a mandaram de volta para Natal. Minha avó então foi morar com a filha mais velha. A filha e o marido não gostaram de ter que ficar com ela e a convivência foi muito difícil. Por causa disso sofreu muitas humilhações. Minha mãe ao tomar conhecimento, decidiu voltar para Natal, uma vez que minha avó não se adaptou no sudeste.

Meu pai não tinha dinheiro para comprar as passagens de volta e concluiu que a única forma de obtê-lo seria por meio de indenização por acidente de trabalho. Decidiu decepar o dedo indicador direito em uma máquina que servia para cortar o aço. Foi indenizado e retornou à Natal em 1964.

Aqui chegando trouxe a minha avó para morar com ele. Alugou “dois quartos” em uma vila. Em um montou uma pequena marcenaria na qual trabalhou por muitos anos, auxiliado por minha mãe, e no outro montou a casa. As peças que confeccionava eram vendidas na feira do bairro das Quintas, Alecrim e Rocas.

Nasceram então, mais três filhos. Foram cinco ao todo. Eu sou a filha do meio, seguida por um único irmão e mais uma irmã.

Minha irmã mais velha começou a trabalhar aos 14 anos para ajudar o meu pai no sustento da família. Trabalhava no comércio durante o dia e estudava à noite. Dessa forma conseguiu concluir o segundo grau e “se formar em técnico de contabilidade”. Fez cursinho pré-vestibular e tentou ingressar na UFRN para o curso de medicina por três vezes. Não conseguindo, desistiu e se concentrou apenas em trabalhar e cuidar financeiramente da família.

Quando a marcenaria não estava mais rendendo dinheiro, meu pai desistiu e vendeu o equipamento, ficando sem trabalhar por uns dois anos. Nesse período quem sustentou a família foi minha irmã mais velha.

Uma conhecida de minha mãe conseguiu um emprego para meu pai em uma empresa de serviços gerais, na qual permaneceu até sua aposentadoria por invalidez, devido à um problema em uma das pernas. Com o dinheiro adquirido na aposentadoria, juntamente com o da minha avó, que fora aposentada como agricultora tornou-se possível comprar a casa própria. Eram duas casas em mau estado de conservação, situados na zona oeste da cidade do Natal.

Em 1974, minha mãe fez concurso para ASG do Estado do RN, tornando-se funcionária efetiva da educação. Trabalhou em uma escola próxima de casa até os 70 anos de idade, tendo sido afastada pela aposentadoria compulsória, faltando poucos meses para completar 30 anos de serviços prestados. Apesar de ASG, desempenhou a função de mecanógrafa[3], tendo sido aposentada no ano de 2003 como tal.

Até hoje é elogiada na escola por seu exemplo de dedicação ao trabalho e por seu gosto pela leitura. Percebíamos em seu olhar e posturas, o orgulho por ser funcionária da educação. Estar em contato com os livros e com pessoas “formadas” a fazia sentir-se importante, pois estava contribuindo para a formação de pessoas. De alguma forma esse emprego lhe supria as oportunidades que a vida “lhe negou”. A grande admiração que nutre por professores em geral, o fato de ter alfabetizado o esposo e os irmãos, faz-nos perceber que essa seria a profissão escolhida. Vale ressaltar que, durante os quase 30 anos de serviço, não consta uma falta sequer em sua ficha funcional que não tenha sido de fato comprovado por atestado médico, mesmo tendo ela cuidado de minha avó, que sofria de esclerose, até a sua morte aos 96 anos de idade. E ainda tendo enfrentado outras dificuldades com o filho que é usuário de drogas.

Esse irmão e duas de minhas irmãs não chegaram a concluir o Ensino Fundamental. Sendo que a segunda mais velha parou na oitava série, meu irmão na quinta e a irmã mais nova na sexta.

Conclui o segundo grau no ano de 1984 aos 19 anos de idade e, a exemplo de minha irmã mais velha, também fiz o Técnico de Contabilidade. Em minha trajetória escolar fui reprovada em uma quinta, uma sexta e desisti em uma oitava série. Após concluir o segundo grau parei de estudar, afinal “já estava formada como técnica de contabilidade”.


2.2 Família Atual

Casei aos 21 anos após o nascimento de primeira filha no ano de 1986. em 1988 nasceu a segunda. Meu esposo trabalhava no comércio e não estudava. Havia parado na sétima série ginasial. Só muitos anos depois resolveu voltar a estudar e concluiu o Ensino Médio pelo sistema supletivo presencial de ensino. Em 1994 foi aprovado em concurso público e hoje é guarda municipal de Natal, no qual trabalha por meio de escala, permanecendo no trabalho por 24 horas consecutivas e folgando 48. Além do seu serviço, ele “tira serviço” de outro guarda.

Permaneci trabalhando no comércio local até o ano de 2000 quando prestei concurso para ASG[4] do Estado do RN. Hoje atuo como secretária na mesma escola em que minha mãe trabalhou. O que permite esse desvio de função é a capacitação do funcionário e a necessidade da escola. Por estar trabalhando em uma escola resolvi voltar a estudar. Um dos fatos que motivou essa decisão foi a carteira de estudante que muito contribui para o orçamento familiar, além do fato de as filhas já estarem crescidas.

Matriculei-me no segundo ano do Ensino Médio, acreditando que sentiria muita dificuldade para me adaptar novamente a uma sala de aula, afinal havia 17 anos que não estudava, mas isso não ocorreu e esse fato me surpreendeu bastante.

No ano de 2001, aos 37 anos de idade, engravidei do meu 3º filho (primeiro neto biológico de minha mãe que já tinha 12 netas e um neto adotado), ele nasceu no final de abril de 2002. Parei de estudar, mas continuei a trabalhar com os meus ex-professores que me incentivaram a tentar o vestibular da UFRN[5], alegando que eu tinha potencial. A maior incentivadora nesse sentido foi a professora de Língua Portuguesa, Sandra Linhares. Eu realmente não conseguia perceber todo esse potencial a que ela se referia. Sentia muito medo de ter que freqüentar o campus.

Isso se dava por meu alto grau de timidez. Acredito que agia assim devido a forma de como a minha mãe educou os filhos. Por morarmos em uma casa de poucos e pequenos cômodos, não havia espaço para as brincadeiras. Isso nos obrigava a ir para as ruas. Esse fato aumentava a preocupação de minha mãe com o nosso bem-estar. Por não poder nos acompanhar durante as brincadeiras na rua por causa dos afazeres domésticos e do trabalho, nos fazia recomendações sobre os perigos de se falar com quem não conhecíamos utilizando as “histórias de bicho-papão” e da “Viúva Machado”, que “carregava” crianças e lhes comia o fígado. Acredito que esses medos me fizeram tímida.

Eu sentia receio de lhe dar com as pessoas de não conseguir me adaptar e fazer parte desse universo. Todos esses conflitos me causavam pânico. Por outro lado, tinha o desejo de minha mãe em ter uma filha formada e a necessidade de auto comprovação da capacidade ao mesmo tempo em que o medo da responsabilidade, de ter que corresponder às expectativas dos outros. Acredito que essa timidez foi o que me privou de tentar o vestibular anteriormente.

Mas, devido ao incentivo dessa professora, resolvi tentar primeiro o ENEM[6] que, por ironia do destino, a aplicação das provas se deu no Campus, no setor três.

Os resultados comprovaram as expectativas da professora. As notas ficaram acima da média nacional e a redação foi boa.

Diante desse fato, resolvi que tentaria o vestibular para a UFRN. O problema agora era financeiro, pois não dispunha do montante para a taxa de inscrição. Como não tinha a pretensão de ser aprovada, faria apenas por experiência. Pensando assim, seria “jogar dinheiro fora”. Informaram-me então, que eu poderia tentar a isenção. Procurei saber como funcionava e me inscrevi. Fui aceita e prestei vestibular para o processo seletivo de 2003.

Os quatro dias de exames foram torturantes, por sua rigidez de horário, tensão dos fiscais e vestibulandos, dificuldade das provas, além do fato de estar amamentando.

