Complicações no pós-operatório imediato de transplante hepático: evidências para assistência de enfermagem intensiva

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1. INTRODUÇÃO

“As doenças hepáticas avançadas são responsáveis pelas alterações metabólicas, desnutrição, perda da massa e da função musculares, alterações respiratórias e demais sintomas relacionados com a hepatopatia [...]” (BARCELOS et al., 2008, p. 186).

A insuficiência hepática aguda é definida pela presença de encefalopatia hepática que ocorre como consequência do dano severo no fígado em pacientes clinicamente sem doença prévia do fígado. As causas mais proeminentes incluem dano do fígado induzido por drogas, hepatites virais e doença autoimune do fígado. Muitos casos (cerca de 20%), não têm causa reconhecida (VIANA et al., 2008).

Diniz-Santos et al. (2004) acrescentam que a insuficiência hepática aguda é definida pelo início de icterícia, coagulopatia e encefalopatia dentro de oito semanas, na ausência de doença hepática prévia. Há diversas causas para insuficiência hepática aguda: doenças metabólicas, anormalidades vasculares, quadros induzidos por drogas (acetaminofen, Amanita) e hepatites virais, as quais respondem pela maioria dos casos de insuficiências hepáticas agudas pediátricas em muitas áreas do mundo. A hepatite tipo A é uma das causas mais importantes da insuficiência hepática em crianças, além da hepatite B, D e E, o vírus Epstein-Barr, citomegalovírus, parvovírus e superdoses de acetaminofen.

Mesmo que haja evidência de características genéticas específicas nos vírus encontrados nos pacientes com insuficiência hepática aguda, o motivo de pacientes com hepatite A apresentarem insuficiência hepática aguda, mesmo que a maioria deles apresente um quadro autolimitado, ainda não é conhecido (DINIZ-SANTOS et al., 2004).

Cintra e Sanna (2005) explicam que transplante diz respeito à remoção ou isolamento parcial de uma parte do corpo que é implantada no corpo da mesma pessoa ou de outra. Este procedimento terapêutico está bem estabelecido e apresenta progressos quanto aos seus resultados, em decorrência do aprimoramento da técnica cirúrgica, de novos medicamentos imunossupressores, de métodos mais eficazes de conservação de órgãos e da melhor compreensão e controle de fenômenos imunológicos.

Em relação ao transplante do fígado, segundo Parolin et al. (2002) é um procedimento aceito como terapia eficaz nas doenças hepáticas avançadas, inclusive na cirrose alcoólica.

Silva et al. (2005) afirmam que o transplante hepático tem mostrado ser um procedimento efetivo no tratamento de várias doenças hepáticas.

Schulz et al. (2009) enfocam que o transplante hepático é o único tratamento que pode reverter as disfunções neurológicas da encefalopatia hepática, evitando o desenvolvimento da degeneração hepatocerebral. A reversibilidade da encefalopatia hepática com o transplante pode ser demonstrada, bioquimicamente, pela espectroscopia.

Desde a década de 1983 após sua aprovação nos Estados Unidos da América pelo National Health Institute, o transplante de fígado tem sido uma modalidade de terapia para pacientes portadores de doenças hepáticas terminais, quando não há mais nenhum outro tratamento capaz de reverter as alterações da doença no organismo (BOIN et al., 2008).

Conforme Viana et al. (2008), a insuficiência hepática aguda com um quadro clínico que pode incluir edema cerebral, instabilidade hemodinâmica, insuficiência renal e distúrbios metabólicos, é responsável por alta morbidade e mortalidade. A maioria dos estudos indica um índice inferior a 15% de sobreviventes sem transplante de fígado, apesar da melhoria na administração dos cuidados intensivos. O transplante hepático (TxH) tem melhorado significativamente o prognóstico de pacientes com insuficiência hepática aguda.

Segundo Barcelos et al. (2008) são diversos os fatores que contribuem para as complicações no pós-operatório, como a própria abordagem abdominal. Essa modalidade de cirurgia leva ao desenvolvimento de complicações pós-operatórias mais frequentes que as das cirurgias torácica e cardíaca, sendo também responsável por período de internação hospitalar prolongado.

Há relatos na literatura de alterações hemodinâmicas após o transplante hepático, que se caracterizam, principalmente, por hiperfluxo portal. A função hepática imediata é muito sensível à congestão do enxerto, sendo dependente não só do afluxo portal, mas também do efluxo venoso hepático. A influência do excessivo fluxo portal tem sido associada à disfunção hepática, principalmente em casos de partições, como splits e transplante hepático doador vivo. Esta disfunção é chamada de small-for-size syndrome (SILVA et al., 2005).

“Os cuidados que o paciente necessita durante o período pós-operatório constituem um desafio devido às alterações fisiológicas complexas que ocorrem nesta fase” (POMPEO, et al., 2007, p. 192).

Na opinião de Cintra e Sanna (2005), a Enfermagem deve ser capaz de suprir as necessidades básicas de um transplante, devendo ser muito bem treinada, capacitada e atualizada, acompanhar a evolução tecnológica e científica, tendo em vista o grau de complexidade que este procedimento envolve.

Considerando a complexidade do procedimento cirúrgico e a necessidade de readaptação familiar, à vida social e de trabalho pós-transplante, a assistência ao paciente deve ser multiprofissional, em particular de enfermagem, pelo fato de ser uma assistência direta e contínua. Cabe ao enfermeiro o planejamento da assistência a esses pacientes (CARVALHO et al., 2007).

“[...] O ensino do paciente é uma ferramenta utilizada para garantir sua independência e a detecção precoce de complicações” (SASSO et al., 2005, p. 482).

Para Rossi et al. (2000), a assistência de enfermagem deve ter como objetivo garantir uma recuperação segura prevenindo, detectando e atendendo às possíveis complicações decorrentes do ato anestésico cirúrgico. Mesmo que para alcançar esse objetivo seja necessário considerar as situações que envolvem o paciente no período perioperatório como um todo, cabe ao centro de recuperação pós-anestésica reunir recursos suficientes que assegurem a qualidade da assistência de enfermagem no período pós-operatório imediato. A qualidade e a quantidade de recursos materiais ou humanos ou de ambos depende do objetivo do serviço e do perfil da clientela a ser atendida.

Compreende-se que para prestar assistência com qualidade é preciso considerar os vários elementos que podem desencadear complicações no pós-operatório imediato de transplante hepático, além de identificar os diversos fatores que interagem entre si, dentre os quais estão os relacionados aos pacientes e à própria instituição, como provedora de condições para prestação de cuidados.

Neste sentido, considera-se fundamental o estudo sobre a adoção de protocolos assistenciais que contemplem a magnitude desses fatores visando a uma melhor qualidade da assistência, de modo a reduzir as complicações decorrentes da cirurgia, tempo de hospitalização, mortalidade, custos terapêuticos, carga de trabalho da equipe que presta assistência, além de representar uma ferramenta indispensável na sistematização da assistência de enfermagem.

2. OBJETIVOS

2.1. OBJETIVO GERAL

  • Elaborar um protocolo de assistência de enfermagem no pós-operatório imediato de transplante hepático.

2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS

  • Levantar os diagnósticos de enfermagem destes pacientes na UTI;

  • Elaborar as intervenções de enfermagem nas complicações do TxH no pós-operatório imediato;

  • Descrever as ações de enfermagem no pós-operatório imediato de transplante hepático.

3. METODOLOGIA

Esse estudo consistiu em uma revisão da literatura sobre
complicações no pós-operatório imediato de transplante hepático. O levantamento bibliográfico foi realizado na base de dados da LILACS do portal BIREME e portais da Internet, utilizando-se as seguintes palavras-chave: transplante hepático; assistência de enfermagem; pós-operatório imediato; diagnóstico de enfermagem; protocolo de enfermagem.

Segundo Gil (2007, p. 64) “a pesquisa bibliográfica é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos”.

