Adoção Monoparental

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1. RESUMO

Fundamental é a importância que o Direito dê passos similares às constantes mudanças ocorridas nas relações familiares no decorrer dos tempos, conseguir acompanhar tais mudanças, tutelando todos os direitos que necessitam de guarda, respeito e igualdade. Inclui-se aí a adoção por pais solteiros, cada vez mais constante e necessária nesta sociedade. Clama-se aqui pelo princípio da dignidade da pessoa humana, da proporcionalidade, pelo maior interesse do menor, pela igualdade substancial e pelo da não discriminação para que seja mais bem assegurado o interesse tanto do adotante quanto do adotado. Garantir a igualdade, excluindo preconceitos e tabus existentes, é uma função dos operadores do Direito. Precisa-se esquecer os conceitos tradicionalistas que engessam os direitos, tapando os olhos da justiça, para que a situação fática seja coberta por novos moldes garantidores de tutela das novas necessidades existentes. Formar família não pode ser privilégio daqueles que se espelham na tradicionalíssima estrutura familiar. Pessoas solteiras podem sim, formar uma família a partir de uma adoção monoparental. O afeto não pode deixar de ser prosperado por mero conceito pré-estabelecido. Grandes são os problemas que ocorrem nas listas de adoção, como a árdua espera para ser adotado, não podendo mais este tipo de adoção viver com estes tipos de barreiras. Com isso, nesta monografia que ora se apresenta, mostrará que o conceito de pessoa solteira mudou, as condições e as necessidades para se adotar também mudaram, não havendo nenhuma expressão legal que proíba tal espécie de adoção. Tudo isso numa análise prismática, mostrando os fortes elos entre os princípios citados e a adoção monoparental. Ao final, conclui-se que o ordenamento jurídico precisa normatizar este tipo de adoção explicitamente, não precisando mais buscar na lei geral, ampla, a fundamentação necessária para justificar tal ato.

Palavras-chave: 1. Adoção. 2. Monoparentalidade. 3.Igualdade. 4. Preconceito. 5.Legalidade. 6. Afeto.

ABSTRACT

It is vital that the right to pass similar to the constant changes in family relationships in the course of time, keep up with these changes, protecting all the rights that need to save, respect and equality. These include the adoption by single parents, more constant and necessary in this society. Claims to be here by the principle of human dignity, proportionality, by the larger interests of the child, the substantive equality and the non-discrimination to be better secured the interest of both the adopter as the adoptee. Ensure equality, excluding prejudices and taboos, is a function of law professionals. One must not forget the concepts traditionalists who imprison rights, covering the eyes of justice, that the factual situation is covered by new ways of guaranteeing protection of the new needs. Form family may not be the privilege of those who are mirrored in the very traditional family structure. Single people can indeed form a family from a single parent adoption. Affection can not be succeeded by mere concept predetermined. Great are the problems that occur in the lists of adoption, as the arduous wait for adoption, unable to adopt this kind of live with these kinds of barriers. Thus, this monograph that now appears, will show that the concept of a single person has changed, the conditions and needs to take also changed, with no legal term that prohibits this kind of adoption. All this in a prismatic analysis, showing the strong links between the principles cited, and single-parent adoption. Finally, we conclude that the legal system needs to regulate this type of adoption explicitly not required by law to seek more general level, the reasons necessary to justify such an act.

Keywords: 1. Adoption. 2. Single parenthood. 3. Eguality. 4. Prejudice. 5. Legality. 6. Affection.

2. INTRODUÇÃO

O estudo sobre a adoção monoparental é de fundamental importância, pois versa sobre um assunto que constantemente é encontrado no universo jurídico.

Até a Constituição de 1988, o conceito jurídico de família era limitado ao casamento, reconhecendo tão somente as famílias originadas do matrimônio, onde imperava a regra do “até que a morte nos separe”. Dá-se a partir daí a idéia de casamento indissolúvel, onde era admitido o sacrifício da felicidade pessoal dos membros de tal entidade, em manutenção do vínculo matrimonial. Daí a razão de se proibir o divórcio.

Em outra diapasão, a Constituição Cidadã, isto é, de 1988, confere à família um amplo conceito, abrangendo os diversos modos de formação familiar, sendo geradas pelo afeto. Agora, a proteção ao núcleo familiar deverá estar atrelada, necessariamente, à tutela da pessoa humana, através dos democráticos princípios gerais presentes na Lex Fundamentalis. Por isso, que tirar a tutela jurídica das famílias monoparentais, formadas pela adoção monoparental, sob um discurso retrógrado e antiquado, é cometer gravíssima violação hermenêutica, causando uma subversão ao expresso constitucional.

A adoção monoparental é uma realidade que, a cada dia que passa, alimenta ainda mais as pessoas solteiras. O fato de não querer, ou não poder, manter um relacionamento conjugal, seja ele formal ou não, não impede o solteiro de traçar planos que possibilitem exercer a paternidade ou a maternidade.

Os meios procedimentais não diferem muita coisa dos que são tomados nos outros tipos de adoção. As exigências podem ser ampliadas no que se refere ao contexto familiar do adotante, onde o adotado vai interagir e viver. Requisitos como um ambiente agradável, hábil para recepcionar um novo membro entre outros, facilitam para que seja logrado sucesso na adoção.

Não divergindo dos demais tipos de adoções, o referencial a princípios básicos, que regem em tal instituto, como o do melhor interesse da criança e do adolescente, da capacidade do adotante para que seja exercida uma paternidade saudável, responsável, e outros, devem ser observados, a ponto de se tornar inviável a adoção caso não haja a presença cumulativa dos mesmos.

Tal tipo de adoção surge conjuntamente com a possibilidade de novas estruturas familiares, sempre existentes e previstas na Constituição brasileira de 1988, possibilitando as pessoas solteiras começarem a assumir juridicamente novos papéis no seio da família, absorvendo responsabilidades e distribuindo afeto, na criação dos seus filhos adotivos.

Como em tudo que há, as flores não conseguem perfumar todos os ambientes, e algumas dificuldades e constrangimentos podem aparecer, manifestados por pessoas sem sensibilidade, marcadas pela ignorância e mediocridade. Esses problemas, com certeza, são muito maiores que os problemas decorrentes de se criar um filho só, sem ter uma das figuras, paterna ou materna, na formação da criança ou do adolescente.

3. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

3.1. CONCEITO

De forma geral, o conceito de princípio está diretamente ligado a tradução da palavra Arkhé, palavra surgida na Grécia muito utilizada pelos pré-socráticos, que tem como significado “o começo”. Tal termo é caracterizado pela incessante busca da origem, da substância percussora de onde nasce as coisas, de onde deriva.

Também refere-se às palavras do latim principium, principii, cujo significado é  origem, começo, base. É o momento em que algo tem origem, p. ex., o princípio de uma estrada é o seu ponto de partida, sua origem. Platão usava a palavra princípio como se este fosse um fundamento de raciocínio. Já Aristóteles, a utilizava para se referir a premissa maior de uma demonstração. Segundo Carrazza[1], Kant seguia uma linha semelhante a de Aristóteles, afirmando que “princípio é toda proposição geral que pode servir como premissa maior num silogismo”.

Para Aurélio Buarque de Holanda[2], princípio é:

Princípio: 1. Momento ou local ou trecho em que algo tem origem (...) 2. Causa primária. 3. Elemento predominante na Constituição de um corpo orgânico. 4. Preceito, regra, lei. 5. P. ext. Base; germe (...). 6. Filos. Fonte ou causa de uma ação.7. Filos. Proposição que se põe no início de uma dedução, e que não é deduzida de nenhuma outra dentro do sistema considerado, sendo admitida, provisoriamente, como inquestionável. São princípios os axiomas, os postulados, os teoremas etc.

No Direito, princípios são as proposições básicas que orientam as ciências, o alicerce. O Direito tem no princípio o seu fundamento, a melhor explicação do seu “porquê “. É ele o orientador de todo o ordenamento jurídico, informando e encaminhando as normas jurídicas. São como as vigas, alicerces ou bases que dão sustento a uma construção arquitetônica, não deixando que vá ao chão. Tal obra é como o Direito, fincado sobre bases, onde cada andar representa um diferente ramo de tal ciência.

Para Miguel Reale[3]:

Princípios são ‘verdades fundantes’ de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da práxis.

Plácido e Silva[4] completa que:

Princípios, no plural, significam as normas elementares ou os requisitos primordiais instituídos como base, como alicerce de alguma coisa [...] revelam o conjunto de regras ou preceitos, que se fixam para servir de norma a toda espécie e ação jurídica, traçando, assim, a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica [...] exprimem sentido mais relevante que o da própria norma ou regra jurídica [...] mostram-se a própria razão fundamental de ser das coisas jurídicas, convertendo-as em perfeitos axiomas [...] significam os pontos básicos, que servem de ponto de partida ou de elementos vitais do próprio Direito.

Nas sábias lições de Celso Antônio Bandeira de Mello[5], a idéia de princípio é analisada de forma análoga, como o mandamento nuclear de um sistema, veja-se:

Mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico.

Por fim, dá para perceber, que os princípios fazem parte do alicerce que sustenta o sistema jurídico, fundamentando e estruturando, de forma lógica, todo o sistema ora tratado. No caso, por exemplo, dos princípios fundamentais, responsáveis pela estruturação do Estado Democrático de Direito, que são responsáveis pela organização referente à interpretação, integração, conhecimento e aplicação do direito positivo constitucional e infraconstitucional. É a pedra singular de qualquer sistema organizado e fundamentado, onde são encontrados os diversos caminhos valorativos, aplicáveis ao interpretar as normas constitucionais.

3.2. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA

Difícil tarefa é conceituar o que é dignidade humana. Tal dificuldade está atrelada a sua amplitude, pois o mesmo não é fechado, é abrangente, complexo e plural. Ela é muito mais o que seu conceito pode falar, e tentar conceituá-la pode acabar se espraiando numa imprecisão, caindo num mundo vago de palavras.

Tal angústia conceitual está ligada não só às raízes históricas, filosóficas, religiosas e culturais da sociedade, mas também ao que vive atualmente tal povo, sua cultura e sua condição civilizatória, todos devidamente atualizados.

Quando se fala em pluralidade pensa-se em duas idéias reconhecidas pela ciência que trata do assunto. A primeira refere-se ao “homem-fim”, onde o indivíduo deve ser tratado como um fim em si mesmo e não como um meio. E a segunda que toda a estrutura arcada na vida, seja individual ou coletiva, sendo razoável, é dotada de igual respeito e reconhecimento.

Assim, reconhecer tal princípio é impor ao Estado que reconheça o indivíduo não mais como mero objeto em relação ao mesmo ou a outros iguais, é tratar os mesmos de forma que não coloque a risco seu status de sujeito de direitos fundamentais, preservando as garantias e proteções que o mesmo pode gozar.

O conceito de princípios não para no tempo, o mesmo está em constante mudança, em processo permanente de construção, não podendo ser estagnado, a ponto de comprometer o reconhecimento da vasta pluralidade social, das divergências numa sociedade, que contemporaneamente, goza de um status de democracia. Tal princípio não pode ser vendido, nem tampouco renunciado, já que está codificado no ser humano, dando ao mesmo qualidade humana, que assim o é.

Conforme os dizeres do desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul José Carlos Teixeira Giorgis[6]:

O princípio da dignidade não é um conceito constitucional, mas um dado apriorístico, preexistente à (sic) toda a experiência, verdadeiro fundamento da República brasileira, atraindo o conteúdo de todos os direitos fundamentais.

Assim, não é só um princípio da ordem jurídica, mas também da ordem econômica, política, cultural, com densificação constitucional.

É um valor supremo, e acompanha o homem até sua morte, por ser da essência da natureza humana; a dignidade não admite discriminação alguma e não estará assegurada se o indivíduo é humilhado, perseguido ou depreciado, sendo norma que subjaz a concepção de pessoa como um ser ético-espiritual que aspira determinar-se e desenvolver-se em liberdade.

Não basta a liberdade formalmente reconhecida, pois a dignidade da pessoa humana, como fundamento do Estado democrático de Direito, reclama condições mínimas de existência digna conforme os ditames da justiça social como fim da ordem econômica.

Tal principio, considerado como valor fundamental de um Estado Democrático de Direito, está previsto no art. 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988, como epicentro de valor de todo o sistema jurídico, responsável pela unificação de todo o esqueleto normativo. Pode-se considerar que tal princípio recebe uma elevação, que o destaca dos demais, sendo considerado um “super-princípio”, suporte de unidade e racionalidade.

O Direito de Família teve sucessivas e marcantes mudanças com a Constituição que ora vigera, sendo atribuído caráter publicista dos princípios de ordem pública, diante dos interesses essencialmente privados.

Seguindo este caminho, o sistema jurídico no Brasil, consegue enxergar o fundamental papel exercido pela família na promoção da busca pela dignidade da pessoa humana. Contudo, é de se notar que tal tutela está atrelada à atenção de propósito anterior, de teor finalístico, pois é a entidade familiar quem tem como princípio a promoção da dignidade e da livre realização da personalidade dos seus membros, que merecerá especial proteção do Estado.

O fato de não ser casado, ou viver com outro alguém, não serve como justificativa para dificultar o processo de adoção. Negar tal direito por esse motivo é ferir a identidade das pessoas que querem constituir uma família monoparental, com seus filhos adotivos. Rejeitar tal afeto é desprezar a existência dessas pessoas, que se sentem preparadas para exercer a paternidade solteira, espalhando preconceito às diferenças.

3.3. PRINCÍPIO DA IGUALDADE

Grande foi o avanço histórico da idéia jurídica de igualdade, quando a mesma foi tratada, de forma preliminar, no artigo 1º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. O princípio da igualdade, também nomeado de princípio da isonomia, surgiu juntamente com outros importantes direitos, com o intuito de tentar diminuir sucessivos abusos cometidos pelo poder absolutista e colocar barreiras na atuação do Estado. É de bom alvitre colocar que nesta época era predominante a idéia dos direitos humanos reduzidos ao direito de liberdade, propriedade e segurança, já que tudo era versado sobre um ponto de vista contratualista liberal.

No artigo 6º da determinada Declaração, encontra-se a ilustre e conhecida afirmação, que diz: “todos os cidadãos são iguais a seus olhos e igualmente admissíveis a todas as dignidades, lugares e empregos, segundo sua capacidade e sem outra distinção que não seja a das suas virtudes e dos seus talentos.”[7]

Para que a igualdade ande juntamente com a justiça, deve-se afastar a arbitrariedade e a desproporção, evitando a opressão, resguardando de forma segura a liberdade. Deve ser afastada também o excesso, pois tal princípio deve ser tratado de forma equilibrada, bem analisada, onde todas as características individuais serão pesadas e colocadas numa balança, a qual irá distribuir os pesos conforme a necessidade e as especificidades de cada parte.