Quis desistir após primeiro dia de provas, mas meu esposo e minhas filhas usaram de todos os argumentos que podiam para me fazerem permanecer no processo. Também fiquei sabendo que se desistisse, não poderia mais concorrer à isenção no ano seguinte e eu tinha planos futuros de fazer um cursinho e tentar o vestibular novamente, com isenção. Vale salientar que eu não havia estudado, pois queria testar meu nível de conhecimento e o nível das provas. Por isso tinha plena certeza de que não seria aprovada. Aliado à isso, o fator financeiro me fez desistir da idéia de abandonar o concurso.

Ocorreu é que fui aprovada. A família ficou maravilhada. Eu particularmente fiquei num misto de surpresa orgulho e perplexidade. Minha mãe saiu orgulhosamente comentando com todo mundo. Os professores, colegas de trabalho, todo ficaram muito felizes. Ouvi muitos “não disse que você era capaz?”, do meu esposo, de professores e principalmente de minhas irmãs, que sempre me consideraram muito inteligente.


2.3 O Ingresso na Universidade

Ingressei no curso de Pedagogia pela UFRN, no turno vespertino. Começaram aí, as dificuldades: conciliar relacionamento conjugal, afazeres domésticos, filhas adolescentes, um bebê, o trabalho e a universidade, considerando que sou eu quem cuida das finanças da casa (que é um estresse à parte).

Todos esses fatores interferiram diretamente em meu aprendizado. Minha dificuldade aumentou por eu não ter noções na área de educação, pois não havia cursado o magistério, como é comum em quem opta por fazer um curso de Pedagogia, havia feito o Segundo Grau profissionalizante com o curso Técnico de contabilidade. Apesar de estar trabalhando em uma escola, não tinha contato com o processo ensino/aprendizagem. O trabalho em secretarias é burocrático (fiscal, financeiro, estatístico). Conciliar as tarefas domésticas diárias tais como: lavar louças; varrer casa e organizá-la; tirar o pó dos móveis; lavar banheiro; cozinhar; verificar, organizar fardamento e providenciar o lanche do filho pequeno, além decidir e orientar todas as outras ações, com tarefas não muito corriqueiras como: lavar; passar; fazer faxina, fazer compras, entre outros afazeres, fazem das tarefas acadêmicas, exigidas pelos professores, serem classificadas como “impossíveis” de serem realizadas no cotidiano, em tempo hábil. Por muitas vezes os textos eram lidos no trajeto casa/campus – campus/trabalho – trabalho/casa. Muitas “falas” de Seminários foram definidas dentro de transportes coletivos.

Diante do exposto, ou optava por fazer as tarefas da universidade ou os afazeres domésticos. Conciliar era imensamente difícil, considerando que os trabalhos da universidade demandam tempo por necessitar de reflexão, pesquisa e fundamentação teórica. O ambiente domiciliar, sempre agitado, não propiciava a concentração que os trabalhos exigiam.

Por outro lado, havia o trabalho na escola exigindo também, muita atenção e responsabilidade. Cabe à secretária a expedição de vários documentos sobre a vida escolar dos estudantes: Históricos, declarações; transferências; fichas individuais; confecção de cadernetas, etc. Além de trabalharmos diretamente com o aluno, atendendo às suas necessidades ligadas à escola, atendemos as orientações e exigências da Secretaria de Educação da Cultura e dos Desportos – SECD, em solicitações sobre o universo escolar, tais como: Atas, nas quais constam as médias finais anual dos alunos; Censo Escolar; relatórios sobre o contingente e evasão escolar, entre outros.

Por muitas vezes houve necessidade de trazer o trabalho para ser realizado em casa, dada a urgência das informações e atividades, no sentido do cumprimento do calendário escolar.

A falta de tempo e a complexidade dos trabalhos acadêmicos, aliados ao incentivo ao trabalho coletivo, defendido por muitos professores universitários, propiciaram a criação de um grupo de estudo que foi denominado de “persistência”, tais as dificuldades enfrentadas pelos membros, ao longo do curso. Era composto por seis membros: Tatiana Oliveira, Ana Paula Guedes, Luciana Gonçalves, Patrícia Hermógenes, Raquel Cristina e eu. Dada a impossibilidade de nos reunirmos durante a semana, fazíamos nossas reuniões nos finais de semana e também aos feriados. As reuniões eram realizadas, em sua maioria, em uma escola Municipal em que meu esposo trabalhava.

Essa equipe, além de atuar como “grupo de estudo” servia também para aconselhamentos, terapia coletiva e ainda como intercessores em orações. Nesse grupo experimentamos a verdadeira “terapia do riso”. Nos dávamos tão bem que as reuniões eram descontraídas mesmo em meio às atribulações. Alguém sempre Fazia “gracinhas” com as situações. Essa irreverência na execução das tarefas e diante dos problemas de cada uma de nós, nos fez suportar a jornada. Acredito que se o grupo não fosse tão coeso, não teríamos conseguido.

A vida ficava cada dia mais complicada: as exigências dos professores em trabalhos extensos e complexos; a falta de tempo para a execução dos trabalhos e leituras de textos densos em sua maioria. Assiduidade; pontualidade, e a reflexão que o curso de Pedagogia exige dos graduandos, somados a um marido “abandonado” tendo que assumir toda a responsabilidade de uma família, filho alérgico precisando de cuidados e que mamou até os dois anos e meio (mais apegado a mãe), filhas adolescentes e seus problemas existenciais, além da rebeldia e revolta pela ausência da mãe. Noites sem dormir; ora por causa do bebê, ora pelos trabalhos e leituras, ora pelos afazeres domésticos, ora por problemas de relacionamento, entre outros.

Meu tempo era assim dividido: as manhãs estava em casa, mas acordava muito tarde por causa do meu horário de dormir. Não conseguia dormir antes das duas horas da madrugada. À tarde ia para a Universidade e de lá, para o trabalho, à noite. Como não almoçava antes de ir para a universidade por causa do horário em que acordava, sempre que possível o que era raro considerando o horário do término das aulas e a distância entre o campus e o meu trabalho passava na casa de minha mãe que reside próximo ao meu trabalho, para comer algo. Caso contrário, só comia ao chegar em casa, após as onze horas da noite.

Resumindo, acordava geralmente às 10h30min ou 11h00min. Saía para o campus às 12h30min, chegava a casa por volta das 23h00min/23h30min e nunca dormia antes das duas da madrugada. Por várias vezes ia dormir quando já estava amanhecendo.

Toda essa situação culminou em uma crise grave no casamento que evoluiu para uma crise familiar. E em uma crise de estresse que abalou minha saúde. Algum tempo depois, mais ou menos um ano e meio, vim a saber, segundo os médicos que me acompanham (dermatologista e reumatologista), que o estresse fez aflorar uma doença incurável, mas felizmente, controlável e não contagiosa, denominada de psoríase, a qual me obriga a tomar medicamentos em altas doses que interferem nas defesas do meu organismo, demandando uma preocupação maior e constantes exames laboratoriais e clínicos.

Nesse período morávamos perto de meus pais e, por não querer envolvê-los nessa crise, resolvemos comprar a nossa casa e tentarmos refazer o nosso lar. ( a casa em que morávamos era deles, uma das quais meu pai comprou por meio da aposentadoria).

Eu nunca havia saído de perto da minha mãe e além dos problemas que eu estava enfrentando precisei me afastar dela e fui morar na cidade de Parnamirim/Rn, onde não conhecia nada nem ninguém. Todo esse período foi muito desgastante (e ainda o está sendo!). O grupo foi crucial nesse momento, no sentido de não permitir que eu desistisse da universidade. Além de todo o apoio moral, intelectual, sentimental e tudo o mais que foi necessário, ajudaram nos trabalhos a ponto de se sacrificarem alguma vezes, realizando as tarefas mais complicadas me deixando com as mais simples.

Morar em outra cidade acrescentou problemas aos já existentes e intensificaram outros. Agora não podia mais contar com a ajuda de minha mãe e a família teria que se adaptar a nova realidade e novas tarefas. Outro lado foi o tempo gasto no trajeto somado aos horários dos ônibus, além do financeiro: as passagens em Parnamirim são mais caras que as de Natal.