Foi realizada também, uma leitura exploratória para a seleção do material, a qual segundo Gil (2007) diz respeito a uma leitura rápida do material bibliográfico, com o objetivo de verificar em que medida a obra consultada interessa à pesquisa.

Foram utilizados os seguintes critérios para a seleção dos artigos: publicações no período de 2000 a 2009 em periódicos nacionais e no idioma inglês enfocando o transplante hepático, a importância da assistência de enfermagem no pós-operatório, diagnósticos de enfermagem no pós-operatório imediato.

4. REVISÃO DA LITERATURA

4.1. ASPECTOS GERAIS SOBRE O FÍGADO

De acordo com Smeltzer e Bare (2005), o fígado é considerado a maior glândula do corpo. É responsável pela produção, armazenamento, alteração e excreção de diversas substâncias envolvidas no metabolismo. Além de ser importante na regulação do metabolismo de glicose e proteínas, fabrica e secreta a bile que atua na digestão das gorduras, regula a concentração sanguínea de glicose, converte amônia (substância tóxica ao organismo) em uréia, sintetiza vitaminas e proteínas plasmáticas, remove os produtos residuais da corrente sanguínea e os secreta dentro da bile. A bile desempenha um importante papel na digestão e absorção das gorduras do trato gastrintestinal, é produzida pelo fígado e armazenada, temporariamente, na vesícula biliar.

Campos, Matias e Coelho (2004) acrescentam que além de ser o maior órgão do metabolismo orgânico, o fígado integra inúmeros processos metabólicos complexos, incluindo carboidratos, proteínas e lipídios, e exerce papel fundamental de depósito e ativação de vitaminas e detoxicação e excreção de produtos tóxicos do metabolismo, como a amônia.

O fígado está localizado atrás das costelas, na região superior direita da cavidade abdominal. Pesa aproximadamente 1.500g (2% do peso corporal), e é dividido em quatro lobos. A circulação sanguínea provém de duas fontes: 75% originam-se da veia porta (rica em nutrientes), e 25% da artéria hepática (rica em oxigênio). A veia hepática constitui a drenagem venosa do fígado e desemboca na veia cava inferior, próximo ao diafragma.

Segundo Triviños e Abib (2003), a anatomia do fígado assume características distintas ao serem considerados aspectos morfológicos ou funcionais. Morfologicamente, ou seja, da maneira como o órgão é visto à laparotomia, o fígado apresenta quatro lobos, sendo dois maiores e dois menores. Os dois lobos maiores, direito e esquerdo, são separados pela fissura umbilical na face inferior e pelo ligamento falciforme na face ântero-superior. Entre eles há uma nítida diferença de volume com acentuado predomínio do direito sobre o esquerdo. Na face inferior do lobo direito, a fissura transversa ou hilar, região onde penetram no parênquima hepático os ramos da veia porta, da artéria hepática e os ductos biliares, delimita dois pequenos lobos, um anterior, conhecido como lobo quadrado e outro posterior, conhecido como lobo caudado ou de Spiegel.

Ainda segundo os autores acima citados, a anatomia morfológica do fígado divide o órgão em lobos, delimitados por sulcos ou fissuras, elementos anatômicos facilmente identificáveis na superfície da glândula. A anatomia funcional do fígado teve início com os trabalhos de McIndoe e Counseller, Hjortsjö, Couinaud e Goldsmith e Woodburne. Funcionalmente, o fígado divide-se em dois hemifígados, conhecidos como fígados direito e esquerdo, os quais, por sua vez, são divididos em setores e segmentos, tendo como elementos de definição os pedículos portais e as veias hepáticas.

Diferentes dos lobos direito e esquerdo da anatomia morfológica, inclusive com volumes menos díspares, são absolutamente individualizados no que diz respeito aos fluxos portal e arterial, drenagem biliar e drenagem venosa, sendo, portanto, funcionalmente distintos. Os fígados direito e esquerdo são separados pela cisura portal principal, também conhecida como linha de Cantlie, que corresponde a uma linha que, originando-se no ponto médio do leito vesicular, anteriormente, dirige-se posteriormente ao longo da face ântero-superior do fígado, à face lateral esquerda da veia cava na sua porção supra-hepática (TRIVIÑOS; ABIB, 2003).

Na face inferior, a linha que divide os dois fígados, originando-se no ponto médio do leito vesicular, anteriormente, dirige-se posteriormente passando pela borda direita da fissura hilar, atingindo o lobo caudado ao nível do processo caudado. Os fígados direito e esquerdo, por sua vez, são divididos em duas porções cada um, por duas outras cisuras, direita e esquerda, respectivamente. A cisura portal direita é representada por uma linha que se origina, anteriormente, a meia distância entre o lado direito da fossa vesicular e o ângulo direito da borda hepática, dirigindo-se, ântero-posteriormente, à face lateral direita da veia cava supra-hepática, onde esta recebe a veia hepática direita.

Na intimidade do parênquima, esta linha corresponde ao curso da veia hepática direita e é responsável pela divisão do fígado direito em dois setores, póstero-lateral direito ou posterior simplesmente, e ântero-lateral direito ou anterior. Na face inferior, do ponto de origem anteriormente referido, esta linha se dirige ao ângulo externo da fissura hilar.

A cisura portal esquerda corresponde a uma linha de trajeto arciforme que se originando a meia distância entre a extremidade do fígado esquerdo e a fissura umbilical e o ligamento teres, anteriormente, dirige-se posteriormente em direção a face lateral esquerda da veia cava supra-hepática, no ponto em esta recebe a veia hepática esquerda. Na intimidade do parênquima esta linha corresponde ao curso da veia hepática esquerda e é responsável pela divisão do fígado esquerdo em dois setores, um posterior ou lateral e outro anterior ou medial (TRIVIÑOS; ABIB, 2003).

Dentre as funções do fígado destacam-se: o metabolismo da glicose, a conversão da amônia em uréia, o metabolismo das proteínas plasmáticas (albumina, globulinas, fatores de coagulação sanguínea, entre outras), o metabolismo lipídico, o armazenamento de vitaminas A, B, D, vitaminas do complexo B e ferro, o metabolismo medicamentoso (tais como barbitúricos, opióides, agentes sedativos, anestésicos e anfetaminas), a formação da bile pelos hepatócitos (importante na excreção da bilirrubina e para a emulsificação dos lipídios pelos sais biliares), e a excreção da bilirrubina (pigmento derivado da clivagem da hemoglobina pelas células do sistema reticuloendotelial) (SMELTZER; BARE, 2005).

4.2. INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA

Os distúrbios hepáticos podem ser virais, mais conhecidos por hepatites virais são infecções sistêmicas, na qual a necrose e a inflamação das células hepáticas produzem alterações clínicas, bioquímicas e celulares; e não-virais caracterizados por determinadas substâncias químicas que apresentam efeitos tóxicos no fígado, produzindo necrose celular hepática aguda ou crônica, destacando a hepatite tóxica, a hepatite induzida por medicamento, a insuficiência hepática fulminante, e a cirrose hepática (podendo ser alcoólica, pós-necrótica ou biliar). Além disso, ainda existem os tumores de fígado, podendo ser primários, geralmente associados à doença hepática crônica, infecções por hepatite B e C, e cirrose, ou secundários devidos às metástases a partir de outros sítios primários (SMELTZER; BARE, 2005).

Existem ainda, outras manifestações da disfunção do fígado que causam diversos prejuízos ao organismo, como o desenvolvimento de edema generalizado devido à hipoalbuminemia, resultante da diminuição da produção de albumina, a incidência aumentada de equimoses, epistaxe, e sangramentos, devido à redução na produção de fatores de coagulação sanguínea. Também pode ocorrer o desenvolvimento de anormalidades metabólicas, tais como o aumento do nível glicêmico, problemas na capacidade de metabolizar medicamentos e problemas hormonais. Essa disfunção pode ser aguda ou crônica, sendo a testicular, irregularidades menstruais, e outros distúrbios da função sexual. Os pacientes com disfunção hepática decorrente da obstrução biliar, comumente desenvolvem prurido grave, devido à retenção dos sais biliares, podendo desenvolver angiomas vasculares ou arteriais, bem como eritemas palmares (SMELTZER; BARE, 2005).