A Constituição de 1988, de forma expressa, recepcionou tal princípio em vários dispositivos. Isso significa que neste país, juntamente com a aplicação do princípio pela busca da igualdade, deve-se concretizar também o combate aos meios discriminatórios, existentes na sociedade brasileira. Discriminar significa excluir, segregar, restringir, e isso é limitar às pessoas diferentes, principalmente, ou quase sempre, as minorias, o direito ao gozo e exercício da igualdade de direitos e condições, presentes no ordenamento jurídico do Brasil, seja em qualquer campo de atuação, político, civil, cultural, social, econômico etc.

Nos ensinamentos de Gustavo Tepedino[8]:

É a pessoa humana, o desenvolvimento da sua personalidade, o elemento finalístico da proteção estatal, para estatal, para cuja realização devem convergir todas as normas de direito positivo, em particular aquelas que disciplinam o direito de família, regulando as relações mais íntimas e intensas do indivíduo no social.

(...)

De se abandonar, portanto, todas as posições doutrinárias que, no passado, vislumbraram em institutos do direito de família uma proteção supra-individual, seja em favor de objetivos políticos atendendo a ideologias autoritárias, seja por inspiração religiosa.

É lícito verberar que a doutrina brasileira costuma dividir a igualdade em material e formal. Nesta, há uma importância de tratamento de forma unificada perante a lei, garantindo a todo cidadão tal direito, só sendo desigualado por determinação expressa do ordenamento jurídico. Naquela, normalmente chamada de igualdade substancial, abraça outras questões mais difíceis de compreensão, já que está relacionada à questão da busca pela justiça social e sua distribuição mais adequada. Trata da realização de uma igualdade real, que exista de fato na vida de todos e não apenas na lei ou diante dela.

Fica claro que a intenção sistemática do mundo jurídico, no Brasil, é a de promover o tratamento moderado e semelhante a todos os sujeitos de direito, sem conceder privilégios ou perseguições. Tal princípio é, assim, um importante meio para afastar a resistência na adoção por pessoas solteiras, igualando as mesmas a casais, que estão dispostos a dividir o carinho, o amor e outros, com seu filho adotado.

3.4. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

Os direitos fundamentais não são absolutos, existindo constantes conflitos entre os mesmos. Surge daí a necessidade de tal princípio, o qual procura de forma mais harmônica a adequação dos diversos princípios fundamentais existentes em sua concretude, em cada especificidade decorrente.

Segundo Humberto Bergmann Ávila[9], quando houver confronto entre princípios:

A própria idéia de ‘conflito’ deve ser repensada. Ora, se o conteúdo normativo de um princípio ‘depende’ da complementação (positiva) e limitação (negativa) decorrente da relação dialética que mantém com outros princípios, como conceber a idéia de ‘colisão’? Tratar-se-ia de um conflito aparente e não-uniforme, já que a idéia de conflito pressupõe a identidade de hipóteses e campos materiais de aplicação entre as normas que eventualmente se contrapõem, o que no caso dos princípios é previamente inconcebível: os princípios são definidos justamente em função de não possuírem uma hipótese e uma conseqüência abstratamente determinadas. O problema que surge na aplicação reside muito mais em saber qual dos princípios será aplicado e qual a relação que mantêm entre si.

Desta forma, na hipótese de haver uma colisão entre princípios fundamentais, deve cada intérprete adequar da melhor forma ao caso concreto, buscando a concretização do binômio necessidade-adequaçao, sem deixar despercebido os valores presentes em tal conflito.

4. A FAMÍLIA

Trabalhar sobre família é tratar da relação mais marcante que um ser humano tem; é falar dos laços mais fortes que interligam os indivíduos membros da mesma. Trata-se do primeiro modelador social do ser humano e, por isso mesmo, é considerada a célula mãe da sociedade, base tão importante que exige, sem questionamentos plausíveis, total proteção do Estado.

Conforme o grande pesquisador Aurélio Buarque de Holanda:

Família. [Do lat. Família] S. f. 1. Pessoas aparentadas, que vivem, em geral, na mesma casa, particularmente o pai, a mãe e os filhos. 2. Pessoas do mesmo sangue. 3. Ascendência, linhagem, estirpe. 4. Hist. Nat. Unidade sistemática ou categoria taxionômica constituída pela reunião de gêneros afins [Em botânica as famílias se caracterizam, em geral, pela terminação – áceas, como, p. ex.. em acabtáceas; em zoologia pela terminação – ídeos, como em formicarídeos.] 5. P. ext. Grupo de indivíduos que professam o mesmo credo, têm os mesmos interesses, a mesma profissão, são do mesmo lugar de origem etc.: a família católica; a família paulista. 6. Fig. Categoria, classe: O novo material para acondicionamento é da família dos plásticos. 7. Gram. Conjunto de vocábulos que têm a mesma raiz. 8. Genét. Conjunto de gêneros afins. 9. Sociol. Comunidade Constituída por um homem e uma mulher, unidos por laço matrimonial, e pelos filhos nascidos dessa união. 10. Sociol. Unidade espiritual constituída pelas gerações descendentes de um mesmo tronco, e fundada, pois, na consangüinidade. 11. Sociol. Grupo formado por indivíduos que são ou se consideram consangüíneos uns dos outros, ou por descendentes dum tronco ancestral comum e estranhos admitidos por adoção. 12. Tip. Designação tradicional de conjunto de tipos que apresentam as mesmas características básicas. 13. Bras., MG, MT e RS. Filho ou filha: “falei-lhe em casamento... porque os pais devem tomar isso a si para bem de suas famílias; não acha?” (TAUNAY, Visconde de. Inocência, p. 52).

Tem ela status que sobressai da qualidade individual, ou estatal. Trata-se de um bem que se relaciona em conjunto, numa parceria, onde indivíduo e sociedade são formadores essenciais da mesma.

Pouco tem valor qual a posição ocupada pelo ser no seio familiar, ou qual tipo de família que ele faz parte, a grande valia mesmo é sua participação num lugar em que há total possibilidade de integração de valores, de difusão de sentimentos e da busca eterna pela felicidade, projeto de realização.

Diversos são os significados da palavra família, que variam de acordo com a cultura e a época referente a cada sociedade. Tal diversidade dificulta num processo de unificação familiar, é claro. Sendo assim, as famílias devem ser entendidas e estudadas de acordo com as mudanças que ocorreram ao longo dos anos, nas relações sociais.

Sobre tal explanação, a doutrinadora Maria Berenice Dias (2010, p. 28) completa ainda que:

O legislador não consegue acompanhar a realidade social e nem contemplar as inquietações da família contemporânea. A sociedade evolui, transforma-se, rompe com tradições e amarras, o que implica a necessidade de constante oxigenação das leis.

Sendo assim, a melhor forma de tratar a família, é através de atualizações normativas, que conforme a desembargadora aposentada, Maria Berenice, não há. Trata-se de oxigenar o meio normativo, acompanhando as necessidades do bojo familiar, suprindo sua carência normativa ou atualizando as mesmas. Tal morosidade em se atualizar explica a forma tradicional de legislar, onde há uma busca desnecessária pela falsa moralidade, pelo caráter meramente moralista e pela opressão da lei.

Sob um prisma analítico das Constituições brasileiras, fácil é a percepção da evolução da prática protetiva da família e das entidades familiares.

4.1. EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE FAMÍLIA

Muito antes da existência do Direito e do Estado, já eram presentes na sociedade a instituição familiar. O caráter essencial da família é caracterizado por um fenômeno natural e cultural. O Direito entra nessas relações devido ao seu enorme grau de complexidade, o que pode surgir múltiplos conflitos de interesses, desde os pessoais até os patrimoniais, gerando um distúrbio na paz que o Direito e a sociedade almeja.

Analisar tal instituto sob uma visão unitária jurídica, ou do Direito, implica na não percepção completa de tal instituto, que é caracterizado pela não simplicidade e pela corrente mutabilidade. Diz Luiz Edson Fachin[10] que:

A família, como fato cultural, está antes e nas entrelinhas do sistema jurídico. Mais que fotos nas paredes, quadros de sentido, possibilidades de convivência. Na cultura, na história, prévia a códigos e posteriores a emoldurações. No universo jurídico, trata-se mais de um modelo de família e de seus direitos. Vê-la tão só na percepção jurídica do Direito de Família é olhar menos que a ponta de iceberg. Antecede, sucede e transcende o jurídico, a família como fato e fenômeno.

A família, base da sociedade, como prevê a Constituição Federal de 1988, é um fenômeno cultural extremamente mutável, onde anda lado a lado com as transformações que ocorrem na sociedade, nas suas correspondentes épocas.

Por muitos anos, a sociedade brasileira viveu sobre a égide de uma família com poderes meramente patriarcais, baseada, com isso, no centro econômico da mesma. Tal instituto, além disso, tinha caráter político e religioso. A procriação era a meta principal de tal instituto e o aspecto afetivo tinha caráter secundário, não era o foco.

Em concordância com Eliana Riberti, apud Rodrigo da Cunha Pereira[11]:

A família antiga era numerosa, edificada no casamento, tendo o pai o poder de vida e de morte sobre a mulher, filhos e escravos. Até a Revolução Industrial, a mulher, filhos, bens, tudo era considerado propriedade do homem e, no caso de separação do casal, naturalmente os filhos ficavam com o pai.

O instituto familiar tinha uma dimensão superior ao atual conceito de família, já que, antigamente, a mesma abrangia como membro não só a prole, os pais e parentes, mas sim, todos aqueles que viviam num regime de dependência do chefe do lar. A família possuía propósito claro, que era o da reprodução, da perpetuidade através das proles, abrangendo todos, até trabalhadores, como escravos, e pessoas outras, como parentes, que viviam sob o comando financeiro do cabeça que sustentava a casa.

Porém, com as idéias liberais, influenciada pela classe burguesa, que ascendia com a Revolução Francesa, o ordenamento jurídico civil passou por algumas mudanças, onde a família extremamente patriarcal passou a ceder de forma gradativa à construção do nítido caráter afetivo da família. A pessoa passou a ser focada com maior ênfase, deixando mais de lado o patrimônio. Tais mudanças são bem visíveis no Direito de Família, que mais recebeu o impacto de tais mudanças.

Paulo Lôbo Netto[12] diz que:

A tendência contemporânea de ver a família na perspectiva das pessoas que a integram, e não de seus patrimônios, para regulação de seus direitos, constitui o fenômeno que apropriadamente se denomina repersonalização. É na pessoa, enquanto tal, que reside a dignidade humana.

Assim sendo, o instituto passou a ser tratado como meio pelo qual a satisfação dos seus membros era fundamental, mantendo seguros os laços afetivos entre os mesmos. Afeto este que entrelaça, mesmo diante da distância, no passo e descompasso dos tempos e do espaço, os membros familiares. É tratamento de solidariedade fundamental às vidas, preservando, inclusive, a intimidade.

Nas palavras de Delma Silveira[13]:

Nasce uma concepção de família moderna, com a progressiva eliminação da hierarquia, emergindo uma restrita liberdade de escolha; o casamento fica dissociado da legitimidade dos filhos. Começam a dominar as relações de afeto, de solidariedade e cooperação. Proclama-se o modo de visão eudemonista da família: não é mais o indivíduo que existe para a família e para o casamento, mas a família e o casamento existem para o seu desenvolvimento pessoal, em busca de sua aspiração à felicidade.

A afetividade deve ser aplicada como princípio em todas as entidades familiares, de forma independente da sua origem, se pelo casamento ou não, e de livre orientação sexual de seus partícipes, já que o afeto é essência de todo núcleo familiar, fazendo parte não só de ciências como psicologia, sociologia etc., mas do Direito também, devendo dessa forma ser percebido e tratado pelo mesmo, na busca incessante do melhor para as famílias brasileiras.

Apesar da não previsão constitucional expressa, tal princípio tem forte fundamentação no artigo 227 da CF de 1988. Já que o mesmo trata da família como meio social fundado sob laços de afinidade entre seus membros.

Assim, com a constitucionalização do Direito Civil, a família adquiriu um conceito que está de acordo com o Estado democrático de Direito, sendo baseado no afeto e na solidariedade, pois foi perdido ao decorrer dos tempos a característica patriarcal e patrimonial da mesma.

A família, de verdade, só deve ser justificada pela liberdade e afetividade de seus membros. Nesse contexto, Rodrigo da Cunha Pereira[14] citou Giselda Hironaka, da seguinte forma:

Vale dizer, a verdade jurídica cedeu vez à imperiosa passagem e instalação da verdade da vida. E a verdade da vida está a desnudar aos olhos de todos, homens ou mulheres, jovens ou velhos, conservadores ou arrojados, a mais esplêndida de todas as verdades: neste tempo em que até o milênio muda, muda a família, muda o seu cerne fundamental, muda a razão de sua constituição, existência e sobrevida, mudam as pessoas que a compõem, pessoas estas que passam a ter a coragem de admitir que se casam principalmente por amor, pelo amor e enquanto houver amor. Porque só a família assim constituída – independente da diversidade de sua gênese – pode ser mesmo aquele remanso de paz, ternura e respeito, lugar em que haverá, mais que em qualquer outro, para todos e para cada um de seus componentes, a enorme chance da realização de seus projetos de felicidade.

Fica claro que a família, nesse milênio, adquiriu formas da felicidade, formas que buscam a realidade dos fatos além de tudo, deixando aspectos retrógrados para trás e reconhecendo famílias com outras características que não a heterossexual, a patriarcal, a que tinha o fim de procriação etc., desempenhando, assim, uma função social com a busca do reconhecimento de famílias baseadas na ligação afetiva, no amor e na felicidade que as compõe, lugar que é de extrema importância para o desenvolvimento do indivíduo, seja quanto à sua dignidade, seja quanto à sua personalidade.

4.2. PRINCÍPIO DA PLURALIDADE DAS FORMAS DE FAMÍLIA

O princípio da pluralidade das formas de família é consequente de outro importante princípio, o da dignidade da pessoa humana, reconhecendo a afetividade, estabilidade e ostensividade nos diversos modelos de família. Independe aqui se a família é constituída através de um casamento, de parentesco ou se são de sexos opostos ou iguais, o fato é que a mesma é merecedora de todo o respeito e tutela do Estado.

Tal princípio é explícito no artigo 226 da CF de 88, onde deixa espaços vagos para a infinidade de tipos de formação familiar. Tal opinião, apesar de clara, não é pacífica, pois alguns doutrinadores insistem na tese de que tal artigo é excludente, onde é limitado, ou melhor, reconhecido, apenas aqueles modelos de entidades familiares presentes no texto constitucional.