Pouco tempo antes da nossa mudança para Parnamirim, minha filha mais velha é aprovada no vestibular para o CEFET/RN[7], Curso de Tecnologia e Desenvolvimento de Software - TDS. Isso veio coroar uma trajetória de dedicação aos estudos, sendo sempre elogiada pelos professores nas escolas que freqüentou. Minha imensa alegria e orgulho foram ofuscados pela preocupação em relação ao meu filho pequeno. Minha outra filha, que não quis mais estudar, resolveu trabalhar como operadora de caixa em uma farmácia. Ficou mais complicado ainda não contar integralmente com as duas filhas mesmo tendo meu esposo em casa por alguns dias na semana, propiciado por sua escala de trabalho de 24/48 horas.

Com a continuidade, a minha filha do meio decidiu sair de casa. Acredito que essa decisão surgiu pelo ambiente familiar, pela falta de comunicação da família (impossibilitado pelo tempo disponível de cada um dos membros) e também por não ter conseguido “se encontrar” em seu relacionamento com o pai, em minha ausência não pude estar conduzindo essa situação.

Analisando hoje tudo isso, não consigo explicar como cheguei até aqui. O que sei é que Deus é o Deus dos impossíveis e esteve e está presente em todos os meus momentos. Isso é visível desde o meu ingresso na academia. O apoio dos familiares e dos amigos foi fundamental. Não só o apoio moral, mas a ajuda concreta de todos, inclusive de alguns professores.

A batalha por essa conquista foi travada por todos os que me cercam, quer de forma positiva, me auxiliando, me incentivando, construindo junto. Quer em forma de empecilhos, fazendo nascer e desenvolver em mim, o desejo e a necessidade de superação dos obstáculos. Dessa forma, todos contribuíram para o meu crescimento, fazendo de mim um ser humano menos frágil, mais reflexivo e com uma visão de mundo menos egoísta e mais abrangente.
O processo da vida se opera em tentativas sucessivas de libertação. Estamos todos os dias renovando, na criatura que fomos na véspera, a criatura que seremos no amanhã. Mais do que renovando-a: refazendo-a, porque não tornamos ser jamais o que fomos [...]. (MEIRELES, 2001).



3 SEGUNDO RELATO


3.1 Família de Origem

Nasci no ano de 197l, em Cachoeira do Sul no Rio Grande do Sul. Morava numa área rural dessa cidade, numa família de agricultores. Meu pai trabalhava na feira-livre, fazia plantação e tirava leite para vender. Minha mãe era dona de casa. Cuidava dos filhos e ajudava nas atividades da chácara, tanto na plantação quanto para cuidar dos animais.

Eu tenho mais três irmãos: o mais velho, chamado Antônio Carlos, uma irmã mais nova, chamada Adriana e outra bem mais nova de nome Tâmara.

Meu pai sempre foi muito agressivo, severo, ríspido, incompreensivo. Muitas vezes, até cruel. Nós morávamos em um sítio onde existia fartura: um arvoredo muito grande com uma variedade de frutas; lavoura com mandioca, milho, milho para pipoca; horta com cenouras, repolho. Tínhamos animais: vacas, cavalos, porcos, galinhas. Deveria ser um ambiente de fartura, mas não era, porque ele proibia a família de ter acesso a essa fartura. Ficava restringindo o que podíamos comer ou não.

Quando ele saía, nós podíamos comer um pouco melhor. Comer um pouco mais de frutas. Pelo que me lembro, a única coisa que podíamos ter acesso era o arvoredo, onde tinham caquís e tangerinas ou bergamotas, como chamamos na minha terra. Só tínhamos livre acesso a esse ambiente.

Minha mãe sempre foi muito amorosa, afetuosa e dedicada aos filhos. Sempre procurou nos proteger das ações agressivas do meu pai e nos dar uma alimentação melhor. Dentro do possível procurou alimentar-nos muito bem, contrariando as imposições do meu pai.

Antes de iniciar minha vida escolar, três fatos, relacionados ao estudo, vêm à minha lembrança: o primeiro refere-se às reuniões após o jantar. Meu pai, minha mãe e meu avô Antônio Pedro reuniam-se no pátio próximo a casa para conversar. Naquele período nós não tínhamos televisão o que propiciava esse momento que se tornou um costume de família.

Eu ficava encantada escutando. Discutiam sobre política, presidencialismo, sobre a economia do país e sua repercussão na agricultura. Toda a noite tinha uma discussão sobre temas relevantes. Eu ficava calada, pois criança não podia falar - “não era conversa de criança!”.

A informação chegava por meio de rádio. Meu avô ouvia muito o rádio para ficar atualizado e também para ouvir as notícias. Na minha cidade tinha um programa chamado “à hora da comunicação” e foi criado para que as pessoas trocassem recados entre si, dessa forma, as pessoas que moravam na cidade mandavam notícias para as que moravam no interior e vice e versa. Por muito tempo essa foi uma importante forma de comunicação entre os que moravam na cidade e os do campo.

O segundo fato importante refere-se ao que ocorria aos sábados. Meu pai ia para a feira-livre e sempre trazia o jornal “zero hora” o qual continha um caderno denominado de “folhinha da criança”. Nessas folhinhas, aconteceram meus primeiros contatos com a leitura e com atividades educativas. Era uma alegria quando o meu pai chegava com o jornal e entregava para nós o caderno infantil. Quando ele terminava de ler o restante do jornal, deixava que folheássemos um pouco. Esses momentos foram muito significativos, pois, apesar de nossa vida ser simples, ele priorizava a compra desse jornal. Mesmo sendo ele muito avarento e egoísta esse jornal ele fazia questão de comprar.

O terceiro ponto que considero importante, foram os comentários e conselhos da minha mãe em relação à escola e aos estudos. Quando queríamos comprar algo que não podíamos naquele momento ela nos orientava para que estudássemos muito e aprendêssemos muito na escola porque dessa forma poderíamos conseguir um bom emprego e futuramente compraríamos, não Sá aquilo que estávamos querendo, mas tudo o que quiséssemos. Continuava dizendo que não nos preocupássemos, pois tudo daria certo. Isso me motivou a querer estudar.

Outra motivação era a visão do meu irmão indo para a escola. Isso nos fazia sonhar com o momento em que iríamos estudar o que só ocorreu quando eu completei oito anos de idade. Fui matriculada em uma pequena escola da área rural da nossa cidade. Meu ingresso com essa idade se deu porque minha mãe preferiu que eu esperasse que a minha irmã Adriana completasse a idade de sete anos, que era a idade mínima exigida para ingressar na 1ª série primária. Dessa forma poderíamos ir juntas. A escola era muito distante e não era seguro andarmos sozinhas.

Aprendi a ler e a escrever na primeira série por meio de uma cartilha na qual colávamos as atividades que consistiam em a professora colocar as letras a serem estudadas junto com um desenho e ao lado as combinações que poderiam ser feitas. Deveríamos então, combinar as letras que estávamos estudando no momento com outras anteriormente estudadas e formar palavras.

Foi um ano bem difícil, pois eu sentia dificuldade para ler as palavrinhas e mais ainda de aprender Matemática que se resumiam apenas nas “continhas de mais e menos”. Não recordo de ter visto alguma atividade mais significativa ou que estimulasse o raciocínio lógico. Assim sendo, eram muito difíceis de aprender mas a professora queria que aprendêssemos logo. Como não conseguíamos, ela ficava com muita raiva e nos tratava de forma ríspida. Daí ficávamos nervosos e não conseguíamos realizar as tarefas.

Nesse período, minha mãe reunia os filhos e mais algumas crianças das redondezas e auxiliava nas tarefas escolares. Sua paciência e carinho nos faziam compreender melhor as tarefas. Acredito que aprendi muito mais com a minha mãe que só havia cursado até o 4º ano primário do que com a professora, pela sua rispidez.

Na 2ª série conheci a professora Neves. Além de nos ensinar a ler e a escrever, ensinou alguns conteúdos sobre a nossa cidade, da nossa região. Ela costumava levar para a sala de aula livros de literatura clássica ricamente ilustrada com cores fortes. Ainda hoje recordo daqueles lindos livros. Com eles fazia a leitura e contação de histórias. Essa postura me fez gostar de contação e de ler. Essas atividades muito me fascinavam.