Mincis, Mincis e Calichman (2008), a partir de uma ampla revisão da literatura sobre hepatites agudas pelos vírus A, B, C, D (Delta) e E, enfatizando o diagnóstico e a terapêutica, enfocam os aspectos mais relevantes desses vírus hepatotrópicos, isto é, que comprometem primariamente o fígado. A hepatite B e C são os agentes etiológicos mais importantes para o desenvolvimento do carcinoma hepatocelular.

A hepatite B é causada pelo denominado vírus da Hepatite B (VHB) DNA da família Hepadnaviridae, é uma das causas mais comuns de doenças no mundo, além de ser um grande problema de saúde pública, apesar da existência de vacina. Os pacientes que apresentam doença hepática em atividade estão especialmente propensos a complicações, sendo que 25% a 30% deles evoluirão para cirrose hepática e 5% a 10% desenvolverão carcinoma hepatocelular. A hepatite B pode causar carcinoma hepatocelular sem passar pela fase de cirrose. Cerca de 90% a 95% das pessoas que contraem VHB na idade adulta são capazes de eliminar o vírus espontaneamente de seus organismos pelos sistemas imunológicos.

O tratamento da hepatite B aguda consiste em atenuar os sintomas e cuidados com relação ao estado geral do paciente. Deve-se evitar o uso de medicamentos, pois são metabolizados no fígado. A dieta deve ser normal, respeitando-se a intolerância a alimentos que o paciente informa. Evitar esforços físicos excessivos. Nas formas graves deve-se encaminhar a centros especializados. Indica-se o uso de lamivudina na hepatite aguda grave, em imunocomprometidos, renais crônicos e politransfundidos e em pacientes com manifestações extra-hepáticas (como poliarterite nodosa). Na insuficiência hepática fulminante com mortalidade geralmente acima de 80%, o paciente deve ser internado e sob cuidados intensivos. Entretanto, o transplante hepático a tempo é o único tratamento comprovadamente eficaz. A utilização da vacina representa um dos maiores avanços na prevenção da hepatite B, pois pode prevenir não somente hepatite aguda, hepatite crônica e cirrose, como também, neoplasia do fígado (MINCIS; MINCIS; CALICHMAN, 2008).

A hepatite C (VHC) é responsável por 20% das hepatites agudas, 70% das hepatites crônicas, 40% das cirroses em fase terminal e 60% dos hepatocarcinomas. A transmissão ocorre principalmente através do uso injetável de drogas ilícitas, transfusão sanguínea. Cerca de 15% a 20% dos indivíduos com infecção aguda recuperam-se espontaneamente, enquanto 80% a 85% serão portadores crônicos do VHC. Geralmente é assintomática ou oligossintomática, não sendo diagnosticada na maioria dos casos, aspecto de grande importância, pois permanece o risco de desenvolvimento de doença crônica. A icterícia surge somente em um terço dos pacientes com infecção aguda. A doença crônica também é assintomática ou apresenta sintomas inespecíficos, até que apareçam as complicações da cirrose.

Os objetivos do tratamento da hepatite aguda são: erradicar o vírus e impedir a evolução para hepatite crônica. O tratamento da hepatite aguda C deve constar de monoterapia com Interferon convencional, não sendo necessário acrescentar Ribavirina ao esquema terapêutico. Não há vacina contra a HC, e é importante destacar que qualquer paciente com hepatite aguda pode evoluir de forma fulminante, independente da causa (MINCIS; MINCIS; CALICHMAN, 2008).

4.2.1. Transplante hepático

O TxH é atualmente, o tratamento de escolha para uma série de doenças terminais agudas e crônicas do fígado. Os pacientes com doença hepática grave têm risco aumentado de aquisição de infecções, sendo a principal causa de óbito pós-transplante (ÁLVARES-DA-SILVA, 2004).

É considerado o procedimento terapêutico mais complexo do arsenal cirúrgico, pois o fígado, sendo um dos maiores órgãos do corpo, reúne inúmeras funções, interferindo em diversos sistemas no organismo (CANERO; CARVALHO; GALDEANO, 2004).

Para Carvalho et al. (2008), o transplante de fígado representa um grande avanço terapêutico às doenças hepáticas crônicas. Antes de seu advento, só era possível tratar as complicações; após uma determinada fase, a doença evoluía para o óbito. Pela primeira vez, a possibilidade da substituição do fígado insuficiente permitiu alterar a história natural dessas doenças, oferecendo, efetivamente, uma perspectiva de maior sobrevida e de boa qualidade.

O transplante de fígado é uma modalidade terapêutica que possibilita a reversão do quadro terminal de um paciente com doença hepática. Consiste em um recurso para os pacientes portadores de lesão hepática irreversível, quando mais nenhuma outra forma de tratamento encontra-se disponível. Os pacientes com indicação para transplante de fígado são portadores de uma doença crônica, de evolução progressiva e irreversível, com um longo percurso em unidades de tratamento intensivo. Esses pacientes, de forma geral, apresentam um complexo conjunto de características e complicações, envolvendo desde aspectos relativos à esfera biológica, até problemas psicológicos, sociais e econômicos (MASSAROLLO; KURCGANT, 2000).

Conforme Triviños e Abib (2003), apesar de a cirurgia hepática ter sua origem em tempos remotos, seu desenvolvimento e consolidação ocorreram apenas a partir dos últimos 50 anos, evoluindo dos desbridamentos e ressecções de necessidade às ressecções anatômicas e, finalmente, à ressecção total do fígado seguida do transplante ortotópico.

Em 1854, Francis Glisson publicou Anatomia Hepatis, marco no estudo da anatomia e fisiologia do fígado, fazendo referência à circulação hepática e, principalmente, à existência de uma rede vascular comunicando os sistemas da veia porta e das veias hepáticas.

A despeito de alguns procedimentos cirúrgicos sobre o fígado terem sido executados no final do século XIX e primeira metade do século XX, a moderna cirurgia hepática parece ter sido iniciada por volta de 1950, com importante contribuição dos estudos anatômicos do fígado, de caráter funcional desenvolvidos por McIndoe e Counselle, Hjortsjo, Goldsmith e Woodburne e, principalmente, os trabalhos de Couinaud, que estabeleceram, definitivamente, a segmentação hepática (TRIVIÑOS; ABIB, 2003).

Carvalho et al. (2007) lembram que o primeiro transplante hepático do mundo foi realizado em 1963 por Thomas Starzl, em Denver, nos Estados Unidos da América. No Brasil, em 1968, foi realizado esse transplante pela primeira vez no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e, em Minas Gerais, no Hospital Felício Rocho em outubro de 1989. O Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, em setembro de 1994 iniciou seu programa de transplante hepático.

Boin (2008) relata que desde 1968 são realizados transplantes de fígado no Brasil. O programa de captação de órgãos foi iniciado em São Paulo, em 1991 e a distribuição era feita para as equipes credenciadas junto à Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo. Após este período, foram criadas as leis sobre a autorização familiar para fins de realização de transplante cadavérico e sobre o cadastramento de candidatos a receptores de fígado com doador cadáver.

No Brasil, o número de transplantes aumentou significativamente a partir da década de 90 com a nova lei de transplante de órgãos e tecidos, quando o Sistema Único de Saúde (SUS) passou a pagar os hospitais credenciados (SCHULZ, 2009).

Os candidatos a esse procedimento têm uma qualidade de vida ruim e vivem na perspectiva de morte iminente. Assim, a inclusão do paciente na lista de espera do transplante hepático representa a possibilidade de viver e de mudar de vida. Entretanto, a espera prolongada por um órgão para ser transplantado propicia o aparecimento de uma série de complicações para o paciente, aumenta o risco para o procedimento e sendo responsável por um número considerável de óbitos de pacientes na fila de espera (MASSAROLLO; KURCGANT, 2000).