A Constituição que tem como princípio maior a dignidade da pessoa humana, não pode deixar despercebida outros modelos de entidades familiares que não os citados no texto do artigo 226. Trata-se de um rol meramente exemplificativo, pois infinitas são as possibilidades da formação de tal instituto, conforme dito anteriormente.

Reconhecer apenas as famílias oriundas do casamento, da união estável ou da comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes é fechar os olhos para os princípios e regras norteadores do Direito. Tal interpretação não deve ser literal, pois acaba num confronto desnecessário, onde a dignidade da pessoa humana é descartada e trocada por mero preconceito limitador à hermenêutica e ofensivo à justiça.

Numa análise do artigo 226 da Constituição cidadã, é perceptível, diferentemente das demais Constituições brasileiras, que a mesma não tratou de nenhum tipo de família específico, excluindo, inclusive, o termo tratado anteriormente pelas demais referente à constituição pelo casamento. Não houve nenhum acréscimo do texto, após a retirada, mostrando a intenção do legislador constituinte de proteger a família, de qualuer espécie de constituição familiar, seja ela homoafetiva, anaparental etc.

Referente ao assunto, Paulo Lôbo[15] expôs que:

O fato de, em seus parágrafos, referir a tipos determinados, para atribuir-lhes certas conseqüências jurídicas, não significa que reinstituiu a cláusula de exclusão, como se ali estivesse a locução ‘a família, constituída pelo casamento, pela união estável ou pela comunidade formada por qualquer dos pais e seus filhos’. A interpretação de uma norma ampla não pode suprimir de seus efeitos situações e tipos comuns, restringindo direitos subjetivos.

Dessa forma, sob a nova ótica constitucional, o artigo 226 da Constituição Federal de 1988, refere-se a um dispositivo inclusivo que, visando a dignidade da pessoa humana, a afetividade e a igualdade, busca reconhecer todas as formas de se constituir uma entidade familiar, que observe tais requisitos citados, não podendo deixar de proteger determinadas famílias, já que a exclusão fere tais preceitos, principalmente o da dignidade do indivíduo.

A partir da nova face dada ao Direito Civil, os princípios da dignidade da pessoa humana, da liberdade e da igualdade passaram a ser utilizados conjuntamente. Sendo assim, não pode o Direito de Família desperceber tais princípios, já que os mesmos são de fundamental importância na busca pelo justo, pelo digno. Finca, a partir dos mesmos, outro princípio, o da pluralidade das formas de família que, com raízes profundas, sustentam o reconhecimento e a tutela dos diversos modelos familiares, concedendo-lhe, através do Estado, total proteção.

O professor Rodrigo Pereira da Cunha[16] mostra o quâo importante é o reconhecimento pleno do princípio da dignidade da pessoa humana, na busca da caracterização do princípio da pluralidade familiar, veja-se:

Diante da hermenêutica do texto constitucional e, sobretudo, da aplicação do princípio da pluralidade das formas de família, sem o qual estar-se-ia dando um lugar de indignidade aos sujeitos da relação que se pretende seja família, tornou-se imperioso o tratamento tutelar a todo grupamento que, pelo elo do afeto, apresente-se como família, já que ela não é um fato da natureza, mas da cultura.

A partir da interpretação normativa, com destque as constitucionais, deve ser concedida máxima efetividade que puder, ampliando, ao máximo, seu conteúdo, e privilegiando as interpretações que possibilitem o maior reconhecimento eficaz da norma. Dessa maneira, numa hipótese conflitiva entre a interpretação literal, neste caso, sendo aquela que reconhece apenas as entidades familiares tratadas expressamente no artigo 226 da CF, e a interpretação inovadora da mesma constituição, que, de forma sistemática e baseada em princípios, possibilita que o mesmo artigo ora tratado prevaleça e passe a reconhecer todos os diversos modelos de formação familiar, deve haver uma prevalecência dessa última interpretação, já que a mesma observa de forma mais densa o princípio da proteção da dignidade da pessoa humana, que não pode ser despercebido, em hipótese alguma, pelo Estado.

Mostra com isso, que a permanência da não abrangência das diversas formações familiares pela proteção estatal é um grande vício de interpretação, já que inobserva os princípios constitucionais.

É inegável que, mesmo com o reconhecimento meramente matrimonial da família, concedida pela forma expressa da Constituição Federal, outros modelos de família sempre existiram na sociedade, ocupando o que chama-se de práxis social. Tais entidades não deixarão de existir, pois são nelas que milhares de pessoas buscam sua felicidade de forma conjunta e harmônica, possibilitando a dignidade e a afetividade entre humanos. Tudo que qualquer família almeja.

O Direito não pode ser mascarado, de forma que o torne estático, duro e imutável. Deve ser reconhecido seu caráter extremamente mutável, dinâmico, multifacetado, flexível, de forma que não possibilite exclusões como essas.

Como consequência do princípio que reconhece a pluralidade familiar, o modo único e excludente de proteção da família, a matrimonial, deixou de existir, abrangendo para as demais famílias, justificadas pelo afeto.

Como assevera Rodrigo da Cunha Pereira[17]:

Pouco relevante á a obediência a uma padronização, mesmo porque, quando se trata de afeto, isso é impensável. Necessário é compreender que a sociedade comporta a pluralidade de família, num movimento histórico, a partir das demandas íntimas de cada indivíduo. Ao se relacionar e afeiçoar-se a alguém, não deveria fazer parte da preocupação das pessoas a titulação que será dada a este elo. O importante é verificar se há ali um núcleo familiar compondo uma estrutura psíquica, seja com alguém de seu sexo ou de sexo oposto, com filhos ou sem filhos, para se ter uma nova vivência afetiva, não obstante a dor de um rompimento anterior.

Não se pode falar em Estado Democrático de Direito sem reconhecer a existência da pluralidade familiar. Em tal Estado há uma busca maior pela democracia, pelo respeito as diferenças, de forma que a igualdade, a dignidade da pessoa humana e a liberdade sejam garantidas a todos os membros pertencentes ao seio social. Não pode o Estado, de forma alguma, inibir a perpetuação de felicidade conjunta, que existe em muitas famílias brasileiras.

Tratar de Estado Democrático de Direito vai muito além da referência estrutural política, já que a mesma serve como orientadora da interpretação constitucional das normas. Na busca pela democracia, prevista expressamente em tal Estado, não pode-se restringir a abrangência a todas as famílias pelo artigo 226 da Constituição Federal de 1988, já que todo membro social, respaldado na pluralidade democrática, tem garantido o direito de constituição e manutenção de vículo familiar, sem poder haver discriminação, de forma que seja observada a legalidade.

A partir desse momento histórico, surge um novo Direito de Família, plural e feliz, podendo ser chamado também de Direito das Famílias. Como bem explana Edson Fachin[18]:

[...] o Direito não imune à família como refúgio afetivo, centro de intercâmbio pessoal e emanador da felicidade possível, família como sendo o mosaico da diversidade, ninho da comunhão no espaço plural da tolerância, valoriza o afeto, afeição que recoloca novo sangue para correr nas veias de um renovado parentesco, informado pela substancia de sua própria razão de ser e não apenas pelos vínculos formais ou consangüíneos. Tolerância que compreende o convívio de identidades, espectro plural, sem supremacia desmedida, sem diferenças discriminatórias, sem aniquilamentos.

Enfim, a afirmativa que a família é vista como instituição em si mesma não é mais verídica, já que a mesma, na modernidade, mostra-se como instrumento que vai muito mais além, é meio pelo qual o homem busca a felicidade plena. Isso, por si só, já é o suficiente para que o Estado trate com mais respeito e com maior proteção aos mesmos. Trata-se de um centro em que se desenvolve a personalidade, em que se busca a dignidade dos membros pertencentes a ela etc.. Somente com o respeito a liberdade de escolha e de formação da família, de acordo com suas escolhas e seus gostos, é que será concretizado as idéias do pensamento do Estado Democrático de Direito, configurado pela dignidade humana.

4.3. HISTÓRIA DAS FAMÍLIAS NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

Procurar-se-á exclarecer neste ítem as diversas transformações na forma de tratar a família pelo Estado Brasileiro até a Constituição de 1988. Focando os avanços que a mesma obteve nas últimas décadas, os quais foram os responsáveis pelo novo conceito de família tratado nas normas em vigor.

É lícito verberar que, com a afirmação atual, tenta-se, aqui, demostrar o caráter não estático do conceito de família, o qual se transforma e modifica em companhia da sociedade, de sua cultura etc.

Segundo as palavras do doutrinador Cristiano Chaves de Farias (FARIAS, 2004, p. 58):

É inegável que a multiplicidade e variedade de fatores (de diversas matizes) não permitem fixar um modelo familiar uniforme, sendo mister compreender a família de acordo com os movimentos que constituem as relações sociais ao longo do tempo e do espaço cultural.

[...]

Com efeito, a família tem o seu quadro evolutivo atrelado ao próprio avanço do homem e da sociedade, mutável de acordo com as novas conquistas da humanidade e descobertas científicas, não sendo crível, nem admissível, que esteja submetida a idéias estáticas, presas a valores de um passado distante, nem a suposições incertas de um futuro remoto. É realidade viva, adaptada aos valores vigentes.

A família começou a ser tratada pelas constituições brasileiras a partir do século XIX, e mesmo assim foi versada de modo bem simples, um pouco tímida. Tal época, no Brasil, foi marcada por grandes mudanças estruturais e políticas, uma transferência de governo, que, por muito tempo, levou o povo brasileiro a mutilações psicológicas e físicas até que chegasse a tão sonhada independência de Portugal. Tal independência passou a exigir uma nova ordem normativa, que visasse, principalmente, a regulamentação da nova ordem política que no país imperava, observando também as necessidades sociais, que eram clareadas pelo iluminismo francês.

Em 1824, depois de uma assembléia, nomeada de Assembléia Nacional Constituinte, a Constituição brasileira de 1824 foi outorgada pelo então imperador D. Pedro I. Tal constituição bebeu muito na fonte de outras constituições, sendo destaque a constituição inglesa, além de idéias do Estado Liberal, defendidas e trazidas por filhos de portugueses, que estudavam Direito na Europa e lá viviam tal realidade.

A maior defesa de tal modelo de estado era acabar com os abusos que ocorriam no Estado absolutista, concedendo mais liberdade ao povo e decepando as regalias que pequena parte da sociedade gozava, a classe privilegiada. Com tais idéias, as classes mais populares que viviam no Brasil começou a apoiar tal modelo, criando profundas esperanças de mudança na Constituição de 1824. Tal Lex, apesar de beber das idéias liberais, não teve suas idéias concretizadas. Tal caso tem uma explicação, o fato da burguesia ter trazido tais propostas visando seus interesses, políticos e econômicos, que, ao juntarem com o império, esqueceu dos ideais seguidos no papel, fazendo da prática uma realidade diversa daquela tão esperada pelo povo, principalmente pelas classes marginalizadas.

Tal Constituição, apesar de ter dado mais vastidão ao rol de direitos civis, políticos e sociais das massas conjuntos com o liberalismo constitucional, não teve grande destaque quanto ao tratamento expansivo da família. A maior parte do seu conteúdo referia-se a parte política, prevendo em apenas alguns artigos, do art. 105 ao art. 115, sobre a família, a imperial. Tais artigos não versavam sobre as famílias brasileiras, tinha um conteúdo estrito, pobre.

A família brasileira só passou a ser tratada com a Constituição republicana de 1891, reconhecendo somente as famílias formadas a partir do casamento civil, que naquela época se dava somente através da Igreja Católica. Todo o tratamento referente a família, sendo assim, associava tal instituição à igreja, que dessa forma, a tratava sob os rigores do Direito Canônico.

Dos ensinamentos de Luiz Roldão de Freitas Gomes[19], tal assunto é prosseguido da seguinte forma:

No âmbito do Direito Canônico, é a família considerada pelas escrituras como entidade de direito divino. Para a Igreja, a família tem origem exclusivamente no casamento, instituição criada por Deus e elevada à categoria de sacramento, com a finalidade de santificar a união indissolúvel do homem e da mulher, visando não a satisfação da concupiscência pelo congresso sexual, mas também, e principalmente, à procriação e educação da prole.

Após a queda do segundo reinado, o Brasil encontrava-se numa situação dramática, afundado numa crise política, com problemas militares e religiosos, além da decadência da sociedade escravocrata. A insatisfação com tal modelo de governo, fez com que aqueles que estavam pessimistas com o tratamento político se revoltassem, e conjuntamente com o golpe militar, instaurasse a república no país. Em tal contexto, surge a necessidade de uma nova constituição, a de 1891, que se baseou também em idéias iluministas, da Revolução Francesa, além de idéias da Constituição americana de 1787.

O tratamento da Constituição de 1891, com a família, trouxe grandes novidades, rompendo com o liame que ocorria entre Estado e religião, fato este que, por longos anos, foi permanecido no Brasil. Tal mudança constitucional levou ao Estado o dever do tratamento com os casamentos, o único responsável por tal enlace, diferindo da última Constituição, que colocava nas mãos da igreja todo o tratamento de formação familiar (já que a família só se formava através do casamento civil).

Tal Lei Maior, apesar das inobservâncias que teve referentes a regularização da instituição familiar, da limitação imposta a tal instituto quanto ao não reconhecimento de outras formas de formação familiar e da imposição desigual entre os cônjuges, trouxe ao Direito a possibilidade de que houvesse um avanço legislativo no que tange a família.

A próxima Constituição foi a de 1934, surgida a partir dos ideais revolucionários da década de 1930, que visava o lado social em detrimento das idéias liberais presentes nas outras constituições. Tal constituição se baseou também num modelo constitucional europeu, vindo da Alemanha, protetora da formação de um Estado Social, mais visível na Constituição de Weimar (1919).

Mesmo com a tentativa de observância social, tal Carta trazia ambigüidade nos seus artigos. Muitas idéias sociais confrontavam, num mesmo texto, com idéias inspiradas pelo mundo liberal e com pensamentos governistas centralizadores. Mas foi nessa constituição que à família foi destinada um capítulo inteiro, indo dos artigos 144 a 147.

Assim, determinavam tais artigos:

Art 144 - A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção especial do Estado.

Parágrafo único - A lei civil determinará os casos de desquite e de anulação de casamento, havendo sempre recurso ex officio, com efeito suspensivo.

Art 145 - A lei regulará a apresentação pelos nubentes de prova de sanidade física e mental, tendo em atenção as condições regionais do País.