Naquela época eu sonhava em possuir aqueles livros tão cheios de aventura e alegria, mas não podia. Hoje, felizmente, já posso comprar livros para a minha filha. Livros esses, tão bonitos ou melhores que aqueles, os quais também aproveito e me divirto lendo.

Ao chegar a 5ª série, precisei estudar em outra cidade, pois onde eu estudava não oferecia o curso ginasial. Fui matriculada em uma escola simples denominada de Escola Polivalente. Possuía uma boa estrutura física: um pátio grande com quadra para diferentes esportes, laboratórios, oficina de marcenaria, sala para educação doméstica e biblioteca ampla e com um grande acervo. Era uma excelente escola.

Em sua grade curricular eram oferecidas as disciplinas da base comum e na parte diversificada, ofereciam as disciplinas de Técnicas Agrícolas, Técnicas Industriais e Técnicas Domésticas. Realmente não vi muito proveito nessas disciplinas. O que realmente aproveitei nessa escola foi a biblioteca. Lá tínhamos livre acesso além de podermos emprestar os livros. Além disso, era um ambiente agradável e acolhedor, ideais para estudarmos.

O que me chamava a atenção nessa escola era a atividade de confecção de murais que eram afixados nas salas de aula e também na biblioteca. Esses painéis foram os meus primeiros trabalhos em grupo.

Na 8ª série mudei novamente de escola. Nesse ano fui eleita líder de sala. Essa experiência muito me ensinou, pois aprendi a me relacionar melhor com os colegas e com toda a comunidade escolar.

O segundo grau eu fiz em outra escola, localizada praticamente no centro da cidade. Era uma escola antiga na qual estudou meu pai. Lá, ele chegou a concluir o segundo grau. Nessa escola cursei o 1º e o 2º ano do Científico. Havia tentado entrar no Magistério, mas não consegui. Então resolvi fazer o Científico mesmo.

No último ano do Científico parei de estudar, pois precisei trabalhar. Transferi meus estudos para o turno da noite, porém, não consegui estudar e trabalhar, pois minha casa ficava muito longe da escola, e eu chegava muito tarde e era muito cansativo. Passei dois anos sem estudar. Isso foi muito triste, pois estudar pra mim era muito importante e eu não estava conseguindo.


3.2 Família Atual

Mais tarde casei, saí do emprego e vim para a cidade do Natal/RN. Logo que cheguei procurei estudar e, terminei meu Científico. Finalmente estava voltando a estudar. Pensava em trabalhar mais não queria perder a chance de terminar meus estudos.

Meu casamento trouxe algumas surpresas. Eu era muito nova e não tinha idéia do que significava assumir um casamento, assumir um lar. Inicialmente senti muita dificuldade. Deparei-me com situações muito difíceis. Em muitos desses momentos lembrei-me das palavras da minha mãe dizendo que tudo poderia melhorar. Tudo eu conseguiria realizar e o meio para isso eram os estudos, então persisti.

Concluí o Científico e cursei dois anos de Magistério. Nesse período conheci professores muito especiais, motivados, dinâmicos e inteligentes, que aumentaram o meu gosto pelos estudos e me mostraram o curso de Pedagogia. Passei então a desejar fazê-lo.

Comecei a estudar para o vestibular, inicialmente sem apoio, tanto financeiro quando de incentivo. Estudava em casa pelos livros e por meio da televisão com os programas do Telecurso do 2º grau. Logo depois descobri os aulões do Aluízio Machado, aos quais freqüentei por muito tempo. Sempre procurei revisar o conteúdo em casa. Até que em determinado momento o meu esposo percebeu a minha determinação e perguntou se eu queria fazer um cursinho. Ocorreu que engravidei nesse período e fui obrigada a adiar essa oferta.

Parei de estudar fora, tive minha filha a quem me dediquei totalmente, pois ela nasceu com alergia e apresentava muitos problemas respiratórios, necessitando de muitos cuidados. Isso durou até ela completar três anos de idade, quando a matriculei em uma escola, no período vespertino.

Aproveitei o horário da tarde e retomei meus estudos. Matriculei-me em um cursinho oferecido por Aluízio Machado do qual não recordo o nome. Ocorreu de não terem sido preenchidas as vagas para formarem uma turma naquele período e por isso me foi oferecida uma bolsa no CDF, pelo qual eu pagaria o mesmo valor do cursinho do Aluízio Machado.

O ano do cursinho foi muito difícil e desgastante. Eu acordava às 06h00min e estudava até às 08h00minhs, que era a hora que geralmente minha filha acordava e eu ia cuidar dela. Cuidava também da casa e do almoço. Às 10h00min a arrumava para a escola, cuidava do material e do lanche e às 11h00min almoçávamos. Logo após, saíamos. Ela para a escolinha e eu para o cursinho.

Em muitos momentos Márcia teve crises alérgicas, me obrigando a passar praticamente a noite toda acordada cuidando dela. Quando isso ocorria, ficava muito difícil assistir as aulas por causa do sono. Algumas vezes precisei me beliscar pra me manter acordada, pois sabia que, se não aprendesse naquele momento, não teria tempo de fazê-lo em casa, Não teria outra oportunidade. Isso ocorreu por várias vezes durante esse ano.


3.3 O Ingresso na Universidade

Chegando à época do vestibular fiz as provas. Achei até complicado e não imaginava que passaria. Fiquei me condenando achando de não havia me esforçado o suficiente, nem durante o ano, nem durante o processo seletivo. O fato é que para minha surpresa, fui aprovada. Como poderia ter passado se algumas disciplinas eu sequer havia estudado em casa?

Passei então a me preocupar se teria condições para pagar todas as disciplinas. Pensei em me matricular apenas em algumas, pois acreditava que eu não daria conta de todas. No dia da matrícula resolvi, não sei o porquê, me inscrever em todas as que eram oferecidas.

No início do semestre tudo era novidade. O trote foi uma diversão. Foi muito bom conhecer pessoas, fazer novas amizades. O tempo foi passando e as coisas foram se complicando. Era muito difícil ter que ler aqueles textos. Muitas vezes eu confundia os textos de uma disciplina com os de outra, pois eu não conseguia distingui-los muito bem.

Os primeiros textos que precisei escrever para a disciplina de Psicologia eram muito difíceis. Precisei passar os finais de semana todos em torno do mesmo texto pensando, escrevendo e reescrevendo. Finalmente conseguia entendê-los e realizar as tarefas e, felizmente, as notas foram satisfatórias. Isso me alegrou e me motivou a continuar.

A correria dos primeiros períodos foi muito grande. Para dar conta de tantas disciplinas eu estudava também nos finais de semana. Durante a semana, estudava algumas horas pela manhã. À tarde, ia para a universidade.

Nesses períodos iniciais formamos um grupo de estudo com mais cinco pessoas. Esse grupo começou sua formação para os trabalhos em sala de aula. Depois continuamos nos reunindo nos finais de semana para a elaboração trabalhos e revisão de conteúdos.

Considero esse grupo como meu, pois fez parte da minha vida dentro da universidade. Muitas vezes passávamos mais tempo juntas do que com as nossas famílias.

Nos primeiros períodos nós não tínhamos muita prática para organizar seminários e foi preciso nos reunir pelas manhãs. Houve semestres nos quais, logo que acabávamos a apresentação de um seminário, iniciávamos a preparação para outro.

Em muitas manhãs, chegávamos cansadas, com dores no corpo, com sono, esgotadas, mas era preciso continuar e preparar o seminário para apresentar.

Em um desses encontros, de manhã, a turma se reuniu e todas estavam muito cansadas. Uma das pessoas olhou para o resto do grupo e disse: “__ Vamos Chorar?”. Eu reuni minhas forças e disse: “__ Não! Ninguém vai chorar aqui! Nós vamos realizar o trabalho!”.
Logo depois, começamos a fazer o trabalho. Todas se esforçaram muito. Terminamos e almoçamos na universidade mesmo. Apresentamos à tarde e o resultado foi muito positivo. Foi uma grande vitória.