Este procedimento tem como indicações mais comuns a hepatite C crônica e a doença hepática alcoólica, correspondendo a 40% do total de candidatos adultos que esperam por um TxH. Estudos sugerem que o TxH proporciona maior sobrevida e significativa melhora da QV para pacientes com doença hepática em estágio terminal. Entretanto, outros pesquisadores demonstram que a permanência de sintomas físicos pós-transplante, como a baixa funcionalidade física e a redução da tolerância ao exercício, além de complicações respiratórias decorrentes da cirurgia abdominal, podem estar presentes (BARCELOS et al., 2008).

No entanto, o transplante de fígado tem determinado dificuldades gerenciais. Para Carvalho et al. (2008), os bons resultados estimulam tanto médicos quanto pacientes e o número de candidatos aumenta mais rapidamente do que o de transplantes realizados, limitados pela oferta insuficiente de enxertos. Essa desproporção entre candidatos e demanda de enxertos acarreta uma grande mortalidade na lista de espera para o transplante.

Os doentes com doença hepática eram classificados pelo escore de Child-Turcotte-Pugh (CTP), que utilizava cinco critérios: dois clínicos e três laboratoriais. Recentemente, outra classificação começou a ser utilizada no Brasil com a mesma finalidade. A gravidade dos receptores é avaliada numericamente por um índice denominado Model for End-stage Liver Disease (MELD), que mensura o risco de mortalidade das doenças hepáticas graves de diferentes etiologias e serve para graduar a severidade da doença (CARVALHO et al., 2008).

Esse escore foi descrito no ano de 2000, como um modelo matemático capaz de predizer a sobrevida nos primeiros três meses em pacientes submetidos à colocação da derivação percutânea transjugular intra-hepática portossistêmica (TIPS). O uso do critério MELD é interessante na alocação de órgãos num sistema que envolve grande número de equipes transplantadoras e número significativo de pacientes em lista de espera. Observa-se que os pacientes hiponatrêmicos, não sendo contemplados com situação especial, terão menor sobrevida tanto em lista de espera, conforme relatado na literatura, assim como após a realização do transplante (BOIN et al., 2008).

O tempo de espera do transplante favorece o aparecimento de condições mórbidas, decorrentes do agravamento da doença hepática, da desnutrição, do hipermetabolismo e da inatividade física, as quais irão afetar o prognóstico. Enquanto aguardam na lista de espera, os pacientes apresentam vários episódios de infecções secundárias, como peritonite bacteriana, infecção urinária e pneumonia, o que pode configurar estados infecciosos graves de alta mortalidade (CARVALHO et al., 2008).

Cintra e Sanna (2005, p. 78) referem que “o transplante de órgãos e tecidos requer uma infraestrutura de apoio bastante complexa, o que o torna um recurso muito dispendioso e de alcance muito restrito, embora em expansão nos países em desenvolvimento.”

No ano de 2004, foram realizados 935 transplantes e, entre janeiro e junho de 2005, foram realizados 445. Em 2006, o Brasil contava com 61 centros transplantadores, 45 deles ativos, incluindo-se o Programa de Transplante Hepático da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, local da coleta de dados do presente estudo. Em lista de espera para o transplante hepático estavam cadastrados no país, 6.288 pacientes, com tempo médio de espera de 72 meses e taxa de mortalidade na lista de 18,5% (RODRIGUES et al., 2008).

Dados da Associação Brasileira Transplante de Órgãos (ABTO) divulgados pelo Registro Brasileiro de Transplantes (RBT, 2005), mostram que o número de transplantes hepáticos com doador falecido permaneceu estável (759 em 2005), apesar da diminuição do número de doadores, indicando um maior aproveitamento do fígado dos doadores efetivos (em 70% dos doadores o fígado foi removido e implantado). Enquanto que o transplante com doador vivo cresceu 10%, sendo responsável por 21% dos transplantes hepáticos realizados.

Em 2006, conforme dados do RBT (2007) foram realizados 835 transplantes de doadores cadáveres e 190 de doadores vivos, totalizando 1025 TxH. No ano de 2007 os transplantes de doadores cadáveres foram de 849 e 148 de doadores vivos, num total de 997. Observou-se pela primeira vez, uma queda de 2,6%, decorrente da diminuição de 22% nos transplantes com doador vivo e do aumento de 1,8% com doador falecido.

Em 2008 houve um aumento de 15,8% nos transplantes hepáticos, com incremento de 21,7% nos transplantes com doador falecido e queda de 18,8% nos com doador vivo (RBT, 2008). No primeiro trimestre de 2009, o transplante com doador falecido foi apenas de 4,4% no transplante hepático e com doador vivo foi de 12% (RBT, 2009).

O número de candidatos ao transplante hepático rapidamente excedeu o número de doadores. O tempo de espera por um órgão e os óbitos ocorridos sem que o transplante de fígado tenha sido realizado também aumentaram. Para enfrentar esse problema, numerosas estratégias têm sido propostas. O uso de fígados de doadores anteriormente considerados inadequados, o transplante intervivos e a divisão do fígado com o objetivo de obter dois enxertos viáveis, são as principais delas.

De acordo com Lazzaretti (2005), a opção pelo transplante hepático intervivos (THIV) entre os candidatos a transplante de fígado cresceu bastante devido à escassez de órgãos cadavéricos e impulsionado pelo aperfeiçoamento técnico das equipes cirúrgicas que permite alcançar resultados expressivos.

Segundo Boin et al. (2008), uma estratégia utilizada para diminuir a mortalidade nas listas de espera dos centros transportadores em geral, tem sido a utilização de doadores conhecidos como não ideais, limítrofes, com critério expandido ou marginais. Doadores apresentando sorologias para hepatite B ou C, enxertos com esteatose em graus variáveis, doadores depois de parada cardíaca e enxertos provenientes de doadores idosos têm sido utilizados com resultados aceitáveis. Outra estratégia é a aplicação de fígado bipartido e a doação intervivos.

Apesar da adoção destes novos critérios, mundialmente ainda são observados altos índices de mortalidade em lista de espera. No Brasil, além da escassez de doadores, pode-se utilizar número substancial de doadores com critérios expandidos. A adição desses critérios tem aumentado o potencial de doação de órgãos, mas torna necessário ajuste entre a oferta de doadores com muitos critérios expandidos a receptores mais graves. A transfusão maciça deve ser evitada, o uso de doadores idosos deve ser criterioso e os pacientes hiponatrêmicos devem ser contemplados com algum tipo de bonificação (BOIN et al., 2008).

O TxH busca a solução para as doenças difusas do fígado, as ressecções clássicas (hepatectomia direita, esquerda e ampliadas), e as ressecções segmentares destinam-se ao tratamento das lesões focais do fígado. A realização destas ressecções implica conhecimento detalhado da anatomia do fígado, uma vez que tais procedimentos devem respeitar a vascularização hepática e a individualidade funcional de cada segmento hepático (TRIVIÑOS; ABIB, 2003).

É indicado quando a expectativa de sobrevida é menor ou igual a 90%. Devido à escassez de órgãos de doadores com morte encefálica, os cirurgiões e os profissionais que trabalham com alocação de órgãos se preocupam constantemente com o número de pacientes na lista de espera, o estado geral do receptor, os resultados do transplante e, principalmente, a determinação de quem seria o melhor receptor (CARVALHO et al., 2008).

4.3. PRINCIPAIS COMPLICAÇÕES

Canero, Carvalho e Galdeano (2004) relatam que no período pós-operatório imediato, que compreende as primeiras 24 horas pós-transplante hepático, o paciente encontra-se intubado, monitorizado, utilizando a terapêutica imunossupressora, que necessita de inúmeros cuidados, e é comum, neste período, o aparecimento de complicações pós-operatórias significativas, que podem ser divididas em:

  • Complicações técnicas: na ferida operatória, hemorragias, vasculares, biliares, nutricionais, gastrintestinais e disfunção primária do enxerto;

  • Complicações clínicas: imunológicas, infecciosas, pulmonares, cardiovasculares, renais, neurológicas e metabólicas.