Art 146 - O casamento será civil e gratuita a sua celebração. O casamento perante ministro de qualquer confissão religiosa, cujo rito não contrarie a ordem pública ou os bons costumes, produzirá, todavia, os mesmos efeitos que o casamento civil, desde que, perante a autoridade civil, na habilitação dos nubentes, na verificação dos impedimentos e no processo da oposição sejam observadas as disposições da lei civil e seja ele inscrito no Registro Civil. O registro será gratuito e obrigatório. A lei estabelecerá penalidades para a transgressão dos preceitos legais atinentes à celebração do casamento.

Parágrafo único - Será também gratuita a habilitação para o casamento, inclusive os documentos necessários, quando o requisitarem os Juízes Criminais ou de menores, nos casos de sua competência, em favor de pessoas necessitadas.

Art 147 - O reconhecimento dos filhos naturais será isento de quaisquer selos ou emolumentos, e a herança, que lhes caiba, ficará sujeita, a impostos iguais aos que recaiam sobre a dos filhos legítimos.

Numa breve análise de tais dispositivos, percebe-se que tal Constituição não trouxe significativas mudanças no que se refere ao tratamento familiar, focalizando apenas a pontos formais, associados ao modo de formação familiar, que permanecia em situação de imprevisão legal, amarrada ao casamento, já que este era o único caminho daqueles que queriam ter reconhecida sua instituição. O grande avanço de tal Carta refere-se ao fato de ter conferido à família total proteção do Estado, mostrando com isso o quão importante é a família na formação do Estado e da sociedade em geral.

Com a CF de 1937 foi surgida o Estado Novo, idealizado por Getúlio Vargas, através de um golpe estatal baseado em idéias nazistas e fascistas da Europa (Constituição Federal polonesa). Percebe-se desde já, como principal característica, a idéia totalitária e fascista presente na Constituição de 1937.

Todas as possibilidades de democracia foram decepadas com a Carta de 1937. Tal governo era regido por um líder ditador e autoritário, que instaurou a Constituição sem necessidade da ANC na criação do seu teor textual.

No que se refere à família, quase que não houve mudanças, permanecendo o que já era prevista na Carta passada. Neste sentido, o casamento civil continuou sendo tratado como instituição indissolúvel e único meio de ter reconhecida a formação familiar, com ainda proteção estatal.

Apesar do negativismo proveniente de tal governo, algo é de grande atenção. O constituinte se preocupou com os filhos legítimos, realçando a preocupação estatal com as crianças e com os adolescentes.

Fica claro esta explanação ao ler os artigos 124 ao 127, desta Constituição. Vide:

Art 124 - A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção especial do Estado. Às famílias numerosas serão atribuídas compensações na proporção dos seus encargos.

Art 125 - A educação integral da prole é o primeiro dever e o direito natural dos pais. O Estado não será estranho a esse dever, colaborando, de maneira principal ou subsidiária, para facilitar a sua execução ou suprir as deficiências e lacunas da educação particular.

Art 126 - Aos filhos naturais, facilitando-lhes o reconhecimento, a lei assegurará igualdade com os legítimos, extensivos àqueles os direitos e deveres que em relação a estes incumbem aos pais.

Art 127 - A infância e a juventude devem ser objeto de cuidados e garantias especiais por parte do Estado, que tomará todas as medidas destinadas a assegurar-lhes condições físicas e morais de vida sã e de harmonioso desenvolvimento das suas faculdades.

Mesmo diante de tais positivas inovações, a Constituições de Vargas ainda não beirava o que era desejado, já que continham erros que por tempos eram previstos na história das constituições brasileiras. A família tinha sua formação limitada, com desigualdade entre seus membros e tratamento preconceituoso com os filhos ilegítimos, já que nos direitos, apenas os filhos legítimos gozavam de proteção.

A Constituição de 1946 foi destaque pela busca da realização democrática, tendo como fonte a Carta da primeira República e a CF de 1934. Porém esta Constituição, mesmo que com forte tendência social, não se destacou das demais no quesito família. O casamento gratuito foi mantido, assim como seu caráter indissolúvel. Tal instituto continuou sendo, também, o único meio legal de se constituir uma família, que permanece, assim, com proteção estatal, devido a sua importância para a sociedade.

Vide artigos 163 a 165, correspondentes à família, presentes em tal Carta:

Art 163 - A família é constituída pelo casamento de vínculo indissolúvel e terá direito à proteção especial do Estado.

§ 1º - O casamento será civil, e gratuita a sua celebração. O casamento religioso equivalerá ao civil se, observados os impedimentos e as prescrições da lei, assim o requerer o celebrante ou qualquer interessado, contanto que seja o ato inscrito no Registro Público.

§ 2º - O casamento religioso, celebrado sem as formalidades deste artigo, terá efeitos civis, se, a requerimento do casal, for inscrito no Registro Público, mediante prévia habilitação perante a autoridade competente.

Art 164 - É obrigatória, em todo o território nacional, a assistência à maternidade, à infância e à adolescência. A lei instituirá o amparo de famílias de prole numerosa.

Art 165 - A vocação para suceder em bens de estrangeiro existentes no Brasil será regulada pela lei brasileira e em, benefício do cônjuge ou de filhos brasileiros, sempre que lhes não seja mais favorável a lei nacional do de cujus.

A CF de 1967 surgiu para formalizar um novo regime, o ditatorial de 1964. Nesse período, o povo brasileiro teve retirado de si muitos direitos advindos da Constituição, sendo perseguidos politicamente, censurados e repreendidos quando se manifestavam contra o governo, que era liderado por militares. Apesar de tantas mudanças, os constituintes não modificaram os direitos da família previstos em Constituições passadas, repetindo-os de forma integral no texto constitucional. Sendo assim, a família continuou sendo um ente protegido pelo Estado, reconhecida juridicamente somente através do casamento civil, que se dava de forma gratuita, sendo ele indissolúvel. Além disso, continuou com a menção sobre a criança e o adolescente, “objeto” de cuidados e garantias tutelados pelo Estado.

Porém ao contrário de Constituições anteriores, a Carta de 1967 não trouxe exclusividade de Capítulo destinado à família, tratando-a em apenas um artigo, que sintetizou todo o conteúdo referente a família, presente na última Constituição.

Vide o artigo 167, que resumiu todo o conteúdo que versava sobre a família:

Art 167 - A família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos Poderes Públicos.

§ 1º - O casamento é indissolúvel.

§ 2º - O casamento será civil e gratuita a sua celebração. O casamento religioso equivalerá ao civil se, observados os impedimentos e as prescrições da lei, assim o requerer o celebrante ou qualquer interessado, contanto que seja o ato inscrito no Registro Público.

§ 3º - O casamento religioso celebrado sem as formalidades deste artigo terá efeitos civis se, a requerimento do casal, for inscrito no Registro Público mediante prévia habilitação perante, a autoridade competente.

§ 4º - A lei instituirá a assistência à maternidade, à infância e à adolescência.

Em 1969, houve uma Emenda Constitucional no 01, que não foi a diante no quesito família, repetindo o texto do artigo tratado anteriormente, o art. 167. Porém em 1977, com a Emenda Constitucional no 09, foi introduzido ao rol de direitos no Brasil a possibilidade de se divorciar, tirando do casamento o fardo da indissolubilidade.

Percebe-se que com tais Constituições até então tratadas não houve um tratamento social ao casamento, isto é, os interesses sociais não foram previstos por tais Cartas, no que se refere a esta instituição. O Estado brasileiro sustentava como única forma de formação familiar o casamento, pouco se importando se entre os cônjuges havia amor, afeto. O mesmo não garantia a igualdade substancial entre marido e mulher no bojo familiar, além de tratar de forma diversa os filhos decorrentes do casamento, os legítimos, e os filhos provindos fora da instituição civil, os ilegítimos.

Surge então a Constituição Federal de 1988, normalmente chamada de constituição cidadã, que concede à família um novo tratamento, se atendo às necessidades sociais. Passa então a ser reconhecida uma variedade de meios de formação familiar, além de prever direitos aos menos favorecidos, como igualdade substancial às mulheres, homossexuais etc., maior proteção à criança e ao adolescente, privilégios aos idosos dentre outros.

Sobre a Constituição democrática e cidadã, Rodrigo Ribeiro da Cunha[20] que:

Impulsionada pelas expressivas modificações do contexto político, econômico e social do país, tratou de forma mais pontual a família, provocando uma verdadeira revolução no Direito de Família. Afinal, “o direito é produto dos círculos sociais, é fórmula da coexistência entre eles” (Francisco Pontes de Miranda. Tratado de direito privado, v.7, p.170). Era imperioso que a norma constitucional entrasse em compasso com os fatos sociais e os sentidos axiológicos dados por seus destinatários, sob pena de nascer velha e tornar-se ineficaz. Neste sentido, houve o rompimento com a premissa de que o casamento era o único instituto formador e legitimador da família brasileira, e de modelo de família hierarquizada, patriarcal, impessoal e, necessariamente, heterossexual, em que os interesses individuais cediam espaço à manutenção do vínculo. Esta Constituição trouxe, além de novos preceitos para as famílias, princípios norteadores e determinantes para a compreensão e legitimação de todas as formas de família.

Tal Diploma trouxe grandes modificações, se atendo as mudanças políticas, sociais e econômicas que aconteciam no Brasil, sendo um grande divisor de águas para o Direito de Família. A família passou a ser vista, não mais como instituição uniforme que merecia tratamento do Estado, mas como uma instituição onde aconteceria o desenvolvimento e as realizações dos seus membros; um meio importantíssimo de preparar o ser humano para viver em sociedade e de garantia da dignidade da pessoa humana.

Neste sentido, Maria Cláudia Crespo Brauner[21] assevera que:

No caso brasileiro, o Direito de Família passou a ser um valor constitucional na medida em que a Constituição federal de 1988 acolheu as expectativas da sociedade na tutela das relações de família e dedicou um capítulo, composto de cinco artigos e diversos parágrafos, definindo os direitos dos entes familiares e as obrigações do Estado para com eles. Dessa forma, atribuiu-se uma dimensão constitucional ao tratamento da família.

Um grande avanço trazido pela CF de 1988 foi a previsão do princípio da igualdade, levando ao reconhecimento da semelhança entre os sexos, evitando tratamentos discriminatórios entre homem e mulher. Trouxe no bojo constitucional outro grande avanço, pois a partir de tal Constituição o casamento passou a ser um dos meios de formação familiar, não mais o único, sendo reconhecidas as famílias provenientes de união estável, da monoparentalidade entre outras.

Em linhas conclusivas, o Diploma constitucional de 1988 tratou de uma família democrática, onde funções podem variar entre os seus membros, sendo regidas por afeto, principal elo entre seus membros. A busca pela felicidade e realização pessoal passou a ser a principal meta, sendo visadas também a solidariedade e o amor, fundamentos de uma família e sociedade, conseqüentemente, saudáveis. É o direito garantindo aos indivíduos o eudemonismo, isto é, a busca pela felicidade, como objetivo de vida.

4.4. HISTÓRIA DAS FAMÍLIAS NOS CÓDIGOS CIVIS BRASILEIROS

As mudanças foram percebidas não só no campo constitucional, muitas foram também as transformações ocorridas na ceara infraconstitucional, principalmente no atual Código que vigera a sociedade brasileira.

Tais mudanças serviram como resposta, óbvia, às mudanças ocorridas no texto constitucional. Adequação é a palavra mais correta para explicar tal mudança, fazendo com que tal Código passasse também a reconhecer a família como instituto igualitário, solidário e plural.

O Código Civil Brasileiro de 1916 focou nos interesses da burguesia da época, adequando o conceito jurídico de família aos interesses que a classe mais necessitava. Tais anseios referiam-se quase que na sua totalidade as questões patrimonialistas, já que se trata-se aqui da classe burguesa, classe esta que, historicamente, tem uma ligação direta com o patrimônio.

O conteúdo do Código de 1916 previa uma família extremamente matrimonial, patrimonializada, patriarcal, hierarquizada e desigual, onde o objetivo maior da tutela não era o ser humano, mas o patrimônio, prevalecendo o ter sobre o ser.

Observa Euclides Oliveira, apud in Maria Berenice Dias[22], que:

O Código Civil anterior, que datava de 1916, regulava a família do início do século passado, constituída unicamente pelo matrimônio. Em sua versão original, trazia uma estreita e discriminatória visão da família, limitando-a ao grupo originário do casamento. Impedia sua dissolução, fazia distinções entre seus membros e trazia qualificações discriminatórias às pessoas unidas sem casamento e aos filhos havidos dessas relações. As referencias feitas aos vínculos extramatrimoniais e aos filhos ilegitimos eram punitivas e serviam exclusivamente para excluir direitos.

O Código ora vigente, observando os princípios constitucionais, traz em seu bojo a idéia de igualdade entre os formadores da família, erradicando a possibilidade de tratamento desigual e preconceituoso entre os mesmos. Fica visível tal explanação com a análise dos artigos 1511 e 1567, presentes no mesmo. Veja-se:

Art. 1.511 - O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges.

Art. 1567 - A direção da sociedade conjugal será exercida, em colaboração, pelo marido e pela mulher, sempre no interesse do casal e dos filhos.

Com tais artigos, fica claro a proposta do legislador garantir a quebra da hierarquização entre os membros familiares, estando os mesmos em situação de igualdade de direitos e deveres, sendo respeitados os limites e a privacidade dos indivíduos.

Observa-se em tal Código também a defesa de uma família ter definido seu membro-chefe, isto é, a idéia patriarcal da família foi colocada a tona e deletada de tal código normativo. Isso mostra o alcance aos novos modos de vida existentes no Brasil, onde cada vez mais, mulheres assumem o sustento dos seus lares, mostrando-se indispensáveis para o sustento da casa, o que antes só acontecia com os homens, já que o outro sexo era tratado como inferior, impossibilitado e fraco.

Outros avanços podem ser fichados, como a aplicação do princípio da isonomia dentro da relação conjugal, como iguais idades entre homem e mulher para poder se casar; o direito do homem de poder colocar como seu, sobrenome da sua esposa, após o casamento; a possibilidade da mulher fixar domicílio da família conjuntamente com o esposo, isto é, de escolher qual será o domicílio do casal, junto com seu marido; o dever de sustentar a família, agora, para ambos os sexos etc..

A família, no Código Civil passado, era tratada sob regulamentos inflexíveis e conservadores, prevalecendo o machismo, o homem como centro das instituições, o cabeça. Com o atual Código, homens e mulheres passaram a ter tratamentos iguais.

Quanto à filiação, tal edição normativa trouxe algumas novidades, como a ruptura da superioridade do vínculo biológico entre pais e filhos, diante da paternidade afetiva.