Nos primeiro semestres, lembro com alegria de alguns professores dedicados, compreensivos, que demonstraram conhecer a disciplina e realmente gostarem do que faziam, ou seja, dar aulas para a graduação. Porém, lembro de uma professora que, apesar de excelente enquanto pessoa nos confundia em relação aos trabalhos. Ela não era muito segura na orientação dos trabalhos, pois, no momento que os entregávamos, nos dizia que estava errado e que não os queria mais. Em uma dessas situações, quando estava executando um dos trabalhos que ela havia nos orientado, nos disse que não servia mais. Fiquei parada olhando para ela, tentando entender o “porquê”. Ela disse que não havia orientado daquela forma e que queria diferente. O curioso disso tudo é que acontecia com todos na sala de aula.

Situações como esta desgasta bastante e exige de nós estudantes, muita calma, muita paciência para não haver um descontrole. Muitas vezes precisamos nos resignar e procurar fazer o trabalho de forma a agradar os professores.

Outra professora simplesmente chegava à sala de aula, mandava ler alguns textos, fazia uma explanação superficial, rápida e ia embora. Pouco nos ensinou. Não ficou quase nada dessa disciplina. Tenho consciência de que é necessário que “corramos atrás”, que não fiquemos esperando apenas pelos professores, mas, existem alguns que a meu ver não fizeram a sua parte.

Do meio do curso em diante, meu grupo já estava com mais prática em fazer seminários e nós, felizmente, não precisamos mais nos reunir pela manhã. Chegamos ao consenso de que o melhor seria nos reunirmos aos sábados no horário da tarde.

Geralmente nos reuníamos em uma escola municipal em que trabalhava o esposo de uma das componentes do grupo. Procurávamos resolver os seminários no final de semana e quando não dava tempo, usávamos o horário de aula, definíamos por telefone, por mensagens no celular, pela Internet. Tentávamos ser mais ágeis e dinâmicas. Apesar das dificuldades, já não estava tão desgastante para o grupo como nos semestres iniciais, pois uma das maiores dificuldades era nos reunirmos pela manhã e à noite.

No início do curso, muitas vezes, nós só descansávamos um pouco, quando o semestre acabava, pois estudávamos durante a semana, nos finais de semana e também nos feriados. Era um desgaste muito grande. Ao chegar o final do semestre, estávamos tão cansadas de um ritmo tão intenso que o nosso organismo não queria parar e mesmo nas férias, tínhamos a sensação de que precisaríamos ler, ler, ler. Como se a nossa consciência estivesse cobrando, como ocorria durante todo o semestre. Essa sensação era tão forte que era comum sonharmos estudando. Quando a nossa mente aceitava que estávamos de férias estava quase começando o semestre seguinte.

No 8º semestre ao chegar o momento da docência, todas estavam apreensivas e com receio de não realizar um bom trabalho. Ocorreu que, justamente nesse período eu tive alguns problemas familiares e não suportei: “surtei”. Vale salientar que, quase todas nós, do grupo de estudo, passamos por crises de estresse ao longo do curso e graças a Deus, cada uma em um momento distinto o que possibilitou que os outros componentes pudessem “cobrir o desfalque” e ainda dar apoio moral.

No meu caso passei por um período negro em que não conseguia controlar a minha mente e os meus sentimentos. Entrei em um processo de depressão e desequilíbrio. Foi necessário recorrer a um psicólogo e a um psiquiatra o qual diagnosticou que eu havia desenvolvido a “síndrome do toque”, a qual consiste em um pensamento compulsivo obsessivo do qual a pessoa não consegue se libertar, provocando muita dor e sofrimento. Até o momento de hoje tomo medicamentos, mas já estou em fase de manutenção e dentro em breve poderei suspender as drogas.

Foi uma fase muito difícil tanto para mim quanto para o grupo. Como estávamos muito envolvidas, minhas colegas se sensibilizaram bastante com a minha dor, com o meu sofrimento. Porém, a colega que estagiou comigo, (o estágio foi realizado em duplas), sentiu com maior intensidade as conseqüências do meu estado.

Realizamos a docência, a qual foi muito desgastante considerando as circunstâncias. Foi um momento em que nos voltamos muito para Deus, pedindo ajuda, força e orientação para enfrentarmos mais essa batalha. As dificuldades foram tantas que eu senti necessidade de trancar a disciplina por medo de não realizar um bom trabalho. Fui convencida pela minha companheira de dupla a ir até o fim, que alegava que o máximo que poderia ocorrer seria uma reprovação, uma vez que a professora cooperadora fazia o acompanhamento da nossa docência e estava satisfeita com o nosso trabalho.

Estar em sala de aula nessas condições não foi fácil para nenhuma de nós, mas nós conseguimos. Apesar do desgaste, foi muito gratificante. Reconhecemos que não realizamos o trabalho da forma como gostaríamos, mas foi o que nos foi possível fazer naquele momento. Foi o nosso melhor. O maior ensinamento que ficou foi o de que Deus nunca nos abandona e que Ele nos ampara nos momentos mais difíceis.

Encontramos-nos no momento da Monografia e é um grande desafio. Por ser um trabalho individual nos afastamos um pouquinho, mas não totalmente. Procuramos ainda, conversar sobre nossos temas, trocar informações por telefone. Acostumamos-nos a trabalhar em grupo, com ajuda mútua e com troca de informações.

Durante todo o curso tivemos que deixar de lado a televisão, as diversões, os passeios o nos dedicar integralmente à universidade. Esse foi o preço: deixar tudo de lado. No meu caso a única exceção foi que procurei cumprir a minha missão com a minha filha. Dentro do possível procurei conversar sempre com ela, cultivar momentos de brincadeiras e dar um passeio aos domingos. Sempre que surgia a oportunidade procurava ter momentos de lazer com ela. Muitas vezes estava cansada, com muito sono, mas, fazia o possível e me esforçava para termos esses momentos porque considero muito importante essa proximidade entre mãe e filha. Não descuidei também, das tarefas da escola e procurei cumprir a agenda.

Nos quatro anos e meio tive dois focos principais em minha vida: a universidade e a educação da minha filha, pontos esses que considero fundamentais pois se refere ao meu desenvolvimento e o desenvolvimento e crescimento dela. Apesar de considerar esses pontos como fundamentais, precisei sacrificar alguns momentos que deveriam ser dedicados à minha filha, em prol da universidade.


3.4 Aspirações e Considerações Atuais

Apesar de todo o esforço, de toda a luta travada, não me arrependo e se preciso fosse faria tudo outra vez, modificando alguns pontos, é claro! Pretendo continuar estudando, talvez não no ritmo da academia, mas em algo que não consuma todo o meu tempo, pois quero me dedicar à prática docente. Quero ir para a sala de aula, inclusive para ter um retorno financeiro, afinal investi durante quatro anos e meio na minha formação.

Ao final do ano de 2000 iniciei um trabalho voluntário de evangelização em duas instituições. Está sendo um trabalho gratificante e muito interessante. Estou aprendendo muito sobre o ensino, a aprendizagem e sobre as crianças.

Tenho planos de me dedicar um pouco mais à evangelização infantil que considero fundamental. Penso em fazer uma especialização ou outro curso. O que tenho de certo é que, mesmos trabalhando, não vou parar de estudar, pois, apesar do esforço e disciplina que o estudo nos exige, nos ajuda a desenvolver e crescer.

A universidade me ajudou a desenvolver bastante. O primeiro ponto positivo foi que aprendi a trabalhar em grupo, respeitar as diferenças e valorizar as habilidades. Atualmente não me vejo trabalhando sozinha. Quando penso em planejar aulas ou executar projetos, tenho sempre em mente uma equipe.

No trabalho com evangelização havia certo individualismo. As pessoas envolvidas não costumavam discutir o trabalho. Quando passei a participar da equipe, procurei trabalhar de forma a haver uma maior integração dos envolvidos no processo. Hoje, conversamos mais e discutimos a metodologia que esteja mais adequada. Eles estão, aos poucos, aprendendo a trabalhar em conjunto. O resultado é bem mais positivo.