Freitas et al. (2000) afirmam que a maioria das complicações biliares ocorre nos três primeiros meses de pós-operatório: as fístulas geralmente no primeiro mês e as estenoses mais tardiamente, e sua incidência varia de acordo com a presença de rejeição crônica ou trombose da artéria hepática do enxerto.

Diversos fatores que contribuem para as complicações no pós-operatório, como a própria abordagem abdominal. Tal abordagem cirúrgica leva ao desenvolvimento de complicações pós-operatórias mais frequentes que as das cirurgias torácica e cardíaca. Esse procedimento também é responsável por período de internação hospitalar prolongado. Indivíduos que realizam o TxH apresentam limitações e alguns sintomas diversos (astenia, fadiga física, entre outros) após alguns anos do procedimento. A fadiga muscular pode permanecer pelo período de 1 ano após o TxH, podendo ser este o fator responsável pela baixa na capacidade funcional apresentada pelos indivíduos no 12º mês pós-transplante. Transplantados hepáticos após a experiência da fadiga física, reduzem seus níveis de atividade física em conjunto com a fadiga mental, reduzindo a motivação, tornando-os sedentários (BARCELOS et al., 2008).

Coelho et al. (2000), ao abordarem as complicações vasculares no pós-transplante hepático afirmam que a melhoria da sobrevida desses pacientes decorreu do melhor controle da rejeição, preservação mais adequada do fígado, profilaxia e tratamento de infecções secundárias e avanços em técnica cirúrgica, como doação intervivos e transplante de segmentos hepáticos. No entanto, as complicações vasculares permanecem como causa importante de morbidade, mortalidade e perda de enxerto pós-transplante, sendo a trombose da artéria hepática a mais comum e suas manifestações variam desde ausência de sintomas até a ocorrência de choque séptico secundário à gangrena hepática fulminante.

A infecção ainda é a principal causa de morte após transplante hepático, ocorrendo na maioria dos casos, no primeiro mês após a cirurgia. Entretanto, morte devido à infecção pode ocorrer em qualquer período após o transplante. Pacientes que apresentam boa função hepática e recebem doses padrões de imunossupressores, raramente apresentam infecções oportunistas, e quando as desenvolvem, são similares às observadas na população geral (COELHO et al, 2003).

Coelho et al. (2005) apontam que as complicações biliares também são causas comuns de morbidade e mortalidade após transplante hepático, e que sua elevada taxa de incidência deve-se a vários fatores, incluindo isquemia das vias biliares, imunossupressão, transplante entre indivíduos do grupo sanguíneo ABO incompatíveis, infecção pelo citomegalovírus e fatores técnicos

Leonardi et al. (2000) citam como complicações mais frequentemente observadas, as fístulas e as estenoses. As fístulas biliares são referidas de 5% a 33%, enquanto que as estenoses ocorrem em até 10% dos casos.

Sasso et al. (2005) complementam que as complicações pós-operatórias imediatas podem incluir sangramento, infecção, rejeição, drenagem biliar alterada, deiscência, trombose vascular, coagulopatia, hipertensão portal, fibrinólise, hipotensão, hipertensão, disfunção renal, alterações psicológicas, entre outras.

Para Schulz et al. (2009), No período pós-transplante, as alterações neurológicas são causas frequentes de morbimortalidade, podendo afetar 13,2% a 90% dos pacientes, conforme diferentes séries

Entretanto, o TxH traz benefícios aos pacientes com doença hepática avançada e interfere nas condições pulmonares, funcionais e qualidade de vida, melhorando essas variáveis após a realização da cirurgia (BARCELOS et al., 2008).

A prevenção de perda excessiva de sangue é um importante objetivo durante a realização de transplante de fígado, em consequência da associação com prolongada recuperação, aumento da morbidade e diminuição da sobrevida. Embora transfusões maciças ainda aconteçam 10% a 50% das cirurgias de transplante cursam sem requerer transfusões de sangue (BOIN et al., 2008).

A incidência de náusea e vômito no período pós-operatório apresenta variações extremas, provavelmente em função de uma etiologia multifatorial que interage desde o pré-operatório até o ato anestésico-cirúrgico. Atualmente, apesar dos avanços das técnicas anestésicas, do uso de fármacos de curta duração de ação e do desenvolvimento de novos antieméticos, a incidência global permanece em torno de 25% a 30%. Náusea é uma sensação desagradável associada à vontade de vomitar, acompanhada de palidez ou rubor, taquicardia e impulso do vômito ou emese, que é caracterizado pela contração da musculatura abdominal, abaixamento do diafragma, relaxamento da cárdia gástrica, resultando em expulsão do conteúdo do estômago em direção à boca. Náusea e vômito no pós-operatório são definidos como um episódio de náusea ou vômito que ocorre nas 24 horas após o recebimento de anestesia (POMPEO et al., 2007).

A presença de desnutrição protéico-calórica é associada a maior incidência de complicações pós-operatórias, maior tempo de internação e, consequentemente, maiores custos do procedimento (CAMPOS; MATIAS; COELHO, 2004).

As inovações, como enxertos reduzidos, aumentaram a fonte fornecedora de órgãos, tanto para crianças como adultos, reduzindo significativamente a mortalidade pré-transplante. A sobrevivência depois do transplante melhorou e as taxas de sobrevivência de 70% a 90% são rotineiras (CARVALHO et al., 2008).

Assim, a despeito das possíveis complicações decorrentes do procedimento, o transplante hepático é um recurso da medicina dispendioso e sofisticado, e quando é bem sucedido, pro­porciona melhora física significativa, apesar de o paciente necessitar de acompanhamento médico e de medicações imunossupressoras, para evitar a rejeição, durante toda a vida (RODRIGUES et al., 2008).

Morais et al. (2009) enfocam que complicações neurológicas aparecem frequentemente após transplante hepático, com incidência que varia de 8% a 47%, incluem encefalopatias, desordens cerebrovasculares, infecções, neurotoxicidade induzida por imunossupressores e lesões nervosas periféricas, podendo ter grande influência na sobrevida e qualidade de vida do paciente.

A mielinólise pontina central (MPC) - desmielinização não-inflamatória, frequentemente simétrica, concentrada no centro da ponte - tem incidência de 1,2% a 10% em receptores de fígado, com alta incidência de mortalidade. Em 10% dos casos, a desmielinização também ocorre em regiões extrapontinas, tendo-se proposto o termo síndromes desmielinizantes osmóticas (SDO) para tais situações, sendo rapidamente progressivas e geralmente fatais. A MPC é a mais grave complicação neurológica após o transplante hepático, com mortalidade acima de 50% nas duas primeiras semanas e 90% em seis meses. Quando os pacientes sobrevivem, a maioria apresenta déficits neurológicos (MORAIS et al., 2009).

4.4. SISTEMATIZAÇÃO DE ENFERMAGEM

A implantação do processo de enfermagem reflete direta e positivamente sobre a qualidade dos cuidados prestados e o desenvolvimento científico da profissão. A assistência de enfermagem para esses pacientes deve refletir um compromisso com a excelência no atendimento, portanto, é vital que sejam utilizados instrumentos metodológicos do cuidar. A preocupação em desenvolver um modo de fazer fundamentado, levou pesquisadores, estudiosos e trabalhadores a desenvolver, desde os anos de 1950, o Processo de Enfermagem (PE) que organiza o cuidado (CARVALHO et al, 2007).

O processo de enfermagem pode ser definido como aplicação prática de um modelo assistencial ou teoria de enfermagem na assistência aos pacientes. É um instrumento metodológico que possibilita identificar, compreender, descrever, explicar e/ou predizer a resposta da clientela aos problemas de saúde ou aos processos vitais, e determinar quais aspectos dessas respostas exigem uma intervenção profissional (VARGAS: FRANÇA, 2007).