Luiz Edson Fachin[23], tratando do assunto, assevera que:

A Verdade sociológica da filiação se constrói, revelando-se não apenas na descendência, mas no comportamento de quem expende cuidados, carinho no tratamento, quer em público, quer na intimidade do lar, com afeto verdadeiramente paternal, construindo vínculo que extrapola o laço biológico, compondo a base da paternidade.

(...)

O reconhecimento da filiação socioafetiva se impôs a partir do desenvolvimento da mesma engenharia genética que tornou inegável a verdade biológica. Se, de um lado, a ciência permite a certeza sobre laços de sangue, ela permite, sob outro aspecto, que tais laços sejam postos à margem diante de uma realidade socioafetiva.

Deste modo, a afetividade, manifestada através do amor e do carinho, principalmente, passam a ser elementos de extremo valor nas relações entre pais e filhos, sem possibilidade de se debater a distinção, que antes era dada, entre filhos legítimos, ilegítimos e legitimados. Isso é fundamentado através do artigo 1596 do mesmo Código, que trata todos os filhos, sejam eles havidos da relação conjugal ou não, e até mesmo por adoção, de forma igual perante a direitos e deveres, tendo iguais qualificações, sendo proibido termos discriminatórios referentes aos mesmos. Filho é filho, independente da forma que foi provido.

É lícito reverberar que, através das manifestações sociais e da busca pela adequação social do Direito, o novo Código trouxe o reconhecimento plural das famílias, quebrando com a forma única de constituição familiar, que era o casamento. Tal legislação não trouxe no seu texto as possibilidades de se formar uma família, tratando apenas das uniões estáveis e das famílias oriundas do concubinato. Vide artigos 1723 e 1727 do Código Civil de 2002:

Art. 1723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, continua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

Art. 1727 – As relações não eventuais entre homem e a mulher, impedido de casar, constituem concubinato.

Apesar de tamanhas mudanças, tal Código não prevê outras formas de família que, de fato, existem no seio social, deixando de reconhecer a pluralidade de meios formadores de família e da diversidade de gêneros dentro de tais institutos.

4.5. A FAMÍLIA MONOPARENTAL

Não há uma precisão quanto à origem da família monoparental, já que esta sempre existiu na história da sociedade. Há muito que se ouve falar em mães solteiras, filhos e mulheres abandonados, dentre outros casos. Porém nas últimas décadas ocorreu uma grande explosão no que se refere a monoparentalidade, já que o divórcio possibilitou àqueles que não viviam bem ou que por qualquer outro motivo viver apenas com sua prole e a ciência possibilitou outros meios de gerar filhos que não dependem diretamente de um ou de dois genitores, como barriga de aluguel, fertilização in vitro, dentre outras.

Trata-se de família monoparental quando homens ou mulheres encontram-se “sós”, vivendo com uma ou mais crianças. É válido ressaltar que independe se este determinado homem ou esta mulher vive em casa própria ou de parentes, como muito acontece em casos que moram numa mesma casa pais, filhos e netos. Isso não desconfigura o caráter monoparental da família. Não é característica fundamental da família monoparental viver isolada, apenas pode acontecer, não podendo ser característica essencial.

A monoparentalidade sempre esteve ligada a condição final de uma biparentalidade, transformando consequentemente em uma questão monoparental, o que normalmente ocorre com a viuvez, com os divorciados, solteiras que viviam numa união estável que findou etc. Essa realidade muito vem sendo mudada, já que hoje é possível mães solteiras por vontade própria gerar seus filhos sem a necessidade de um companheiro, uma verdadeira monoparentalidade voluntária, desejável.

Nos casos de divórcios ou separações, o fim do relacionamento, segundo dados estatísticos, na maioria das vezes, foi solicitado pelas mulheres, isto é, nos casos das dissoluções, quase sempre as mulheres tomam a iniciativa da decisão de se separar ou se divorciar. Isso mostra certa evolução, já que, atualmente, as mulheres preferem partir para a realidade, lutando contra preconceitos, que ainda existem, - como a de mulher separada, divorciada ou desquitada -, do que ficar na condição de subordinação a situações de difícil sustentação, como por exemplo adultério ou maus tratos.

Há também os casos de término da relação conjugal, devido a total igualdade entre seus membros, sem que haja tanto sofrimento como nos casos anteriores. Normalmente são jovens de classe média, que casam pré-destinados à “separação”, ou melhor, encaram a “separação” como forma de evitar maiores problemas. Casam, mas se não der certo, devido a falta de amor ou por outros motivos, separam.

Ainda ocorrem outras situações que estão entre esses dois casos, são situações intermediárias, meeiras, que não se insere nem num lado, nem noutro. É a situação das mulheres que não desejam se fixar num modelo de família, ou daquelas que não pretendem se entrelaçar matrimonialmente, tratando do casamento um empecilho em suas vidas.

Outro grande fato que contribui com a monoparentalidade é o destaque que a mulher vem dado no mercado de trabalho, até pouco tempo dominado pelos homens. Essa situação também está relacionada, em parte, a não subordinação do sexo feminino ao masculino, a qual não se dispõe mais a viver num modelo de família machista, enquadrada como “dona do lar”, figura exclusivamente materna etc.

Há situações outras que também colaboram com tal modelo de formação familiar, como aquelas mulheres que não se sentem preparadas, ou seguras, pesando a imaturidade para uma vida de casada; existem também aquelas que vêem no casamento apenas rotina, uma vida insuportável etc.

De tudo isso, certeza é que os casos de término de relacionamento conjugal, na sua grande maioria, trazem muitos efeitos negativos e tristes. Muitas vezes a formação da família monoparental significa um “desastre” a mais na vida da criança, que terá que viver, comumente, num incansável duelo entre pais, colocando sua saúde psicológica em risco.

Por fim, colabora com o acréscimo do número de formação familiar monoparental aqueles casos em que pessoas solteiras escolhem constituir uma família a partir da adoção. Tal adoção é prevista no art. 42 do Estatuto da Criança e do Adolescente, no qual independe do estado civil do adotante, tornando-se família aqueles que estavam sós, homem ou mulher, ligados por uma união afetuosa, de respeito e de carinho entre pai, ou mãe, e filho, sendo atribuída a tal família a qualidade de monoparentalidade.

A meta é que a criança seja bem educada, preparada para se viver em sociedade, respeitar a diversidade, crescer feliz, com dignidade, em consonância com os valores e princípios que regem o ambiente que o cerca. Sendo o homem um produto do meio que vive, a família é o melhor meio de se prolatar os ensinamentos que tornem as crianças aptas a viver em sociedade, já que é nela que a criança passa seu maior tempo e os momentos mais marcantes de sua vida. Nesse meio familiar, muito mais tem valor o laço afetivo, que o laço sanguíneo, já que o afeto se passa de forma contínua, bastando haver relação, diferente do sangue. Os laços sanguíneos não deixam com isso de ser importantes também.

A possibilidade das mudanças ora tratadas leva o legislador a observar outras mudanças, como nos novos meios de transmissão familiar. Percebe-se que a formação familiar monoparental não está apenas ligada a uma situação de bioparentalidade, mas trata-se também de uma vontade da pessoa solteira, ou de mães que foram abandonadas na gestação pelo progenitor de seus filhos etc.

5. A ADOÇÃO

5.1. CONCEITO

São diversos os conceitos de adoção, variando conforme as múltiplas interpretações que existem sobre tal instituto. Primus, será tratado o conceito geral, presente no dicionário Aurélio. Secundus, um breve histórico conceitual na história. Tetrius, o significado no mundo jurídico brasileiro.

Para Aurélio Buarque de Holanda[24], adoção significa “ação ou efeito de adotar” e conceitua tal ação da seguinte forma:

Adotar. [do lat. adoptare.] V.t.d. 1. Optar ou decidir-se por; escolher, preferir: “Entre mandar a carta ao destinatário e entregá-la a Sofia, adotou afinal o segundo alvitre” (Machado de Assis, Quicas Borba, p. 183). 2. Seguir, abraçar: Adotou a carreira do pai. 3. Tomar, assumir. 4. Aceitar, acolher, seguir: adotar um conselho. 5. Pôr em prática, em uso; praticar, aplicar: A nova república adotou o regime democrático. 6. Atribuir (a um filho de outrem) os direitos de filho próprio; perfilhar, legitimar. 7. Usar de, ou passar a usar de; tomar, assumir: “Invisivelmente adotei um tom de cerimônia.” (Domingos Monteiro, Contos do Dia e da Noite, p. 18.) T.d.ei. 8. Aprovar; outorgar. Transobj. 9. Admitir, aceitar; reconhecer: Adotei-o por filho; Adotarei a criança como minha neta. 10. Recorrer a valer-se de: Adotou a passividade como defesa. Int. 11. Jur. Tomar por filho; perfilhar, legitimar. [Pret. imperf. ind.: adotava, ...adotáveis, adotavam, Cf. adotáveis, PL. de adotável.]

A adoção no direito romano, em sentido lato, significa colocar uma pessoa sob a pátria potestas, podendo reincidir sobre pessoa alheia (alieni júris), a adoção propriamente dita, ou sobre outra pessoa que tenha capacidade jurídica para praticar, por si, os atos da vida civil (sui júris). A doção propriamente dita é colocar a criança ou o adolescente sobre os cuidados de outra pessoa, responsável pela vida civil, sob outro pátrio poder. É marcada, sendo assim, pela transferência do adotado de pátrio poder, dos cuidados advindos do responsável civil.

Trata-se da medida mais comum de colocar uma criança ou adolescente numa família substituta, onde a convivência mostra-se como um fator de extrema relevância na concessão de tal instituto. Como bem assevera Maria Berenice Dias[25]:

É permitida a colocação de crianças e adolescentes no que é chamado de família substituta, não sendo definida a conformação dessa família. Limita-se a Lei a definir o que seja família natural, não se podendo afirmar que esteja excluída de tal conceito a família homoafetiva. De qualquer modo, diante da definição da família natural, descabe concluir que a família substituta deve ter a mesma estrutura.

O instituto é configurado pelo ato em que a pessoa que adota traz para ele a responsabilidade civil de um indivíduo a ele estranho, passando este a exercer a condição de filho na relação, configurando dessa forma um ato solene e bilateral, que assim o é.

Tal ato exige a condição de bilateralidade, pois a adoção unilateral é imperfeita e discutível, já que a lei assim o exige, requerendo o consentimento dos responsáveis, pais ou outros, da criança ou adolescente a ser adotada. Por tal motivo, muitos doutrinadores comparavam este instituto a um contrato, chegando a tratar o mesmo como tal. Mas como tem casos que a concordância de ambas as partes não é elemento fundamental para se realizar a adoção, onde apenas a manifestação de vontade do adotante é exigida, não há erro drástico nessas hipóteses em considerar tal ação um ato unilateral.

Para Antônio Chaves[26]:

Podemos então defini-la como ato sinalagmático e solene, pelo qual, obedecidos os requisitos da lei, alguém estabelece, geralmente com um estranho, um vinculo fictício de paternidade e filiação legítimas, de efeito limitado e sem total desligamento do adotando da sua família de sangue.

Muitos doutrinadores a consideram como uma hipótese de ficção jurídica, responsável pela criação de um parentesco, o civil, gerando laços paternais, filiação, direitos e deveres decorrentes da mesma, como numa paternidade consangüínea, sem a hipótese de existência natural, ou biológica, dessa relação. É ato jurídico que ocorre entre dois indivíduos, numa ligação civil de paternidade e de filiação.

A jurista Maria Helena Diniz[27], assevera que:

A adoção vem a ser o ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco consangüíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que geralmente lhe é estranha.

Sendo assim, a adoção é um ato tratado pela ordem pública, diante de uma proteção prevista constitucionalmente, com caráter de soberania supranacional, já que na adoção internacional, por exemplo, aplica-se em tal relação a legislação nacional, para melhor proteção do adotado, ao invés das leis estrangeiras.

A Adoção está prevista em muitos dispositivos legais, e é importante citar, em primeiro lugar, a CRFB/88, artigo 227, §§ 5º e 6º, em que se prevê o direito à convivência familiar como um dever da família, da sociedade e do Estado; o direito à dignidade; e ainda o direito ao respeito. Estes direitos também estão previstos no ECA, artigos 17 e 18.

A Constituição Federal brasileira, em seu artigo 227, coloca todas as crianças e adolescentes a salvo de toda forma de destrato, discriminação, crueldade, exploração, violência e opressão, abrindo múltiplas possibilidades para a adoção. O ECA ainda reforça tal idéia em seu artigo 5º ao dizer que “nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

O Código Civil de 2002 discorre sobre o assunto a partir do artigo 1618, em que define que só cidadão maior de 18 anos pode adotar, opondo-se ao ECA, artigo 42, que cita os maiores de 21 anos, e portanto esta lei específica mostra-se desatualizada quanto a esta questão.

Através das definições ora tratadas, verifica-se que tal instituto versa de um ato jurídico bilateral e solene, onde um indivíduo, adotante, estabelece um laço de filiação com outro indivíduo a ele “estranho”, adotado, constituindo com o mesmo, a partir da realização de tal ato, uma relação de parentesco, unido pela afinidade, sem nenhuma dependência natural de procriação.

5.2. AFETO

A palavra afeto vem do latim affectus, cujo significado é afligir, atingir, abalar. Aurélio Buarque de Holanda o considera “um conjunto de fenômenos psíquicos que se manifestam sob a forma de emoções ou sentimentos e acompanhados da impressão de prazer ou dor, satisfação ou insatisfação, agrado ou desagrado, alegria ou tristeza”.

Diversas são as teorias e os enfoques que buscam a compreensão do afeto. Sob o ponto de vista da psicanálise e da psicologia esse leque se abre mais ainda, mostrando a sua pluralidade de entendimentos. Segundo a psicóloga austríaca Melanie Klein (KLEIN, 2005, p. 7), o afeto pode ser compreendido como "núcleos internos atribuidores de significado às vivências e às relações enquanto estas estão ocorrendo."

Quanto a sua organização o psicanalista Luiz Alfredo Garcia-Roza (GARCIA-ROZA, 2005, p. 104) defende que a afetividade está ligada à evolução do libido, ocorrendo em diferentes etapas da vida humana, estudada e denominada por Sigmund Freud como oral, anal, fática, de latência e a fase adulta, chamada genital.

O afeto pode ser entendido como algo extremamente subjetivo, que o homem guarda de forma intrínseca, atribuindo sentidos e significados a própria razão de existir, de forma tal que se construa um estado de psiquismo a partir das relações do mesmo com outros seres humanos.