Outro ponto, é que aprendi a não ter medo de falar em público, a não ter vergonha de me manifestar em público. A ser mais objetiva e me expressar de forma mais clara. Antes eu “falava muito, mas dizia pouco”. Hoje meu vocabulário ficou mais claro. Se modificou.

Perdi o medo de me dirigir às pessoas, de conversar e expor as minhas opiniões. Ao chegar a uma instituição educacional, não temo me dirigir à direção, coordenação ou aos professores. Hoje sou mais segura.

Minha visão de criança, de sociedade e de mundo ficou mais ampla. Passei a entender melhor a dinâmica existente entre a sociedade e a escola. Aprendi a refletir sobre a escola e a realidade. Tudo isso também ajudou na minha vida pessoal, pois, passei a refletir sobre as minhas posturas e meus sentimentos. Consigo me comunicar de forma mais eficiente com os meus familiares e a entendê-los melhor.

Atualmente meu irmão é graduado por uma universidade particular. Resolveu fazer esse curso após ingressar na carreira militar como sargento. Minha irmã Adriana está cursando o 2º período de Letras pela UFRN e, minha irmã mais nova, foi promovida a gerente da escola em que atuava como professora das séries iniciais, pois havia cursado o Magistério. Ao fazer esse relato foi que percebi que todos nós nos direcionamos, por vocação, às áreas da educação. O mais surpreendente é meu irmão que não tinha nenhuma necessidade para tal uma vez que já estava na carreira militar e como efetivo.

Estou na etapa final da graduação do curso de Pedagogia e verifico que uma das maiores dificuldades foi realmente a falta de tempo. Durante todo o curso precisei priorizar a família e a universidade, dessa forma não sobrou tempo para as minhas necessidades. Talvez essa tenha sido uma das causas de eu ter desenvolvido a tal síndrome. Quem sabe? O que sei é que, apesar dos “contratempos”, tudo valeu muito a pena.
Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que-fazeres se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade. (FREIRE, 1996).



4 CONTRIBUIÇÕES DA UNIVERSIDADE


4.1 O “antes e o depois” nos âmbitos: social, afetivo/pessoal e profissional

Ingressar em um Curso Superior elevou, em muito, minha auto-estima. Após um período de inércia, no qual minha vida estava voltada apenas à sobrevivência, por ter duas filhas para criar e não ter um emprego fixo, minha vida resumia-se em trabalhar e cumprir as “obrigações domésticas”. Vivia sem perspectivas de avanços, conformada com o que a vida me oferecia. Essas eram as conseqüências de minhas escolhas por não ter valorizado as orientações de minha mãe em relação aos estudos que, segundo ela, seria o único meio de “ser alguém na vida”.

A baixíssima auto-estima em que me encontrava, nesse longo período de minha vida, apenas me fazia “ver” que havia perdido a oportunidade que a vida me dera. Que após constituir família a mulher não poderia mais viver a sua própria vida e sim viver em função do marido e dos filhos.

Essa visão de que a mulher, após constituir família deve se dedicar apenas ao lar, não é uma visão apenas minha e sim da grande maioria das mulheres. Essa colocação é confirmada em reportagem exibida no Jornal Nacional, nos dias 17, 18 e 19/05/2007, na qual, verificou-se que algumas donas-de-casa chegam, inclusive, a abandonar seus empregos para dedicarem-se ao lar. Como exemplo pode-se citar o depoimento da entrevistada Renata Nascimento Cabrera na qual diz: "Renunciei ao trabalho pra ficar com meus filhos, cuidar da minha casa e dar mais atenção ao lar, né?" (Jornal Nacional 17/05/2007).

No texto da mesma pesquisa citada, apenas 4% dessas mulheres concluem o Ensino Superior, tamanhas são as dificuldades de conciliar as tarefas inerentes aos papéis de esposa, mãe, estudante.

“Uma pesquisa feita no ano passado em nove grandes cidades mostra que apenas 4% das donas-de-casa conseguiram terminar uma faculdade; 58% têm só o primeiro grau; e 38% das donas de casa brasileiras têm mais de 45 anos de idade” (JORNAL NACIONAL, 17/05/2007).

O acesso a essas informações contribuiu para a minha conscientização do privilégio que é fazer parte desses 4%. Esses dados estatísticos têm uma significação muito além de números. Estar na universidade mudou meu olhar, meu pensar, meu perceber, meu proceder, meu compreender, ou seja, mudou a minha vida e de forma irreversível.

Ao analisar minha trajetória de vida, que é a proposta desse trabalho, pude verificar os avanços que a universidade me proporcionou, das quais considero como a mais importante, a ampliação da minha “visão da vida”. Essa nova forma de ver o mundo, que não é algo pronto, é um processo e como tal é gradual, contínuo e exige muita análise e reflexão, é uma releitura do observado sob diversos pontos de vista. É um olhar plural. É se colocar no lugar do outro para uma melhor compreensão de atitudes, valores e culturas.

Os direcionamentos dos professores da academia me despertaram para um olhar mais abrangente de mundo, me fazendo sair do egocentrismo em que me encontrava, no qual enxergava apenas “meu mundinho” que compreendiam a mim, meu esposo, meus filhos e tudo o que se relacionava a nós. Minha preocupação estava voltada exclusivamente para a subsistência. Viva para o trabalho e para o lar, em um mundo fechado, limitado e sem expectativas de futuro.

O acesso ao conhecimento fez de mim uma pessoa mais confiante, determinada, compreensiva, tolerante, sensata. Trouxe-me “maturidade responsável”, na qual é considerado não apenas o “eu”, mas o “todo”. Não apenas o ato, mas as conseqüências dos atos.

Tudo isso remete ao relatório Delors (1998), que traz uma nova concepção de educação, para a qual foram eleitas quatro premissas denominadas de “os quatro pilares da a educação”: aprender a fazer; aprender a conviver; aprender a ser e aprender a conhecer. Analisando de forma geral, a universidade me conduziu a um pensar crítico, a um agir autônomo, a refletir atitudes e valores contribuindo para a construção da minha cidadania enquanto sujeito de direitos e de deveres, levando-me ao cumprimento de minhas obrigações, a reivindicação de meus direitos, não desrespeitando o espaço dos outros.

Para a realização desse trabalho, precisei rememorar minhas vivências: dificuldades, superações, perdas, abstinências, renúncias, decepções, surpresas e também muitos bons momentos. Essas recordações fizeram-me reviver as dificuldades enfrentadas que foram tantas e tão intensas que passei a me fazer certas indagações: até que ponto vale a pena um ser humano enfrentar tantas dificuldades, tanto sofrimento pa concluir o Ensino Superior? Que motivações fazem um sujeito superar tantas dificuldades? O que me fez NÃO DESISTIR?

Essas indagações permaneceram em minha mente durante toda a realização do primeiro momento desse trabalho. Passei a buscar essas respostas e cheguei a conclusão que uma das causas de eu não ter desistido foi que não dava tempo pensar sobre isso. Nunca havia avaliado. Só tinha em mente que eu precisava aproveitar a oportunidade que a vida me oferecia e realizar um sonho que era de minha mãe, porque eu sequer ousava em sonhar tão alto. Claro que eu usufruía das honras de ser uma universitária, principalmente da “FEDERAL”. Mas, apenas satisfazer os anseios de minha mãe era muito pouco para tanto sofrimento.

Fui então orientada a analisar minha trajetória enfocando, não mais as dificuldades, mas as contribuições que academia trouxe para a minha vida. Comparar e analisar o “antes e o depois”. O que modificou em mim enquanto pessoa, profissional, mãe, esposa, filha, cidadã. Tudo isso falava de valores, posturas, consciências.

Essa orientação, essa mediação foi o diferencial. Esse direcionamento me fez enxergar que, sem exagero algum, “a universidade mudou a minha vida”. E o que antes eu não conseguia visualizar, agora era muito nítido. Uma “descoberta” surpreendente e maravilhosa. Incrível como as dificuldades conseguiram camuflar algo tão grandioso. Após esse reconhecimento, as dificuldades se tornaram tão insignificantes...