O enfermeiro desempenha um papel fundamental na promoção, prevenção, recuperação da saúde, sempre considerando o paciente como um ser único, com características próprias que podem determinar de forma decisiva as capacidades funcionais e psicossociais preservadas para serem trabalhadas. Para atuar nesse processo, é preciso que a assistência de enfermagem seja fundamentada no método científico.

A responsabilidade do cuidar em enfermagem exige que as decisões sobre as intervenções propostas sejam fundamentadas na avaliação do estado de saúde do indivíduo. Essa avaliação requer que se adote o diagnóstico de enfermagem como referência (BRAGA; CRUZ, 2003).

A identificação de diagnósticos específicos é fundamental, pois, a partir desta, será possível traçar um plano de intervenções o mais preciso possível. O objetivo do plano é direcionar o tratamento e, assim atender melhor às necessidades dos pacientes, contribuindo para a construção do conhecimento e engrandecimento da enfermagem. A NANDA tem colaborado para o desenvolvimento e aperfeiçoamento dos diagnósticos de enfermagem e de um sistema para classificá-los em uma taxonomia. Conforme a literatura, a Taxonomia da NANDA implica um arranjo sistemático de fenômenos de enfermagem relacionados em grupos e baseados nas características que esses fenômenos possuem em comum (ROCHA; MAIA; SILVA, 2006).

A partir da necessidade de padronização de uma linguagem de enfermagem, foram criados instrumentos de trabalho para proporcionarem interação dinâmica durante a execução do Processo de Enfermagem. São eles: os Sistemas de Classificação de Diagnósticos de Enfermagem (North American Nursing Diagnosis Association - NANDA), Classificação das Intervenções de Enfermagem (Nursing Interventions Classification - NIC) e Classificação dos Resultados de Enfermagem (Nursing Outcomes Classification – NOC) (VARGAS; FRANÇA, 2007).

Vargas e França (2007) acrescentam que os sistemas de classificação fornecem uma linguagem padronizada, utilizada no processo e no produto do raciocínio e do julgamento clínico sobre as respostas humanas aos problemas de saúde e processos vitais. Assim, facilitam a detecção, intervenção e avaliação dos cuidados, de acordo com o problema apresentado pelo indivíduo, organizando e orientando as ações de enfermagem para as necessidades individuais.

O sistema de classificação de Diagnósticos de Enfermagem da NANDA é um dos mais conhecidos e divulgados no âmbito mundial. O sistema de classificação de Intervenções de Enfermagem (NIC) iniciou-se em 1987 e continua em desenvolvimento. Este instrumento emergiu em parte do trabalho realizado pela NANDA. A NIC apresenta 486 intervenções de enfermagem perfazendo um total de atividades superior a doze mil. A NIC nomeia e descreve intervenções executadas na prática clínica em resposta a um Diagnóstico de Enfermagem. O sistema de classificação de resultados de enfermagem (NOC) vem sendo desenvolvido desde 1991, por um grupo de pesquisadores também pertencentes ao grupo da NIC. A NOC é uma classificação abrangente e padronizada de resultados da clientela (indivíduo família ou comunidade) influenciados pela execução de intervenções de enfermagem (VARGAS; FRANÇA, 2007).

Por meio da utilização da Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE), o enfermeiro assegura uma prática assistencial adequada e individualizada. Os diagnósticos de enfermagem identificam a situação de saúde/doença dos indivíduos internados, resultando em um cuidado de enfermagem individual e integral, fundamentado no conhecimento científico. A SAE busca a identificação das situações saúde/doença dos indivíduos através da utilização de um método e de uma estratégia de trabalho científicos que irão subsidiar ações de enfermagem contribuindo para a promoção, prevenção, recuperação e reabilitação da saúde dos indivíduos (AMANTE; ROSSETTO; SCHNEIDER, 2009).

Tais autoras acrescentam que o processo de enfermagem é a maneira sistemática e dinâmica de prestar cuidado de enfermagem, promovendo cuidado humanizado orientado para resultados, e de baixo custo. Além disso, impulsiona os enfermeiros a analisarem constantemente o que estão fazendo e a estudarem como poderiam fazê-lo melhor. A SAE é essencial para que o enfermeiro possa gerenciar e desenvolver uma assistência de enfermagem organizada segura, dinâmica e competente.

O processo de enfermagem tem cinco etapas distintas, porém inter-relacionadas, que são: investigação, diagnóstico, planejamento, implementação e avaliação. Essa inter-relação ocorre, pois uma coleta inadequada de dados leva a uma determinação errônea dos problemas apresentados (diagnósticos de enfermagem) e, consequentemente, um planejamento de ação inapropriado. A utilização do processo de enfermagem traz muitos benefícios tais como: redução da incidência e tempo das internações hospitalares à medida que agiliza o diagnóstico e o tratamento de problemas de saúde; cria um plano de eficácia de custos; melhora a comunicação entre a equipe, prevenindo erros e repetições desnecessárias; elabora cuidados ao indivíduo e não apenas para a doença (AMANTE; ROSSETTO; SCHNEIDER, 2009).

Diagnóstico de enfermagem diz respeito a um julgamento clínico sobre as respostas do indivíduo, da família ou da comunidade aos problemas e processos vitais vigentes ou potenciais, que formam a base para a seleção de intervenções de enfermagem visando à obtenção de resultados, pelos quais o enfermeiro é responsável (NORTH AMERICAN NURSING ASSOCIATION - NANDA, 2008).

Segundo NANDA (2008), os diagnósticos de enfermagem são descritos em termos de:

Nome do diagnóstico: (rótulo ou denominação).

Características definidoras: sugestões, inferências observáveis que se agrupam como manifestações de um diagnóstico de enfermagem real (aquele que descreve respostas humanas a condições de saúde/processos vitais que existem em um indivíduo, família ou comunidade; é sustentado pelas características definidoras que se agrupam em padrões de sugestões ou interferências relacionadas) ou diagnóstico de enfermagem de bem-estar (descreve respostas humanas em níveis de bem-estar em um indivíduo, família ou comunidade que tem o potencial de aumento para um estado mais alto).

Fatores relacionados: fatores que aparecem para mostrar algum tipo de relacionamento padronizado com diagnóstico de enfermagem. Tais fatores podem ser descritos como antecedentes a, associados com, relacionados a, contribuintes para, ou estimuladores.

Fatores de risco: fatores ambientais e elementos fisiológicos, psicológicos, genéticos ou químicos que aumentam a vulnerabilidade de um indivíduo, família ou comunidade a um evento insalubre.

A assistência de enfermagem no pós-operatório focaliza a implementação de intervenções direcionadas para a prevenção ou a detecção precoce das complicações mais frequentes como as complicações cirúrgicas (hemoperitônio, complicações biliares e vasculares), do enxerto (falência primária do enxerto, rejeição aguda) e gerais (respiratórias, cardiovasculares, renais, hematológicas, metabólicas, digestivas e infecciosas). Estas complicações dependem em grande parte, do estado prévio do paciente antes da realização do transplante de fígado (MENDES; GALVÃO, 2008).

Ainda segundo Mendes e Galvão (2008), a equipe de enfermagem precisa ter conhecimento sobre a indicação, mecanismos de ação, vantagens e desvantagens, vias de administração, efeitos colaterais e cuidados necessários, quanto ao uso desta terapêutica. O ensino do paciente é uma tarefa do enfermeiro, que exige a implantação de intervenções que acarretam mudanças na forma de vida dos pacientes, interferindo até em seus valores e crenças pessoais. Para o alcance de um estilo de vida com independência após o transplante, o enfermeiro deve ensinar conteúdos relacionados com a nutrição, aos medicamentos, a monitorização dos sinais vitais e ao registro de informações. A má nutrição deve ser tratada antes da realização do transplante, a fim de aumentar as probabilidades de um resultado positivo para os pacientes, e diminuir as chances de complicações pós-operatórias.