5.2.1. A nova proteção: o princípio jurídico do afeto

Tema inovador que ultrapassa as barreiras patrimoniais e biológicas, a afetividade como princípio vem sendo debatida cada vez mais por doutrinadores. A verdadeira paternidade deve estar associada em primeiro lugar ao amor, à assistência, e não ao ato de procriação.

Para Paulo Lôbo (LOBO, 2008, p. 48), o princípio da afetividade é previsto constitucionalmente de forma implícita, encontrando-se nela os fundamentos essenciais do mesmo. Trata-se a Carta Maior de escolha afetiva, concedendo à adoção tratamento igual quanto aos direitos, com outra qualquer forma de paternidade. Fica bem claro quando a Constituição[28], em seu artigo 227, parágrafos quinto e sexto, traz o seguinte texto: “A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros” e “os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”. Busca-se, aqui, a proteção da comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, de forma que a família viva com dignidade, observando sempre o menor e o princípio da convivência familiar.

Afirma ainda Paulo Lôbo (LOBO, 2008, p. 48) que:

A afetividade, como princípio jurídico, não se confunde com o afeto, como fato psicológico ou anímico, porquanto pode ser presumida quando este faltar na realidade das relações (...) assim, a afetividade é um dever imposto aos pais em relação aos filhos e destes em relação àqueles, ainda que haja desamor ou desafeição entre eles.

(...)

Por isso, sem qualquer contradição, podemos referir a dever jurídico de afetividade oponível a pais e filhos e aos parentes entre si, em caráter permanente, independentemente dos sentimentos que nutram entre si, e aos cônjuges e companheiros enquanto perdurar a convivência.

O afeto, sem sombra de dúvidas, deve ser tratado como princípio jurídico, já que foi dado um novo viés ao tratamento sobre a sexualidade, valorizando o amor, o carinho etc., como maior justificativa das relações. Sendo assim, o direito das famílias foi instalando uma nova ordem de teor jurídico para a formação familiar, concedendo, desta forma, juridicidade ao afeto.

A liberdade de afeição parece um pouco com a que se vê entre os contratantes. É por isso muitas vezes dá-se para perceber a confusão entre afeição e contrato, onde é visível a tentativa de conceder ao sentimento um caráter patrimonial, contratual. O afeto não deve ser diminuído, no seu sentido conceitual e protecionista, ao conceito do contrato. Tais conceitos podem se misturar, porém não se confundem. Não é que com o fim do afeto, haverá necessariamente um interesse patrimonial entre as partes, que por muitas vezes, não estão interessados no cunho patrimonial da relação. Tal comparação tem um fim positivo, se tratada por um viés, pois a analogia entre tais liberdades são coincidentes quanto a se tratarem de direitos individuais, implícitos na Constituição do Brasil de 1988, onde no seu § 2o do art. 5o , não exclui que, mesmo sem declaração expressa, decorram dos regimes e dos princípios por ela adotados. Fato que ocorre entre essas duas liberdades.

Sobre tal analogia, completa Sérgio Resende de Barros ainda que:

Ambas são inerentes ao relacionamento social. Se negadas – ou tolhidas fora do bem comum – implicam a desfiguração do Estado Democrático de Direito e das liberdades a ele fundamentais. Sonegar essas duas liberdades – ainda que não declaradas expressamente – é renegar ao regime e aos princípios constitucionais do Estado Democrático de Direito exigido pelo art. 1o da Constituição. É negar a Constituição jurídica do Estado brasileiro desde o princípio. Inegável, pois, que – embora afeto não seja contrato – o direito ao afeto, como o direito ao contrato, é liberdade individual implícita na Constituição.

(...)

O afeto está presente nas mais diversas relações humanas. Destacadamente, nos relacionamentos de natureza sexual, nos quais, atualmente, o Estado brasileiro deixou de respeitar a vontade dos indivíduos, quanto à definição do alcance do afeto nascido entre eles. Para celebrar ou criar uma relação, inclusive para fins patrimoniais, pode-se casar ou tornar evidente uma união estável. Mas ninguém pode optar por simplesmente viver um vínculo afetivo independente da intervenção estatal, vale dizer, sem seqüelas de ordem patrimonial. A patrimonialização da união estável é forçada – e reforçada – pela legislação estatal. O que solapa o vínculo afetivo. Amedronta os que só querem se amar. Gera expedientes – como: "fazer um contrato", "não morar juntos", "evitar manifestações de afeto por escrito", etc. – para não tipificar união estável.

A grande luta, atualmente, está focada na despatrimonialização do Direito Civil, onde a pessoa passa a ser o principal ponto a ser tutelado, já que antes era o patrimônio. Dessa forma, a família é um dos principais lugares de realização do indivíduo, já que é nela que o homem vive suas primeiras relações, tendo seus avanços e desempenhos pessoais, para só depois viver em sociedade, interagindo com a mesma.

A família e o Direito passam por mudanças extremamente importantes. A chamada “comunidade de sangue”, começa a ceder espaço para a “comunidade de afeto”, possibilitando novos meios de formação familiar, ampliando o Direito de Família, ramo que passa a sediar todo o valor do afeto, tornando-se o meio de relações interpessoais, um verdadeiro intercâmbio de gente, que busca nada mais que a felicidade. É o sangue a afeição trabalhando conjuntamente, um oxigenando o outro, mostrando que o respeito e a tolerância é a melhor forma de se conviver num espaço cultural, de divergências presentes, mas compreendidas.

O afeto, ao ser reconhecido juridicamente, traz consigo alguns efeitos sobre toda a legislação civil: seja no estabelecer comunhão de vida no casamento (CC, art. 1.511); ao admitir outra origem à filiação, que não a do parentesco natural e civil (CC, art. 1.593); ao consagrar igualdade entre os filhos (CC, art. 1.596); ao tratar da filiação de forma irrevogável (CC, art. 1.604); ao tratar do casamento e da dissolução, de forma mais pessoal que patrimonial (CC, arts. 1.511 e seguintes e 1571 e seguintes) etc.

O afeto também se insere na Lei Maria da Penha, Lei n o 11.349/2006, que regulamenta sobre a violência doméstica, como no seu art. 5o, III, que diz: “em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação."

Por fim, o afeto também está inserido no Projeto de Lei no 2.285/2007, de autoria do Instituto Brasileiro de Direito de Família, IBDFAM , no seu art. 5o, que objetiva instituir o “Estatuto das Famílias”, esclarecendo a importância do afeto e mostrando que o mesmo é peça-base na formação das famílias, ao tratá-lo como princípio, ao lado de outros princípios norteadores como o da dignidade da pessoa humana, da solidariedade familiar, da igualdade de gêneros, de filhos e das entidades familiares, da convivência familiar e do melhor interesse da criança e do adolescente.

5.3. HISTÓRICO

A adoção teve sua origem na Antiguidade como forma de dar continuidade ao culto doméstico. Foi muito utilizada entre povos orientais, como se pode observar nos códigos de Manu e o de Hamurabi. A sociedade grega teve seu uso de forma habitual, objetivando perpetuar o culto familiar pela linha masculina (sociedade patriarcal), ou, se ocorresse o falecimento do pater familias, não havendo herdeiro, seria um indivíduo que fosse capaz de dar prosseguimento aos cultos oferecidos aos deuses-lares, onde a o ato da adoção supria a necessidade da falta de um membro masculino.

O texto bíblico também traz casos de adoção feita pelos hebreus. Entretanto, foi no direito romano que tal ato foi difundido, sendo disciplinado por um ordenamento jurídico sistemático, onde o chefe de família sem herdeiros podia adotar como filho um menino de família estranha à sua. O adotado tinha o direito de usar o nome do pai adotivo e o direito de herança. O princípio que serve como base, fundamento do instituto da adoção na Antiguidade, o qual foi observado pelo Direito Civil na atualidade, era o adoptio naturam, o qual afirmava que a adoção não deveria se distanciar da filiação natural, aquela decorrente do ato da procriação, da consangüinidade.

O período da Idade Média foi fortemente influenciado pelo Direito Canônico. Tal Direito considerava como cristãs, apenas as famílias que fossem unidas por laços matrimoniais, isto é, pelo casamento. Com tal posicionamento, a adoção passou a não ser mais usada, até seu desaparecimento em tal sociedade. Mas com a grande Revolução Francesa a adoção voltou a ser tratada, sendo, de forma reflexiva, explanada pelo Código do imperador Napoleão, em 1804, de forma expressa. Como é de fácil conhecimento, já que é tão visível tais influências, a legislação brasileira muito bebeu da legislação francesa.

O Código Civil de 1916 prevaleceu de forma única no Brasil durante muitos anos, um modo de adoção que tinha como prerrogativa dar filhos aos casais que não os podia ter, sem se preocupar muito com os direitos dos filhos adotivos, até a chegada da Constituição Federal de 1988 e, posteriormente o Estatuto da Criança e do Adolescente que busca o melhor interesse da criança e do adolescente prevalecendo os direitos destes, acima de qualquer outro.

Os dois sistemas de adoção que regem até o Novo Código Civil, dispunham de princípios tão diferentes, que defini-los sob o mesmo foco praticamente se torna muito difícil. O Código Civil de 2002 também traz disposições sobre a adoção, no entanto, não revoga, expressa ou tacitamente a Lei n.º 8.069/90, o que certamente ocasionará algumas divergências de interpretação.

5.4. ADOÇÃO NO CÓDIGO CIVIL DE 1916

O Código Civil brasileiro de 1916 versava sobre a adoção em seus artigos 368 a 378, chamada de adoção simples pelos efeitos que gerava. Nesse documento, a adoção se dava através de escritura pública, não tinha interferência judicial. O filho adotivo não quebrava o elo com sua família biológica, podendo até continuar com o nome originário, assim como com os direitos e deveres alimentícios face aos pais consangüíneos.

As normas presentes no antigo Código Civil continuaram sendo aplicáveis àqueles maiores de 18 anos, mesmo após a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que regula a adoção das pessoas menores de idade, extraordinariamente, elastecendo a normatização do determinado estatuto às pessoas de até 21 anos de idade, se o adotando já obtinha a guarda ou tutela do requerente.

O fim da adoção, dependendo da situação, poderia acontecer após um ano de atingir a maioridade do adotado ou acabada sua interdição. Poderia também acabar com o contrato por conveniência das partes, um destrato com efeito ex nunc, ou nos casos em que fossem autorizadas a deserção.

5.5. ADOÇÃO NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988

Ao tratar dos direitos sociais no seu artigo 6º, a Constituição Federal de 1988, trata da maternidade e da infância como direitos que a pessoa tem em seu desenvolvimento, de caráter fundamental. Mas, é no art. 227, parágrafos 5.º e 6.º, que passa-se a tratar dos princípios básicos que visam tutelar a criança e o adolescente no que se refere a adoção. Estes princípios versam sobre a fiscalização que se deve ter realizada pelo Poder Público, referentes às condições que seja efetivada a “entrega” da criança ou o adolescente nas mãos do adotante, com o intuito de afastar futuros problemas com o adotado, como o tráfico de crianças. Preocupou-se também o legislador constituinte com o tratamento dado aos filhos adotados, proibindo qualquer distinção entre os filhos adotados e os filhos biológicos, concedendo-o igualdade nas questões alimentícias, sucessórias, aos direitos personalíssimos, dentre outros, com ressalva dos impedimentos matrimoniais, que são mais abrangentes, v. g., o adotado fica impedido de casar-se com seus pais biológicos e com seus pais adotivos.  

Trata-se de natureza civil o vínculo que une pais a filhos, já que a relação que ocorre entre eles é disciplinada e determinada por lei. Atualmente a Constituição Federal versa sobre a família nos seus artigos 226 e seguintes.

De forma mais afinada, o texto do artigo 227 da Lei Maior, no seu parágrafo 5º diz que: “A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte dos estrangeiro”. Extrai-se daí que não há menção distintiva entre os tipos de adoção.

A leis que, hodiernamente, melhor estabelecem e normatizam esse parágrafo é a Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente em seus arts. 39 a 52 e o Código Civil de 2002, arts. 1.618 a 1.629.

5.6. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

O Estatuto da Criança e do Adolescente, juntamente com o princípio da proteção integral à criança e ao adolescente, trata os seus sujeitos beneficiários como seres merecedores de garantias especiais, um verdadeiro sujeito de direito, distinguindo, portanto, do Código de Menores que tratava os mesmos como objetos de direito. São vários os direitos garantidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo um dos principais direitos, fundamental diga-se, o direito que a criança tem de ser criado num bojo familiar, seja ela natural ou substituta. Neste último caso, encontra-se a adoção, de caráter irrevogável e excepcional, onde atribui-se a condição de filho à pessoa adotada, conferindo-lhe todos os direitos e deveres ligados à filiação, com exceção dos impedimentos matrimoniais.

Para que a criança seja colocada para a adoção, faz-se necessário que os pais ou o seu representante legal estejam de acordo com tal ato. Caso os pais estejam destituídos do poder familiar ou forem mortos, tal medida só será efetivada se for comprovada as vantagens reais que trará ao adotando e fundar-se em motivos legítimos.

A lei que trata de tal estatuto é a de nº 8.069. Nela, em seus artigos 39 a 52, é determinada os procedimentos que devem ser tomados por aqueles que têm vontade de adotar. Destaca-se aqui, que tal legislação trata tanto dos adotantes nacionais, quanto dos adotantes internacionais, desde que domiciliados e residentes no Brasil. Trata-se de uma imagem refletida da CF de 1988, que assegura a igualdade a todos que aqui residem. É lícito que aqueles brasileiros que moraram no exterior, gozam de igual proteção, tendo o mesmo direito daqueles que encontram-se residentes no país.

5.6.1. Princípio do melhor interesse da criança e do adolescente

Ao falar em adoção muito se tem focado no mundo dos adotantes, suas condições psicológicas, financeiras, espirituais etc.. Mas a adoção deve se ater a um importante e imprescindível princípio, o do melhor interesse da criança e do adolescente, que traz a ótica o interesse do adotado, como foco principal de tal instituto.

Percebe-se com tal princípio a predominância do interesse da criança ou do adolescente no que tange aos direitos. Aos pais, predominam-se os deveres, devendo eles, ates de mais nada, procurar as formas de realização da felicidade de seus filhos, não podendo os mesmos impor suas condições de felicidade aos adotados.

É lícito verberar que tal interesse tem prioridade, porém não pode deixar de ser, em parte, limitado, de forma que seja garantida uma boa educação ao adotado, num processo de desenvolvimento contínuo.

A substância que compõe tal princípio, o do maior interesse da criança e do adolescente, foi originada no instituto “parens patriae”, que tinha como foco a proteção conferida às pessoas indefesas, que não tinham como se proteger, pelos Reis e pela Coroa.