As contribuições da universidade em minha vida remetem a uma metáfora a que tive acesso no decorrer do curso que tinha como título: “A águia e a Galinha”, (BOFF, 1997), na qual o autor fala de uma águia que é criada como galinha e como tal não aprendeu a voar porque não tinha conhecimento de que poderia fazê-lo. Essa metáfora ilustra muito bem minha história de vida: Nasci com todo o potencial para ser “águia”, mas por desconhecer esse potencial, não havia alçado os “vôos” que minha condição de “águia” me proporcionava.

A universidade me fez perceber esse potencial por meio de desafios, que me foram propostos ao longo do curso, os quais me levaram a restaurar minha condição de águia e hoje posso alçar vôos que, a cada dia que passa, alcançam maiores distâncias e maiores alturas, antes inimagináveis.

Um exemplo desses “vôos” no âmbito profissional, é que eu tenho um emprego de nível elementar e nesse momento, faltando ainda poucos dias para a conclusão de minha graduação em Pedagogia, fui aprovada em um concurso de nível superior, no qual atuarei como professora das séries iniciais.

A metáfora acima citada (anexo A), é parte integrante da obra de Leonardo Boff: “A águia e a galinha, uma metáfora da condição humana” (1997). Faz parte, também dessa obra o texto abaixo, o qual considero relevante, uma vez que também ilustra minha condição anterior em não “sequer ousar sonhar” com um Curso Superior, considerando “meu limitado mundo”, descrito no relato, no início desse trabalho. O texto intitulado “todo ponto de vista é a vista de um ponto”, do autor Leonardo Boff, explica muito bem minhas atitudes, minhas posturas e a falta delas, antes de cursar o Ensino Superior:

[...] A cabeça pensa a partir de onde os pés pisam. Para compreender, é essencial conhecer o lugar social de quem olha. Vale dizer: como alguém vive com quem convive que experiências têm em que trabalha que desejos alimenta, como assume os dramas da vida e da morte e que esperanças o animam. Isso faz da compreensão sempre uma interpretação.

Sendo assim, fica evidente que cada leitor é co-autor. Porque cada um lê e relê com os olhos que tem. Porque compreende e interpreta a partir do mundo que habita. (BOFF, 1997, p.9).

O reconhecimento dos avanços proporcionados pela universidade em minha vida só foi possível, graças à mediação de meu orientador. Ele foi o diferencial. A forma de como ele conduziu esse trabalho trazendo-me desafios, levando-me a refletir e refletir muito sobre as situações, fez com que me viesse à consciência o quanto a universidade modificou a minha vida e que as muitas dificuldades enfrentadas durante o curso estavam camuflando essa percepção. Acredito que se eu tivesse tido essa consciência antes, teria aproveitado melhor as oportunidades do “mundo acadêmico” e apreendido os ensinamentos com muito mais propriedade.
O conhecimento sempre foi e sempre será o mais poderoso instrumento ao alcance da pessoa e da sociedade para resolver seus problemas e atingir seus objetivos, incluindo os econômicos. Ele é a base da civilização e é o elemento-chave que distingue o homem dos animais, que distingue um homem do outro, uma nação da outra. (XAVIER 1998).



5 CONSIDERAÇÕES FINAIS


5.1 Perspectivas para prática docente

Estou concluindo minha graduação no Curso de Pedagogia e, como citei anteriormente, irei atuar como professora das séries iniciais pelo Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI, no município de São José de Mipibu/Rn, do qual farei parte do quadro de efetivo.

Minhas expectativas são muitas. Estou ansiosa ao mesmo tempo em que temerosa pela grande responsabilidade que terei em iniciar, de fato, minha docência com crianças, uma vez que a experiência que possuo resume-se ao estágio assistido, que é parte obrigatória para a integralização do Curso de Pedagogia e é propiciado pela Disciplina Prática de Ensino na Escola de 1º Grau, o qual foi realizado em dupla, em uma escola municipal desta cidade.

Apesar do pouco tempo, avalio essa experiência de forma muito positiva, uma vez que os resultados foram satisfatórios. Nessa prática, tentamos aplicar a Pedagogia Freinetiana, por entendermos que essa forma de atuação permite ao educando expressar-se livremente conforme suas aptidões naturais, ao mesmo tempo em que propicia a cooperação e conseqüentemente a preparação para o convívio com a coletividade. Essa pedagogia dá voz e vez a criança e isso fala de respeito.

Durante a realização dessa prática pudemos observar que as crianças avançaram bastante no aprendizado e também no quesito “cooperação”, uma vez que identificamos durante a observação que antecede a prática que elas demonstraram certo individualismo. Esse quadro foi se modificando no decorrer de nossa docência e evidenciou-se na realização dos trabalhos propostos para o encerramento de nossa prática docente.

Na tarefa final da docência assistida, dividimos a turma em grupos conforme afinidades, e cada grupo deveria realizar uma das tarefas propostas, as quais consistiam em: elaborar um texto (anexo C); criar um painel (anexo D); criar uma poesia (anexo E) ou compor uma paródia (anexo F). Cada tarefa deveria versar sobre o tema do projeto que foi trabalhado em sala de aula: O Estatuto da Criança e do Adolescente.

Apesar de as crianças não se sentirem muito seguras, sentiram-se motivadas porque o tema que foi proposto e abordado em sala de aula, estava adequado à realidade deles, além do que,foram informados que o trabalho final seria apreciado pelos demais colegas de uma sala vizinha. Dessa forma, os alunos sentiram-se animados e incentivados a executarem as tarefas, apesar das dificuldades iniciais a da baixa auto-estima apresentada, por não sentirem-se capazes de realizá-las.

Em relação à adequação dos conteúdos à realidade dos educandos, em Freinet, o autor Vilaplana (2003), escreve:

A estrutura curricular é necessária, mas deve submeter-se às necessidades, às expectativas, às contextualizações de fora da escola, que todas e cada uma das crianças trazem consigo. E se partimos da idéia de que é a criança que aprende e que a organização curricular deve subordinar-se às suas capacidades de aprendizagem, estamos considerando a organização das aulas a partir dos interesses dos alunos. Conseqüentemente, obedecemos ao princípio da integralidade. (SEBARRODA et. al, 2003, s/p).

Todos ficaram muito orgulhosos do trabalho realizado e nós mais ainda ao constatarmos que a competição havia diminuído entre eles. Na apresentação dos trabalhos, os grupos cooperaram entre si e inclusive torceram uns pelos outros. Houve comemoração pelo sucesso de cada grupo. (anexo G). Foi uma experiência realmente gratificante constatar os avanços em um espaço tão curto de tempo.

Em relação à proposta frenetiana, a autora Elias (1996) diz como age um professor:

Atua no grupo como colaborador mais experiente e auxilia a criança a elaborar, a realizar e a concluir seus projetos. Seu papel é o de coordenador das atividades, o de criar condições para que, durante o trabalho escolar, a criança se expresse e seja ouvida, para que ela aja para aprender e para que, por meio da vida cooperativa, exerça sua cidadania. Sua responsabilidade é de assegurar as condições técnicas e materiais para que, na sala de aula, torne-se possível a realização de um trabalho vivo, que dê sentido social imediato às aprendizagens realizadas pelas crianças.

Assim sendo, pelo sucesso dessa experiência e por acreditar que por meio da educação o sujeito pode mudar a sua realidade e ainda, por entender que é papel da escola preparar o sujeito, não apenas para o desenvolvimento de aspecto profissional e sim para o desenvolvimento integral: intelectual, profissional, cognitivo, afetivo, etc.,. Em relação à aplicação das técnicas frenetianas e sua eficácia, Vilaplana, escreve:

Aplicar as técnicas de Freinet significa dar a palavra ao aluno. Partir dele, de suas capacidades de comunicação e de cooperação. Tudo isso supões considerá-lo não como parte de um único contexto, O escolar. Mas como partícipe de diferentes contextos. Por outro lado, devem-se considerar as influências que se desencadeiam nos diferentes contextos e que se traduzem em peculiaridades nas inter-relações dos indivíduos dentro do marco do grupo-sala de aula. É aí então que a escola se abre para a vida. (VILAPLANA, 2003, p.75).