No transplante de fígado o enfermeiro atua no pré, intra e pós-operatório, com atividades específicas, seja no ambulatório, na unidade de internação, no centro-cirúrgico ou na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). O planejamento, implementação e avaliação do cuidado dos pacientes transplantados competem ao enfermeiro coordenador, que atua como elo na rede de comunicação dentro da equipe multidisciplinar, sendo que uma comunicação efetiva é essencial no cuidado aos pacientes e familiares (MENDES; GALVÃO, 2008).

5. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Tabela 1 – Diagnósticos de enfermagem no pós-operatório imediato de transplante hepático segundo a taxonomia da Nanda 2007/2008

Título Diagnóstico / Nanda

Características Definidoras

Intervenção

Eliminação urinária prejudicada

  • Diminuição do débito urinário

  • Elevação das taxas de uréia/creatinina

  • Anasarca

  • Eletrólitos alterados

  • Sinal de Homan positivo

  • Pressão sanguínea alterada

  • Alteração do hematócrito

  • Poliúria

  • Retenção urinária

  • Densidade urinária alterada

  • Polaciúria.

  • Balanço hídrico rigoroso, enfoque nas características do débito urinário (volume, cor, densidade, odor, hematúria, entre outros);

  • Manter sonda vesical prévia e observar a ocorrência de dobras na extensão, trações e obstruções por coágulos.

  • Pesagem diária;

  • Monitorar situação de hidratação;

  • Monitorar resultados laboratoriais relevantes (uréia, creatinina, hematócrito, osmolaridade urinária).

Risco de queda

  • Ansiolíticos

  • Tranquilizantes

  • Anti-hipertensivos.

  • Manter grades elevadas;

  • Posicionamento adequado do paciente no leito;

  • Mobilização do paciente com auxílio de pelo menos dois profissionais

Risco de infecção

  • Uso de Imunossupressores

  • Cateter Venoso Central

  • Acesso venoso periférico

  • Sonda Vesical de Demora

  • Sonda Vesical de alívio

  • Drenos

  • Incisão cirúrgica com aspecto adequado.

     

  • Avaliar condições das inserções de cateteres e drenos;

  • Monitorar sinais e sintomas sistêmicos e locais de infecção;

  • Monitorar contagem absoluta de granulócitos, glóbulos brancos e resultados diferenciais;

  • Examinar a condição da incisão cirúrgica/ferida.

Mobilidade no leito prejudicada

  • Incapacidade de se locomover no leito.

  • Proporcionar mudança de decúbito a cada duas horas;

  • Posicionar funcionalmente o corpo e suas extremidades;

  • Manter a roupa de cama sem pregas;

  • Minimizar descarga de peso excessiva sobre proeminências ósseas;

  • Utilizar dispositivos alternativos (colchões perfilados, bóias, colchins).

Integridade tissular prejudicada

  • Edema

  • Pressão sanguínea alterada

  • Gases sanguineos arteriais anormais

  • Alteração sons intestinais

  • Alteração pupilar.

  • Avaliar presença e evolução de edemas periféricos;

  • Verificar presença de exudato.

Déficit no autocuidado

  • Sedativos

  • Analgésicos

  • Hipotrofia músculo-esquelética.

  • Realizar higiene pessoal no leito e conforme estabilidade hemodinâmica.

Risco de desequilíbrio da temperatura corporal

  • Desidratação

  • Taxa metabólica alterada

  • Sedação

  • Uso de Vasodilatadores / vasoconstritores

  • Extremo de idade.

  • Monitorar oscilações térmicas centrais e periféricas.

Risco para Integridade da pele prejudicada

  • Destruição de camadas da pele

  • Invasão de estruturas do corpo

  • Rompimento da superfície da pele

  • Avaliar a evolução da cicatrização da incisão cirúrgica;

  • Observar mudanças no aspecto da pele e membranas mucosas;

  • Fazer uso de protetores de proeminências ósseas.

Dor aguda

  • Alterações na pressão sanguínea

  • Dilatação pupilar

  • Evidência observada

  • Alterações na Frequência cardíaca.

  • Manter níveis de analgésicos adequados

  • Avaliação constante de dor aguda.

Risco para náusea

  • Salivação aumentada

  • Distensão gástrica.

  • Manter permeabilidade da SNG evitando obstruções e pinçamentos;

  • Verificar débito de SNG.

Percepção sensorial perturbada

  • Agitação

  • Comunicação prejudicada.

  • Manter paciente restrito ao leito até retomada da consciência (Glasgow >12)

Nutrição desequilibrada, menor que as necessidades corporais

  • Tônus muscular insatisfatório

  • Mucosas pálidas

  • Fragilidade capilar

  • Diarréia

  • Cavidade bucal ferida

  • Desidratação.

  • Avaliação nutricional diária.

Risco para constipação

  • Sangue vivo nas fezes

  • Volume de fezes diminuído

  • Abdome distendido

  • Macicez à percussão abdominal

  • Massa abdominal palpável

  • Ruídos intestinais hiperativos

  • Ruídos intestinais hipoativos.
     

  • Monitorar funcionamento intestinal (presença de peristaltismo, eliminação de flatos e evacuação).

Risco de sangramento

  • Petequias

  • Sangramento ativo

  • Queda de HB/HT

  • Palidez cutânea

  • Avaliar coagulograma diariamente;

  • Verificar débitos dos drenos e sondas;

Função hepática prejudicada

  • Infecção Viral

  • Doença Crônica

  • Doença Aguda

  • Medicamentos hepatotóxicos

  • Alteração níveis de enzimas hepáticas

  • Hipertensão Portal.

  • Monitorar resultados de exames laboratoriais, que caracterizem a função hepática.

Risco de aspiração

  • Sonda Nasoenteral

  • Deglutição prejudicada

  • Nível de consciência reduzido

  • Tubos gastrintestinais

  • Resíduo gástrico aumentado

  • Reflexo de vômito diminuído

  • Presença de sonda endotraqueal.

  • Monitorar o retorno da função sensorial e motora;

  • Monitorar escala de Ransey;

  • Posicionar decúbito acima de 45° ou o mais elevado possível;

  • Aspirar frequentemente secreções supra – cuff.

Desobstrução ineficaz das vias aéreas

  • Tosse ineficaz

  • Ruídos respiratórios adventícios

  • Assincronia com ventilação mecânica

  • Aumento do trabalho respiratório

  • Cianose.

  • Aspiração endotraqueal e nasotraqueal sempre que necessário;

  • Inaloterapia sempre que necessário;

  • Adaptação adequada ao ventilador mecânico.

Risco de glicemia instável

  • Hiperglicemia

  • Hipoglicemia

  • Glicemia normal.

  • Controle glicêmico de duas em duas horas;

  • Realizar revezamento do local de coleta.

Ventilação espontânea prejudicada

  • Volume corrente diminuído

  • Uso de musculatura acessória

  • PO2 diminuída

  • SaO2 diminuída

  • PCO2 aumentada.

  • Monitorar gasometria arterial e venosa;

  • Realizar otimização ventilatória;

  • Controle de oximetria periférica;

  • Controle de capnometria.

Foram levantados 19 diagnósticos do pós-operatório imediato de transplante hepático, de acordo com a Nanda 2007/2008.

Define-se eliminação urinária prejudicada como um distúrbio na eliminação de urina.

Risco de quedas é a suscetibilidade aumentada para quedas que podem causar dano físico.

Risco de infecção refere-se ao aumento do risco de invasão por organismos de patógenos. Todos os procedimentos invasivos constituem risco para a presença de patógenos como as bactérias. O ambiente hospitalar também favorece o surgimento dos patógenos. Portanto, quanto maior o número de procedimentos invasivos, maior o risco de infecção (ROCHA; MAIA; SILVA, 2006).