O princípio do maior interesse da criança e do adolescente teve seu grande destaque internacionalmente com a Convenção de Genebra em 1924. Desde 1958 que a Declaração Universal dos Direitos da Criança já obrigava que fosse observado pelas leis tal princípio, entretanto o mesmo só foi aprovado em 1989 pelas Nações Unidas, com a Convenção Internacional dos Direitos da Criança, dando maior abrangência, inclusive, ao princípio em questão. Atualmente, o mesmo deve ser observado não só pela legislação, mas também em qualquer ato que se refira ao interesse dos menores. Tal Convenção foi ratificada pelo Brasil por meio do Decreto nº 99.710/90.

Neste sentido, Heloísa Helena Barbosa[29] diz que:

Desse modo, foram reconhecidos no âmbito internacional direitos próprios da criança, que deixou de ocupar o papel de apenas parte integrante do complexo familiar para ser mais um membro individualizado da família humana que, em virtude de sua falta de maturidade física e mental, necessita de proteção e cuidados especiais, inclusive da devida proteção legal, tanto antes quanto após o seu nascimento. (...) Se é certa hoje a existência do que se pode denominar direitos fundamentais da criança, não menos certo é que se a efetividade de tais direitos esteja incluída na preocipação atual dos estudiosos do tema.

Vide o artigo 9º, item 03, da Convenção Internacional dos Direitos da Criança:

(...) que os Estados Partes devem zelar para que a criança não seja separada dos pais e que deverá ser respeitado o direito da criança que esteja separada de um ou ambos os pais de manter regularmente relações pessoais e contato direto com ambos.

A Constituição Cidadã trouxe intensas modificações no que tange à criança e os adolescentes e a jurisdição, abrangendo muitos dispositivos internacionais, seja quanto aos direitos humanos ou quanto à estruturação da sociedade do Estado. Ao trazer os direitos humanos, compara aos mesmos os direitos referentes às crianças e adolescentes, de modo que os deixam inalienáveis e enaltecidos, obrigando o Estado a promover o respeito dos mesmos, de forma que não seja fragmentada sua aplicação.

O art. 227, caput, da Constituição Federal de 1988 atribui à família, à sociedade e ao Estado assegurar à criança e ao adolescente, de forma prioritária, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de afastá-los de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

A idéia do melhor interesse da criança e do adolescente refere-se a uma cláusula geral, já que possui um matéria muito vasta. Dessa forma, cabe aos juízes aplicá-la visando o caso concreto, se atentando as necessidades a partir de uma prévia análise dos fatos. Tal subjetividade pode muitas vezes trazer problemas, já que o juiz carrega em si experiências e valores que, muitas vezes, não acompanham o pensamento e a evolução social, como no caso das pessoas solteiras que pretendem adotar (adoção monoparental).

Entretanto, é lícito verberar que os dados dos adotantes é que devem, de fato, serem analisados, mostrando se são capazes ou não para adoção e se possuem estrutura emocional e material para o sustento da criança. Mesmo diante de tamanha abstração normativa, o magistrado não pode esquecer de cumprir com seu compromisso com a verdade e com busca do melhor interesse do adotando. Devem também os aplicadores da lei procurar formas objetivas das interpretações, para facilitar sua concretização, resolvendo dois casos, que é assumir a criança e o adolescente como sujeitos de direito e auxiliar a aplicação do princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.

Reiterando, apesar de não ser expresso em tal ordenamento jurídico, cabe aos juízes definir, por meio da discricionariedade, quais os possíveis interesses da criança e do adolescente, já que os mesmos não encontram-se de forma explícita, ou normatizada. Tal decisão exige um pouco a mais dos juízes, trazendo um pouco o caráter subjetivo a esta decisão, já que se trata de um interesse de difícil determinação, ou definição, não normatizado e que envolve uma variedade enorme de valores, comportamentos e vivências, que serão definidas de acordo com o melhor entendimento do juiz.

O professor Luiz Edson Fachin, ao tratar de tal princípio, traça alguns pontos a serem respeitados no momento de decisão, na aprovação ou não, das adoções pelos juízes. São eles:

- o amor e os laços afetivos entre o pai ou o titular da guarda e a criança; - a habitualidade do pai ou do titular da guarda de dar à criança amor e orientação; - a habilidade do pai ou titular da guarda de prover a criança com comida, abrigo, vestuário e assistência médica (os chamados alimentos necessários); - qualquer padrão de vida estabelecido; - a saúde do pai ou titular da guarda; - o lar da criança, a escola, a comunidade e os laços religiosos; - a preferência da criança, se ela tem idade suficiente para ter opinião; - a habilidade do pai em encorajar contato e comunicação saudável entre a criança e o outro pai.

Tal regulamentação ainda tem respaldo na Lei n. 8.069/90, mais conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente. O art. 3º do ECA diz que às crianças e aos adolescentes são conferidos todos os direitos fundamentais, essenciais ao ser humano, sem que haja danos à sua proteção integral, sendo garantido por diversos meios, como as leis, condições que possibilitem um desenvolvimento moral, psicológico, espiritual,  social e físico, respeitando a plena liberdade e a dignidade da pessoa humana.

Não há o que se questionar que as ânsias das crianças e dos adolescentes devem ser privilegiadas diante dos interesses dos adotantes. Como bem assevera o art. 43 do ECA, que assegura que “a adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos”. Bem como o art. 1.625 do Código Civil de 2002 ao dizer que “somente será admitida a adoção que constituir efetivo benefício para o adotando”.

O desejo do adotando sempre deve ser colocado em questão, através de consultas, pelo juiz e por toda a equipe que acompanha a adoção, como bem explicita o art. 28, §1º, do ECA. A tomada de depoimento da criança ou do adolescente ajuda no processo decisório dos magistrados, no que se refere ao melhor interesse do mesmo.

Outro ponto deve ser observado, no que se refere ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, que é o direito que querem os adultos sobre as crianças, como se estas fossem um objeto a ser tutelado pela justiça, ao ser conferida a “titularidade” a alguém. É fácil a percepção que muitos advogados ainda pleiteiam ações visando mais o reconhecimento social da adoção e o interesse unilateral do “pai”, do que no bem estar da criança ou do adolescente.

Neste sentido, vide julgamento do Tribunal de Justiça do Amapá:

EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO RESCISÓRIA - ADOÇÃO - PRESERVAÇÃO DE VÍNCULO E DO PODER FAMÍLIAR - NULIDADE DE LAUDO PSICO-SOCIAL - SUSPEIÇÃO - NÃO OCORRÊNCIA - CURADORIA DE INCAPAZES - MINISTÉRIO PÚBLICO - NÃO EFETIVADA - NULIDADE RELATIVA - PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE - PREVALÊNCIA DO INTERESSE DA MENOR ADOTADA - ART. 6º DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - AÇÃO RESCISÓRIA JULGADA IMPROCEDENTE. 1) Não há que se falar em nulidade da sentença pela alegação genérica de suspeição das Assistentes Sociais que, através de laudos e estudos psico-sociais, concluíram pela pertinência do processo de adoção, mesmo porque os relatórios e estudos levantados durante a instrução dos autos não constituíram o fundamento exclusivo da decisão. 2) Na colocação de criança ou adolescente em lar substituto há que se considerar, quando possível, o grau de parentesco, a relação de afinidade ou de afetividade a fim de se evitar ou minorar as conseqüências decorrentes da medida, devendo, contudo, independente da existência de pessoa da família interessada na adoção, prevalecer os interesses peculiares ao menor adotando como pessoa em desenvolvimento na esteira do art. 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente; 3) A proteção integral nas questões envolvendo crianças e adolescentes há que ser perquirida independentemente de laços familiares; 4) A falta de intervenção do Ministério Público na qualidade de curador de incapazes, tão-somente na peculiaridade destes autos, não acarreta a nulidade processual eis que desempenhado o munus pela Defensoria Pública, notadamente quando por várias vezes o representante do parquet tenha se manifestado nos autos sem alegar qualquer nulidade; 5) Ação rescisória julgada improcedente. TJAP, Secção única, Desembargador MELLO CASTRO, julgamento 24/02/2005, DOE 3492, página(s) 17 de 05/04/2005.

A partir de tal jurisprudência, fica claro que a adoção passa a abarcar novos critérios, adquirindo um novo sentido, onde o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente é preponderantemente respeitado e aplicado diante das demais regras normativas e de outros princípios norteadores do ordenamento brasileiro.

As crianças e os adolescentes devem ter preservados o direito de viver num bojo familiar, de participar de uma entidade que o propicie o amor, o carinho, os desenvolvimentos mentais, o sustento etc.. Recusar o pedido de adoção pela mera monoparentalidade é extremamente desrazoável, devendo tal decisão possuir outros fundamentos da recusa, que afrontem o melhor interesse da criança e do adolescente.

Desse modo, em conformidade com o princípio ora tratado, a impugnação da adoção, que tira do adotante o desejo de ser “pai”, deve ser devidamente fundamentada, mostrando as incompatibilidades presentes na adoção, ou que o bojo familiar é inadequado para a criança ou para o adolescente, sem nenhuma dependência, é claro, do seu estado civil.

A monoparentalidade não é causa que afaste a adoção, tirando do indivíduo a possibilidade da paternidade ou maternidade. O potencial aqui referido trata-se da garantia de promover à criança condições materiais e não materiais, que tragam à mesma um conforto físico e psíquico, num ambiente de aconchego e calmaria.

Reverberar que tanto a monoparentalidade, quanto às famílias tradicionais, podem cometer atos que atinjam a estrutura psíquica, moral e física do adotando, causando danos ao mesmo, é uma verdade. Quando houver esses casos, os mesmos devem ser investigados de forma que não haja alguma ligação entre outros casos acontecidos e havendo incapacidade do adotante que seja impedida a adoção.

È bom lembrar também que não há impedimentos de caráter psicológico, nem mais social, a ponto de justificar a não adoção pelo simples fato da monoparentalidade. Mesmo assim ainda existem juízes, que por seguir linhas tradicionais, dificultam a adoção por pessoas solteiras, com a fundamentação de estar protegendo o pupilo. Confere-se daí o tratamento desigual dado, de forma que prive pessoas que estão cheia de amor de perpetuar seu afeto.

Além do mais, está de forma bem clara no ECA a possibilidade de pessoas solteiras adotarem, sem haver nenhuma restrição aos interessados. Não poderia ser tratado de forma diferente, já que trata-se de um ato normalmente tomado por muitas pessoas na sociedade brasileira. O direito ir de encontro a essa prática seria uma verdadeira retroação aos costumes sociais e a muitos princípios que regem o mesmo, além de se mostrar de forma incongruente com um a possibilidade de resolução de um grande problema social, a fila enorme de crianças na espera por um pai ou uma mãe.

5.6.2. Princípio da convivência familiar

Todas crianças e todos adolescentes são portadores de direitos fundamentais especiais, isto é, além de ser garantidos os direitos fundamentais referentes aos direitos individuais e sociais previstos na Constituição Federal nos seus artigos 5º, 6º e 7º, é conferido aos mesmos direitos específicos, distintos dos direitos dos adultos.

Dentro desses direitos está o da convivência familiar, podendo ser observado tanto no Estatuto da Criança e do Adolescente, quanto na Carta Maior de 1988. A convivência familiar é, não apenas, um princípio, como também um direito fundamental assistido a todas as crianças e adolescentes.

Num primeiro momento, diga-se no Código Civil de 1916, tal direito era tratado como conseqüência do exercício do pátrio poder, durante a existência do casamento. A figura do pai e os interesses do grupo familiar eram quem predominantemente detinham a tutela. O direito da convivência familiar significava, em suma, a manutenção dos filhos na guarda e companhia dos pais. Sempre a tutela era concedida à figura paterna.

A partir de algumas alterações ocorridas no século XX, a estrutura familiar passou a absorver os impactos sociais, levando ao maior reconhecimento dos “sujeitos”, juntamente com a capacidade afetiva que cada um desses levavam consigo, deixando de lado a predominância da figura paternal. Dessa forma, cada sujeito passou a ser visto de forma individual e com especial respeito, de modo que fossem sempre valorizadas as relações afetivas no bojo familiar, num processo chamado de repersonalização dos direitos, fundamentado na dignidade que cada pessoa humana carrega em si. Isso fez com que parte do caráter patrimonialista do Direito Civil fosse deixado de lado, já que a proteção maior era dada a pessoa humana, como sujeito dotado de dignidade, em vez do sujeito patrimonial, o capaz de manter economicamente a família (chefe familiar).

Tal convivência é prevista no art. 227 da Constituição Cidadã, que atribui não só à família, mas também a toda a sociedade, o dever de garantir tal direito às crianças e adolescentes, seguindo os ditames da proteção integral, adotada como doutrina no Brasil.

Toda pessoa, na sua infância, tem o direito de viver num abiente familiar, dotado de afeto e respeito. Trata-se de uma necessidade inerente a vida humana, já que é na família que se desenvolvem muitas das capacidades dos indivíduos, além de ser na mesma o ponto de apoio e conforto para cada ser, o seu forte. Além disso, tal convívio é de extrema importância para a saúde psicológica da criança, já que se trata de fortes vínculos afetivos, os mais importantes, diga-se.

Ao atribuir à convivência familiar o status de direito fundamental, a CF de 1988 criou o art. 226, caput, que trata a família como base da sociedade. De forma enfática, meio de reafirmar o que já fora tratado pela Constituição Federal do Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente tratou do tema de forma bem clara num capítulo específico, constando trinta e três artigos. No art. 19 do mesmo estatuto, que inicia o capítulo III, diz que “toda criança e adolescente tem direito a ser criado e educado no seio de sua família (...)”.

Uma importante convenção, que versa sobre os direitos referentes às crianças, a das Nações Unidas, de 1989, também versou sobre a importância da convivência familiar. Veja-se:

(...) Convictos de que a família, elemento natural e fundamental da sociedade e meio natural para o crescimento e bem-estar de todos os seus membros, e em particular das crianças, deve receber a proteção e a assistência necessárias para desempenhar plenamente o seu papel na comunidade;

Reconhecendo que a criança, para o desenvolvimento harmonioso da sua personalidade, deve crescer num ambiente familiar, em clima de felicidade, amor e compreensão;

Considerando que importa preparar plenamente a criança para viver uma vida individual na sociedade e ser educada no espírito dos ideais proclamados na Carta das Nações Unidas e, em particular, num espírito de paz, dignidade, tolerância, liberdade, igualdade e solidariedade; (...)[30]

A criança tem seus pensamentos, suas atitudes, seus costumes etc., mutáveis e a família é o principal centro de moldagem psicológica das mesmas, onde a figura dos pais e dos demais membros mostram-se de extrema necessidade para a formação daquele ser. É necessário que cada pai ou mãe tenha a consciência do que, de fato, significa a convivência familiar, não tornando tal relação um contato meramente doméstico, onde dois seres coexistem e habitam um mesmo espaço, sem nenhuma relação de carinho e amor.