Com essa visão é pretendo realizar minha prática docente baseada nessa pedagogia, uma vez que considero que em Freinet encontro respaldo teórico-metodológicos para o atendimento dessas necessidades, além do respeito que deve ser dispensado aos meus futuros alunos.


5.2 Perspectivas para a continuidade da formação

Por entender que a formação do sujeito é um processo e que ele nunca atinge o grau máximo de seu potencial de aprendizagens é que pretendo continuar com a minha formação buscando, a cada dia, o meu desenvolvimento intelectual. Freire (1996), fala do “inacabamento do ser humano”, nesse sentido, enquanto vivermos devemos buscar aperfeiçoamento.

Acredito que a minha pratica docente, me trará um rico aprendizado que será propiciado pela interação, pelas trocas de conhecimento com os meus alunos. Em relação a essas “trocas” na prática docente, Freire (1996) ressalta:

[...] quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado. É nesse sentido que ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos nem formar é ação pela qual um sujeito criador dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado. Não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos apesar das diferenças que o conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro. (FREIRE, 1996, P.23).

Pretendo, na continuidade de minha formação, ingressar em um curso de Psicopedagogia, pois entendo que esse Curso de Especialização complementará minha formação como pedagoga, uma vez que entendo que esse curso me trará uma maior capacitação e como tal poderei propiciar um ensino com maior qualidade. Dessa forma, meus alunos serão melhores assistidos.

Querer proporcionar uma educação pública de qualidade é muito relevante para o momento porque essa instituição vem sofrendo inúmeras críticas no sentido de ter suas qualidades questionadas. O autor Freire (2003), acredita na mudança desse quadro:

Não aceito que a escola por si só seja ruim, precisamos ir mais além da compreensão metafísica da escola. Para mim, a escola é uma instituição social e histórica, e ao ser uma instituição social e histórica, a escola pode ser mudada, (FREIRE, 2003, P.207).

Assim como o autor, também acredito que a escola pública pode ser mudada e quero fazer parte dessa mudança. Quero contribuir para a construção de um fazer pedagógico eficiente, organizado, voltado para os interesses da população. Quero contribuir para uma escola de qualidade, que realmente atenda as necessidades do ser humano no sentido de prepará-lo para a vida. Uma escola que vise não fazer do homem um ser consumista, individualista, competidor, que segundo Michael Apple (2000), é conseqüência da junção do “Capitalismo, Neoliberalismo e globalização”, mas, fazer parte de uma educação que vise humanizá-lo. Que trabalhe sua formação enquanto cidadão reflexivo, crítico, autônomo. Que seja consciente de seus direitos e deveres, respeitando a si e aos outros, e dessa forma contribuam para a construção de uma sociedade mais justa e mais humana.

Buscarei continuar refletindo sobre a minha prática docente e dessa forma permanecer me capacitando, pois, segundo Freire, o professor deve estudar:

O professor que não leva a sério sua formação, que não estude, que não se esforce para estar à altura de sua tarefa não tem força moral para coordenar as atividades de sua classe. (FREIRE, 1996, P.92).

Por entender que a formação docente é essencial para uma educação eficaz e que o respeito e a admiração só se efetiva por meio de uma conquista diária, é que buscarei conquistar meus alunos. Para essa conquista é fundamental o respeito que, nessa visão, se traduz na valorização dos alunos.


5.3 Mensagem aos pedagogos

Uma vez que esse trabalho pretende servir de incentivo e motivação para que as mulheres busquem ingressar em um Curso Superior, quero deixar registrado um texto que me deixou muito orgulhosa pela escolha do Curso de Pedagogia, ao mesmo tempo em que reafirmou a grande responsabilidade do “ser pedagogo”. Nesse texto, o autor Pérez, relata uma situação vivenciada pelo grande Péricles, no qual elogia o trabalho do pedagogo por sua importância e grandiosidade:

O grande magistrado Péricles, cuja personalidade dignificou todo o século V a.C. que se conhece precisamente como o século de Péricles, entendeu cabalmente a missão do mestre como forjador da personalidade e da consciência dos povos. Em certa ocasião, Péricles mandou reunir todos os gênios e artistas que tinham contribuído para engrandecer Atenas. Foram chegando os arquitetos, engenheiros, escultores, os guerreiros que defendem a cidade, os filósofos que propuseram novos sentidos para a vida...

Todos estavam ali: do severo matemático que apreciava, no número, o sentido helênico da exatidão e da harmonia, ao astrônomo que perscrutava o universo para contemplar e estudar a harmonia da estrelas.

Mas Péricles percebeu uma ausência notável: faltavam os pedagogos, homens muito modestos que se encarregavam de conduzir as crianças pelo caminho de sua aprendizagem.

__ onde estão os pedagogos?

__ perguntou Péricles.

__ não os vejo em lugar algum. Vão buscá-los.

Quando por fim chegaram os pedagogos, Péricles falou:

__ aqui se encontravam aqueles que, com seu esforço e perícia, transformam, embelezam e protegem a cidade. Mas faltavam vocês, que têm a missão mais importante e elevada de todas: a de transformar e embelezar a alma dos atenienses. (PÉREZ, 2002).

Hoje me encontro na mesma situação desses pedagogos em relação a minha formação. Pretendo, enquanto pedagoga, sentir-me igualmente homenageada. Para isso é que me dedicarei a esse difícil e gratificante ofício. Tenho consciência de que a educação é um processo, e como todo processo, demanda tempo, que poderei nem ver os frutos do meu trabalho, mas terei a certeza de que os alunos que por mim passarem, venham a ser cidadãos íntegros e com esse perfil se estabeleçam na vida. O que acredito é que nesse processo poderei contemplar alguns indícios do “embelezamento de suas almas”. É como plantar uma árvore frutífera: prepararei a terra, colocarei as sementes e regarei. Poderei não ver os frutos, mas apreciarei o desabrochar dos brotos. Pela preparação da terra e pelos brotos poderei imaginar a qualidade dos frutos que a humanidade colherá amanhã.


REFERÊNCIAS

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BOFF, Leonardo. A águia e a galinha. Ed. Vozes Nobilis, 1997. http://alfabetizacaosolidaria.wordpress.com/a-aguia-e-galinha/. Acesso em 10/06/2007.

BOFF, Leonardo; AGGREY, James. Todo ponto de vista é a vista de um ponto. In: A águia e a galinha. Ed. Vozes Nobilis, 1997.

CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: artes de fazer. (trad. Ephrain F. Alves). Petrópolis, RJ: Vozes, 1994.

DELORS, Jaques. Educação: um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez, 1998.

ELIAS, Marisa Del Cioppo. A vida na sala de aula frenetiana. In: Pedagogia Freinet: Teorias e Prática. Campinas, SP. Papirus, 1996 (Coleção Práxis).

FREIRE, Paulo. Não há docência sem discência. In: Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

JORNAL NACIONAL. Donas-de-casa: o universo de quem trabalha no próprio lar Entrevista realizada em 17/05/2007. Disponível em http://jornalnacional. globo.com/Jornalismo/JN/0, ,AA1542796-3579- 677851-44684,00.html. Acesso em: 10/06/2007.

LÜDKE. M.; ANDRÉ, M.E.D.A. Métodos de Coleta de Dados: observação, entrevista e análise documental: In ___. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 186, p. 25-44.

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Metodologia Científica. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2000.

MEIRELES, CecÍia. Obra em Prosa. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 2001.

PÉREZ, Esclarín Antônio. Educar valores e o valor de educar – Parábolas. São Paulo: Paulus, 2002.

PRADO, Guilherme do Val; SOLIGO, Rosaura. Memorial de formação: quando as memórias narram a história da formação. Mimeo – UNICAMP, 2004.

VILAPLANA, Enric. In: SEBARRODA, Jaume (Org.). Pedagogia do Século XX. Porto Alegre: Artmed, 2003.

XAVIER, Ricardo de Almeida Prado. Capital intelectual: administração do conhecimento como recurso estratégico para profissionais organizações. São Paulo: Editora STS, 1998.


Publicado por: Selma Maria Freire da Silva

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