Canero, Carvalho e Galdeano (2004) explicam que além de estar presente pelo fato destes pacientes serem submetidos a um grande procedimento cirúrgico, as características definidoras mais presentes relacionam-se à imunossupressão e às defesas secundárias inadequadas, 100% dos pacientes encontravam-se anêmicos no pós-operatório imediato, principalmente devido ao sangramento no intraoperatório agravado por coagulopatias. A infecção é a complicação mais comum no pós-operatório precoce, localizando-se principalmente no sítio cirúrgico, incluindo o fígado, o trato biliar, a cavidade peritoneal e a ferida cirúrgica.

O diagnóstico de risco para infecção no paciente em pós-operatório imediato está relacionado aos procedimentos invasivos e à defesa primária insuficiente provocada pela solução de continuidade da pele e ao trauma tissular.

Risco de desequilíbrio da temperatura corporal é definido como risco de não conseguir manter a temperatura corporal dentro dos parâmetros normais.

Risco para integridade da pele prejudicada é definido como risco de a pele ser alterada de forma adversa. Relacionado aos fatores mecânicos, principalmente aos adesivos utilizados nos cateteres e na incisão, pois como o paciente recebe muito líquido no pós-operatório imediato, acaba adquirindo um peso extra, consequentemente ocorrem fragilidade e alteração no turgor cutâneo, propiciando alterações na integridade da pele, além dos fatores imunológicos, pigmentação e metabolismo alterados (CANERO; CARVALHO; GALDEANO, 2004).

Por mobilidade no leito prejudicada entende-se a limitação para se movimentar de forma independente de uma posição para outra no leito. Presente em 100% dos pacientes é a limitação ao movimento. Devido à extensão da incisão cirúrgica e pelo fato de que muitos pacientes encontram-se ainda sedados no pós-operatório imediato, isso cabe à enfermagem realizar os cuidados necessários para evitar lesões e complicações decorrentes desta capacidade prejudicada de movimentação (CANERO; CARVALHO; GALDEANO, 2004).

Déficit no autocuidado é definido como capacidade prejudicada de desempenhar ou completar atividades de alimentação, atividades de banho/higiene por si mesmo, atividades de higiene íntima por si mesmo, atividades de vestir-se e arrumar-se por si mesmo.

Integridade tissular prejudicada refere-se ao dano a membranas mucosas, córnea, pele ou tecidos subcutâneos. Presente em 100% dos pacientes, quando há dano às membranas mucosas, córneas, pele ou tecidos subcutâneos associado à lesão mecânica causada pelo procedimento cirúrgico, à presença de dreno biliar em flanco e à mobilidade física prejudicada (CANERO; CARVALHO; GALDEANO, 2004).

Dor aguda é a experiência sensorial e emocional desagradável que surge de lesão tissular real ou potencial ou descrita em termos de tal lesão; início súbito ou lento, de intensidade leve a intensa, com término antecipado ou previsível e duração de menos de seis meses. A dor aguda é um diagnóstico muito comum no pós-operatório imediato e pode resultar da incisão e da manipulação de tecidos e órgão (ROCHA; MAIA; SILVA, 2006).

Percepção sensorial perturbada é a mudança na quantidade ou no padrão dos estímulos que estão sendo recebidos, acompanhada por resposta diminuída, exagerada, distorcida ou prejudicada a tais estímulos.

Em relação à percepção sensorial perturbada, o paciente que recebeu anestesia geral, usualmente apresenta redução do nível de consciência no período pós-operatório imediato (ROCHA; MAIA; SILVA, 2006).

Risco para constipação é definido como risco de diminuição na frequência normal de evacuação, acompanhada por passagem de fezes difícil ou incompleta e/ou passagem de fezes excessivamente duras e secas (ROCHA; MAIA; SILVA, 2006). Bastante frequente, pois os pacientes permanecem em jejum durante este período, agravado pela atividade física deficiente e pela motilidade gastrintestinal diminuída. Risco de função hepática prejudicada é definido como risco de disfunção hepática (CANERO; CARVALHO; GALDEANO, 2004).

Risco de glicemia instável é definido como risco de variação nos níveis de glicose no sangue em relação aos parâmetros normais.

Ventilação espontânea prejudicada é definida como reservas de energia diminuídas, resultando em uma incapacidade do indivíduo de manter respiração adequada para sustentação da vida.

Nutrição desequilibrada menor que as necessidades corporais. Ingestão insuficiente de nutrientes para satisfazer as necessidades metabólicas. As características definidoras mais frequentes relacionam-se ao estado prévio do paciente, ao jejum prolongado no pós-operatório e à dor abdominal, na região da ferida operatória (CANERO; CARVALHO; GALDEANO, 2004).

Risco de aspiração significa estar em risco de entrada de secreções gastrintestinais, secreções orofaríngeas, sólidos ou fluidos nas vias traqueobrônquicas.

Desobstrução ineficaz das vias aéreas é definida como a incapacidade para eliminar secreções ou obstruções do trato respiratório, para manter uma via aérea desobstruída.

Ventilação espontânea prejudicada diz respeito ao estado em que o padrão de resposta de reservas de energia diminuídas resulta numa incapacidade do indivíduo para manter um padrão respiratório adequado para manutenção da vida.

6. CONCLUSÃO

A revisão da literatura permite afirmar que a identificação dos diagnósticos de enfermagem dentro do processo da sistematização da assistência contribui para a prestação de cuidados individualizados, contínuos, documentados e avaliados. O conhecimento dos enfermeiros sobre os diagnósticos de enfermagem no pós-operatório contribui para melhoria da qualidade da assistência a esses pacientes e para uma assistência mais qualificada. A incorporação da SAE é uma forma de tornar a enfermagem mais científica, promovendo o cuidar de enfermagem humanizado, contínuo, mais adequado e com qualidade para o paciente.

Os diagnósticos de enfermagem têm sido uma constante preocupação na prática dos enfermeiros, na tentativa de melhor compreensão dos fenômenos biológicos e psicossociais que acometem os seres humanos, além dos mecanismos fisiopatológicos manifestados e envolvidos no processo saúde-doença.

A elaboração da SAE é uma ferramenta que o enfermeiro dispõe para aplicar seus conhecimentos técnico-científicos na assistência ao paciente, favorecendo o cuidado e a organização das condições necessárias para que ele seja realizado, além de servir de embasamento para a sua profissão.

Conclui-se que a elaboração da sistematização da assistência de enfermagem é uma ferramenta que o enfermeiro dispõe para aplicar seus conhecimentos técnico-científicos na assistência ao paciente, favorecendo o cuidado e a organização das condições necessárias para que ele seja realizado, além de servir de embasamento para a sua profissão.

7. REFERÊNCIAS

ALVARES-DA-SILVA, Mário Reis et al . O uso de nutrição enteral precoce pós-transplante hepático adulto. Arq. Gastroenterol.,  São Paulo,  v. 41,  n. 3, p. 147-149, set.  2004. Disponível em:

AMANTE, Lúcia Nazareth; ROSSETTO, Annelise Paula; SCHNEIDER, Dulcinéia Ghizoni. Sistematização da assistência de enfermagem em Unidade de Terapia Intensiva sustentada pela Teoria de Wanda Horta. Revista Esc. Enfermagem USP,  São Paulo,  v. 43,  n. 1, p. 54-64, mar.  2009. Disponível em:

CANERO, Tatiane Ramos; CARVALHO, Rachel de; GALDEANO, Luzia Elaine. Diagnósticos de enfermagem para o pós-operatório imediato de pacientes submetidos a transplante hepático. Einstein, v. 2, n. 2, p. 100-104, 2004. Disponível em:

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BARCELOS, Sílvia et al. Transplante hepático: repercussões na capacidade pulmonar, condição funcional e qualidade de vida. Arq. Gastroenterol.,  São Paulo,  v. 45,  n. 3, p. 186-191, set.  2008. Disponível em:

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Publicado por: Thais Santos da Silva

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