A nova roupagem dada à família, pela CF de 1988, atribui à figura dos pais um dever não só de sustento, de pagamentos de contas etc., mas também traz o dever de dar sustento psicológico e afetivo à criança e ao adolescente. Afinal, se contrário fosse, não haveria uma constituição familiar real. Pais teriam seus filhos, de forma integral, em orfanatos, escolas, creches etc. e a relação saudável entre os mesmos, de conselhos, de carinho e de respeito, inexistiria.

Enfim, assegurar tal princípio e direito fundamental é respeitar a construção da personalidade da criança e do adolescente, além de resguardar sua dignidade. Nos casos de inobservância de tais cumprimentos, deparar-se-á com uma total irresponsabilidade, no que tange ao desenvolvimento psicológico dos menores, afetando seu lado afetivo e moral.

5.7. ADOÇÃO NO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO DE 2002

O Código Civil de 2002 fala sobre a adoção nos artigos 1.618 até o 1.629. Desde a sua promulgação tal diploma trata sobre o instituto de forma genérica, dificultando a melhor interpretação do mesmo, deixando, mais uma vez, nas mãos da jurisprudência o papel da inovação e do reconhecimento de direitos ocultos, mas existentes.

Para a classe doutrinária, a Lei 8.069 de 1990, tratado anteriormente e que versa sobre direitos relacionados à criança e ao adolescente, não foi revogada por este ordenamento jurídico, devendo ser aplicada nas questões em que não entrar em confronto com este diploma normativo. Na prática, pode-se falar do caso da maioridade que se atinge ao chegar aos 18 anos, onde a pessoa se torna capaz para todos os atos da vida civil, e que o Estatuto faz menção aos 21 anos de idade.

Tal Código deve ser analisado mais precisamente quanto a capacidade para haver a adoção, presente no seu artigo 1.618, que baixou a idade do adotante de 30 para 18 anos. Deve-se observar também que é estipulado no texto normativo, do diploma em questão, a diferença etária mínima que deve existir para que seja possível a adoção, que é de 16 anos, como tratada no Código Civil anterior, reafirmada no Estatuto da Criança e do Adolescente. Tem-se aqui a vontade do legislador de tentar, no máximo, comparar a família substituta à biológica.

De acordo com a última Constituição brasileira, que versa sobre a família no art. 226 e parágrafos, é possibilitado ao casal, formado por homem e mulher, sem qualquer dependência de matrimônio, a adoção, bastando que um dos seus membros tenha conseguido preencher os requisitos necessários, cobrados em lei, como idade mínima de 18 anos etc. quanto à família formada pela União Estável, há uma cobrança maior, já que há a necessidade de que seja comprovada uma certa estabilidade familiar.

O atual ordenamento civil possibilita também a adoção unilateral, isto é, que o cônjuge ou companheiro possa adotar a prole do outro, sem que o pai ou a mãe perca seu poder familiar. Em outras palavras, o cônjuge ou o companheiro irão alçar o status da paternidade, sendo constituído, dessa forma, de poder familiar.

Outra novidade trazida pelo Código Civil refere-se à exigência que haja contraditório no processo de adoção, que com a presença de sentença judicial e trânsito em julgado, torna-se irrevogável. É bom ressaltar que tal prática já era prevista, em parte, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Com tal “inovação” foi enterrada de uma só vez a possibilidade, que existia com a vigência do Código Civil de 1916, que permitia que tal instituto se realizasse através de escritura pública e que fosse revogável, quando o adotado atingisse sua maioridade.

Quanto ao vínculo familiar existente com a família de sangue, com o novo Código, o mesmo era rompido, salvo nos casos dos impedimentos referentes ao casamento, onde o mesmo não poderia se casar com sua mãe de sangue, por exemplo. Além do que já foi discorrido, o filho adotado teve garantido todos os direitos alimentícios e sucessórios, bem como os deveres referentes à filiação, já que com a Constituição de 1988, obriga o tratamento de forma igual entre os filhos, seja eles adotados ou não.

Há em tal Código, entretanto, uma inobservância, referente à adoção por ascendentes e por irmãos. Caso que é facilmente sanado pela jurisprudência nacional, que visa a pacificação das contradições existentes, passadas de forma omissa pelos legisladores.

5.8. ADOÇÃO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES POR PAIS SOLTEIROS

No Direito o que determina o estado civil é a situação em que a pessoa encontra-se em relação a questão matrimonial, ou sociedade conjugal.  Segundo as normas brasileiras os possíveis tipos de estados civis são: solteiro, casado, separado judicialmente, divorciado, viúvo e aqueles que vivem uma união estável.

A palavra solteiro é oriunda do termo em latim solitariu e significa solitário, isolado ou que vive só. Tal palavra acabou por designar aquelas pessoas que ainda não encontram-se casadas. Apesar da origem da palavra, ser solteiro não significa estar em estado de solidão sempre, e veremos que essa idéia desse sentido-origem não se aplica neste trabalho. São meras inconveniências da evolução fonética da palavra.

Nos dicionários facilmente encontra-se o conceito de solteiro como aquele que ainda não casou, aquele carecente, ou carente, falto; podeendo ser considerado também aquelas pessoas que, apesar de casada, estão com seus cônjuges distante, ou ausente; e ainda aqueles que não encontram-se casados, nem separados, nem “desquitados”.

 Ao contrário do que muitos pensam, pessoas solteiras, homens ou mulheres sem nenhuma distinção, podem ser adotantes. O maior empecilho relaciona-se com o preconceito da sociedade tradicional, que insiste em acreditar num único modelo familiar, onde encontram-se presentes pais, mães e filhos.

Homens e mulheres solteiras estão cada vez mais buscando a realização de um sonho que anteriormente ligava-se apenas à gestação ou à questão matrimonial. Ter filho independente do casamento é uma realidade cada vez mais presente na sociedade brasileira.

No dia 11 de julho de 2001 a revista Veja trouxe a tona vários casos de adoção, dentre eles foi relatado o caso de Agnelo B. Pereira, professor, solteiro, que adotou uma criança cheia de doenças, como sarna, vermes e diarréia crônica. O ponto mais interessante que, inclusive, foi lembrado na sentença pelo juiz Dr. Siro Darlan, era o fato que o adotante educava inúmeras crianças no colégio que trabalhava. Ora, se Agnelo tem capacidade para educar várias crianças, mostrando-se responsável pelas mesmas, por que não poderia ser responsável pelos cuidados do seu próprio filho, apenas por ser solteiro e homossexual? Agnelo deu um depoimento à mesma revista, veja-se:

Conheci meu filho em um orfanato do Rio, em meados de abril de 1997. Já na primeira visita, aquele menino franzino, de apenas 1 ano e 6 meses, me chamou a atenção. Foi amor à primeira vista. Lembro-me de tê-lo tomado nos braços e dizer: ‘Eu vou mudar a sua vida e você vai mudar a minha’. Quando o conheci, sua certidão registrava apenas o nome da mãe. Pai, desconhecido. Hoje ele é filho de Angelo Barbosa Pereira e mãe desconhecida. Faz quatro anos que ele chegou e posso garantir que minha qualidade de vida melhorou. Não acho relevante o fato de eu ter orientação homossexual. Não vejo diferença entre mim e outros pais. Um pai não é homossexual, nem heterossexual, nem médico, nem bicheiro, nem nada. Pai é pai e nada mais. Minha sexualidade nada tem a ver com a dele. Se um dia ele perguntar com todas as letras, responderei com todas as letras. Não há bondade na adoção. É ato de amor ou não é nada. Se falo sobre isso abertamente, é para incentivar outras pessoas a fazer o mesmo.[31]

Na adoção independe se a pessoa é solteira, casada ou está em união estável, já que a regra não traz nenhuma especialidade quanto à condição do estado civil em que se encontra o adotante. Solteiros podem adotar, pois o CC, ao tratar da adoção, não faz referência alguma ao estado civil da pessoa, somente da idade mínima para pleitear a adoção.

A adoção por pessoa solteira é uma realidade, um verdadeiro compromisso que o adotante se propõe, que pode mudar a dura realidade de milhares de crianças que encontram-se em orfanatos e abrigos em todo o país. Hodiernamente, a não normalidade se encontra com aqueles que não querem reconhecer os novos modos de formação família, os novos meios de concretização da família. A família adotiva é marcada fortemente pelo afeto e pelo carinho, em vez de laços já conhecidos de outras épocas. A adoção, em regra, é um ato planejado, querido, o que muitas vezes não ocorre na filiação biológica, onde mães concedem filhos não desejados, frutos da irresponsabilidade, do descuido, por exemplo.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por fim, fica claro que por explícita afirmação do texto legal presente no Estatuto da Criança e do adolescente, qualquer pessoa independentemente do estado civil pode adotar, desde que seja capaz. Por mais inquietante que seja para parte da doutrina, a tradicional, tal modo de adoção, referente à monoparentalidade, deve observar, em suma, o interesse do menor e de outros princípios que regem tal instituto, fechando os olhos para o preconceito e o amadurecimento estagnado.

O Estatuto da Criança e do Adolescente considera como família natural, a família formada por qualquer dos pais e seus descendentes. A adoção por solteiro constitui uma alternativa justa e digna, além de ser solucionadora de grandes problemas sociais, quebrando com as discriminações que existiam contra as famílias monoparentais. Afinal, preferível é ter um dos pais, para aconselhar, dar afeto, dar sustento material etc., do que não ter nenhum e passar anos penando, esperando um modelo de família perfeito, aos moldes tradicionais.

Sabe-se que a interminável espera pela adoção por um casal, faz com que crianças e adolescentes permaneçam numa instituição, onde ao completar sua maioridade, são postas para fora do recinto, lugar este que passaram toda a vida a espera daqueles que possibilitassem a doação do amor. Ao sair de tal local, são despejados, onde sem lar, muitas vezes são levados a cometer vícios sociais, roubando, traficando, matando etc., e no fim, sendo mortos ou presos pela polícia.

Todos aqueles que podem oferecer afeto, sustento e educação a uma criança, podem adotar, independente de orientação sexual, estilo de vida ou outras coisas. Devem ser levados em conta, principalmente, o bem-estar e o interesse do adotado, tendo fundamental importância no processo de adoção, mostrando-se como elo fundamental na filiação adotiva.

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[1] CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário; p. 25.

[2] MICHAELIS. Moderno Dicionário da Língua Portuguesa.  São Paulo: Melhoramentos, 1998, p. 1697.

[3] REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 304.

[4] SILVA, De Plácido. Vocabulário Jurídico. 18ª  ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 639.

[5] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de direito administrativo. 3.ed. São Paulo, Malheiros, 1992, p.230.

[6] IDEF – INSTITUTO INTERDISCIPLINAR DE DIREITO DE FAMÍLIA (Coord.). Homossexualidade: Discussões Jurídicas e Psicológicas. P. 131/132.

[7] Disponivel em:

[8] Gustavo Tepedino. Temas de Direito Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 327.

[9] ÁVILA, Humberto. A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade. In: Revista de Direito Administrativo. (215): 151-179. Rio de Janeiro: Renovar, jan./mar. 1999.

[10] FACHIN, Luiz Edson. Direito de Família: Elementos críticos à luz do novo Código Civil brasileiro. 2ª ed. ver. e atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 51.

[11] NAZARETH, Eliana Riberti apud PEREIRA, Rodrigo da Cunha, op. cit., 2005. 

[12] LÔBO NETTO, Paulo Luiz. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre: Síntese, IBDFAM, 24 mar. 2004.

[13] IBIAS, Delma Silveira. Aspectos jurídicos acerca da homossexualidade. In: INSTITUTO INTERDISCIPLINAR DE DIREITO DE FAMÍLIA – IDEF. Homossexualidade: Decisões jurídicas e psicológicas. Curitiba: Juruá, 2005, p.82. 

[14] HIRONAKA, Giselda Fernandes Novaes apud PEREIRA, Rodrigo da Cunha, op. cit., 2005.

[15] LÔBO NETTO, Paulo Luiz. Entidades familiares constitucionalizadas: para além do numerus clausus. Revista Brasileira do Direito de Família, Porto Alegre: Síntese/IBDFAM, n. 12, p.44, jan./mar. 2002.

[16] PEREIRA, Rodrigo da Cunha, op. cit., 2005, p.44.

[17] PEREIRA, Rodrigo da Cunha, op. cit., 2005, p.171.

[18] FACHIN, Luiz Edson. Elementos críticos do direito de família. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p.306.

[19] GOMES, Luiz Roldão de Freitas. O casamento no direito brasileiro – aspectos diante da Constituição Federal. Revista Forense, Rio de Janeiro: Forense, v. 323, p. 105-118, 1993, p.110. 

[20] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios fundamentais norteadores do direito de família. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, p.165.

[21] BRAUNER, Maria Cláudia Crespo. O pluralismo no direito de família brasileiro: realidade social e reinvenção da família. In: MADALENO, Rolf Hanssens; WELTER, Belmiro Pedro (Coord.). Direitos fundamentais do direito de família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p.256.

[22] OLIVEIRA, Euclides de.; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Do direito de família. In: DIAS, Maria Berenice; PEREIRA, Rodrigo da Cunha. (coord.) Direito de Família e o Novo Código Civil. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010, p. 8.

[23] FACHIN. Luiz Edson. Direito de família: elementos críticos à luz do novo código civil brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p.20. 

[24] FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da língua portuguesa. 3ª . ed.. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999, p.  54-55.

[25] DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva: o preconceito e a justiça. 4.ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2009, p. 215.

[26] CHAVES, Antônio. Adoção. Belo Horizonte: Del Rey, 1995, p.23

[27] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. 18. ed. São Paulo: Saraiva, v. 5, 2002. p. 283.

[28] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:

[29] BARBOZA, Heloísa Helena. O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, In: II Congresso Brasileiro de Direito de Família. Anais... Belo Horizonte: Del Rey, 2000. p. 202-214.

[30] PEREIRA, Tânia da Silva. A convenção sobre dos direitos da criança (ONU) e a proteção da infância e adolescência no Brasil In: Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial, n° 60, abril/jun. 1992, p.31.

[31] BUCHALLA, Anna Paula. Meu pai é gay. Minha mãe é lésbica. Revista Veja. P. 68


Publicado por: Evandro Carneiro Rios Junior

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